Pesquisadores da UFABC testaram com sucesso um processo de síntese de propofol a partir do popular analgésico, abrindo espaço para estratégia que pode ser útil durante crises sanitárias (foto: Álvaro Takeo Omori/UFABC)

Química
Técnica permite usar excedente de paracetamol como matéria-prima para sedativo usado em intubação
08 de agosto de 2023

Pesquisadores da UFABC testaram com sucesso um processo de síntese de propofol a partir do popular analgésico, abrindo espaço para estratégia que pode ser útil durante crises sanitárias

Química
Técnica permite usar excedente de paracetamol como matéria-prima para sedativo usado em intubação

Pesquisadores da UFABC testaram com sucesso um processo de síntese de propofol a partir do popular analgésico, abrindo espaço para estratégia que pode ser útil durante crises sanitárias

08 de agosto de 2023

Pesquisadores da UFABC testaram com sucesso um processo de síntese de propofol a partir do popular analgésico, abrindo espaço para estratégia que pode ser útil durante crises sanitárias (foto: Álvaro Takeo Omori/UFABC)

 

Julia Moióli | Agência FAPESP – Comprimidos de paracetamol estocados em grandes quantidades e até vencidos podem virar insumo para a fabricação de propofol, fármaco utilizado como sedativo durante o processo de intubação em hospitais – o que evitaria sua escassez durante crises sanitárias como a da COVID-19. O procedimento, desenvolvido na Universidade Federal do ABC (UFABC) e publicado na revista ACS Sustainable Chemistry & Engineering, é simples, eficaz, sustentável e pode ser reproduzido pela indústria em larga escala.

Insumo farmacêutico comum e abundante, não é incomum que o paracetamol sobre nos estoques de hospitais e nas prateleiras de farmácias. Quando a data de vencimento chega, o produto é simplesmente descartado.

“O ideal seria que o processo acontecesse por meio da logística reversa: o paciente ou hospital entrega para a farmácia, que devolve para a indústria, responsável pela incineração, inclusive com aproveitamento da energia da queima em alguma outra etapa”, explica Álvaro Takeo Omori, professor de química da UFABC e autor do estudo. “No entanto, sabemos que isso nem sempre ocorre e o paracetamol que entra no mercado é fabricado do zero, com extração de fontes de carbono.”

Por outro lado, há medicamentos que são mais escassos em unidades de saúde, como é o caso daqueles que fazem parte do “kit intubação”. Durante a segunda onda da pandemia de COVID-19 no Brasil, o aumento acelerado de casos diminuiu a disponibilidade do sedativo propofol. Apesar de ser uma molécula simples, sua formulação exige um grau de pureza muito elevado, o que faz com que poucas indústrias farmacêuticas se comprometam a produzi-la, elevando seu custo.

Para evitar o desperdício do primeiro medicamento e a falta do segundo durante emergências, cientistas do Centro de Ciências Naturais e Humanas da UFABC (CCNH-UFABC) desenvolveram com apoio da FAPESP um método capaz de unir as duas cadeias de produção em um modelo de economia circular.

“O processo que criamos é um exemplo de reaproveitamento de insumo farmacêutico ativo: é mais ambientalmente benigno porque aproveitamos um fármaco produzido em grande quantidade que já completou seu ciclo de vida e sobrou, sem descartá-lo ou queimá-lo, para suprir outra cadeia de produção”, afirma Omori.

Processo em frasco único

No estudo, o próprio comprimido de paracetamol – independentemente do prazo de validade – foi usado como matéria-prima, sem a necessidade de retirar outros componentes de sua composição para isolar o princípio ativo. Além disso, como todas as etapas foram executadas em meio ácido, foi possível realizar toda a síntese em um único frasco de reação. Essa abordagem, chamada “one-pot”, é mais eficaz e sustentável, evitando etapas de extração e purificação para cada transformação envolvida, trazendo economia de tempo e custo.

Um dos desafios encontrados foi a etapa de purificação, feita no final do processo. A solução encontrada pelos pesquisadores foi uma simples destilação (separação dos componentes). Ao contrário da cromatografia – comumente utilizada em experimentos e estudos realizados em laboratórios de universidades –, é simples e não gera tantos resíduos, o que facilita e permite o escalonamento pela indústria.

“Com esse método, conseguimos chegar a altos níveis de pureza e rendimento de 47%, que é comparável ao de outros trabalhos já publicados na literatura científica”, conta Omori.

Ainda segundo o pesquisador, apesar de já haver relatos na literatura que descrevem estratégias para obtenção de um propofol de pureza adequada para o uso em intubação, partindo de outros reagentes e evitando a formação de mais subprodutos que o processo original, esses métodos são caros e, do ponto de vista ambiental, requerem altas temperaturas e condições energéticas, além de utilizarem solventes tóxicos e gerarem muito resíduos.

Vale destacar que, antes de ser aplicada na prática, a estratégia descrita na revista ACS Sustainable Chemistry & Engineering ainda precisa passar por mais testes para atestar a pureza do produto final.

Também assinam o estudo os pesquisadores da UFABC Leonardo Costa Messina e Carollyny Silva de Espindola.

O artigo Direct One-Pot Synthesis of Propofol from Paracetamol Tablets pode ser lido em: https://pubs.acs.org/doi/10.1021/acssuschemeng.2c07483.
 

  Republicar
 

Republicar

A Agência FAPESP licencia notícias via Creative Commons (CC-BY-NC-ND) para que possam ser republicadas gratuitamente e de forma simples por outros veículos digitais ou impressos. A Agência FAPESP deve ser creditada como a fonte do conteúdo que está sendo republicado e o nome do repórter (quando houver) deve ser atribuído. O uso do botão HMTL abaixo permite o atendimento a essas normas, detalhadas na Política de Republicação Digital FAPESP.