Encontro ressaltou necessidade de transformar a ciência básica em aplicada de forma rápida (foto: PFPMCG)
Workshop do Programa de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas Globais, ocorrido na Unicamp, traça um panorama dos desafios a serem enfrentados e dos esforços científicos para prever e mitigar os problemas gerados pelo aquecimento do planeta
Workshop do Programa de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas Globais, ocorrido na Unicamp, traça um panorama dos desafios a serem enfrentados e dos esforços científicos para prever e mitigar os problemas gerados pelo aquecimento do planeta
Encontro ressaltou necessidade de transformar a ciência básica em aplicada de forma rápida (foto: PFPMCG)
André Julião | Agência FAPESP – A urgência da mudança de modelo de desenvolvimento, de forma a não ultrapassar 1,5 °C de aumento da temperatura média global, traz a necessidade de transformar a ciência básica em aplicada de forma rápida, a fim de resolver problemas como a transição nos setores de energia, indústria e transporte; gestão sustentável de florestas, oceanos e biodiversidade; transformação da agricultura e sistemas alimentares; construção de resiliência em cidades, infraestrutura e água; e promoção do desenvolvimento social. As mudanças devem ser integradas a setores da sociedade civil, governos e, principalmente, o setor privado.
Este foi o tom das apresentações ocorridas no workshop do Programa FAPESP de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas Globais (PFPMCG), realizado nos dias 11 e 12 de setembro na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Transmitido on-line, o workshop pode ser visto na íntegra na página do evento.
“O Brasil já apresentou na COP29 sua nova NDC [Contribuição Nacionalmente Determinada, na sigla em inglês], um compromisso para 2035, e sugeriu reduzir suas emissões líquidas entre 59% e 67%, em relação aos níveis de 2005, até 2035. Isso gera uma redução de emissão grande, que ficaria num nível de 1 bilhão de toneladas de CO2 [equivalente]. O interessante é que esse valor é muito próximo do que emitimos somente com desmatamento no país [em um ano]”, lembrou Luiz Aragão, membro da coordenação do programa e pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), durante a abertura do evento.
Para o pesquisador, o problema também é uma solução, uma vez que “mudar o sistema climático leva tempo, mas para mudar a maneira com que nos comportamos e usamos a terra bastariam leis, intensificação da fiscalização e conscientização, fazendo uma enorme redução de emissões apenas atacando um problema, o do desmatamento”, completou.
O fim do desmatamento atacaria outro problema, que também está relacionado às mudanças climáticas. “As Nações Unidas consideram que a melhor arma que temos para mitigar e se adaptar aos efeitos das mudanças climáticas é a conservação da biodiversidade”, afirmou Patricia Morellato, professora do Instituto de Biociências da Universidade Estadual Paulista (IB-Unesp), em Rio Claro, e coordenadora do Centro de Pesquisa em Biodiversidade e Mudanças do Clima (CBioClima), um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPID) apoiado pela FAPESP.
“É um ponto falado há muito tempo, durante as convenções de biodiversidade. Mais recentemente, tem se buscado fazer essa ligação e acho que temos muito que trabalhar nessa área. Pensando no Brasil, as maiores emissões vêm do desmatamento, que é uma das formas mais dramáticas de destruição da biodiversidade”, lembrou.
Biodiversidade e carbono azul
A fala de Morellato ocorreu na abertura da sessão plenária “Biodiversidade e Ecossistemas”, que contou, entre outros, com as pesquisadoras Simone Vieira, do Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais (Nepam), da Unicamp, e Tânia Marcia Costa, professora do Instituto de Biociências do Campus do Litoral Paulista (IB-CLP) da Unesp, em São Vicente.
Ambas falaram sobre sinergias entre mudanças climáticas e biodiversidade, com destaque para o impacto das mudanças do clima e da perda da biodiversidade na força das interações tróficas em ecossistemas costeiros, apresentado por Costa.
André Oliveira Sawakuchi, professor do Instituto de Geociências da Universidade de São Paulo (IG-USP), contou sobre o projeto “O destino do carbono azul holocênico das áreas costeiras alagáveis dos rios Yangtze e Amazonas em resposta a mudanças de precipitação e nível do mar”, apoiado no âmbito do PFPMCG, num acordo entre a FAPESP e a Fundação Nacional de Ciências Naturais da China (NSFC).
Na definição de especialistas da área, carbono azul é o que fica soterrado no subsolo, diferentemente do que é liberado na atmosfera e contribui para o aquecimento global. “Queremos entender o balanço de carbono numa escala milenar. Foram feitas medidas de metano e dióxido de carbono nas áreas de várzea e canais de maré do rio Amazonas e no rio Yangtze [na China]. A primeira parte do projeto é estabelecer a cronologia de deposição de sedimentos”, contou.
O pesquisador lembrou que no Yangtze os testemunhos, como são chamadas as amostras cilíndricas de sedimentos, foram coletados até 60 metros de profundidade, o que corresponde a cerca de 9 mil anos. “Quase todo o Holoceno está registrado ali. No Amazonas, coletamos até 5 metros de profundidade, que registra o ultimo milênio”, disse.
Modelos climáticos
A infraestrutura computacional de modelagem climática e métodos numéricos para uma nova geração de modelos de previsão de tempo e clima foram tema da palestra de Pedro da Silva Peixoto, professor do Instituto de Matemática e Estatística (IME) da USP. Coordenador do projeto “Métodos numéricos para uma nova geração de modelos de previsão de tempo e clima”, apoiado pela FAPESP, Peixoto apresentou os problemas matemáticos para prever o tempo e o clima e as soluções que têm sido apresentadas pela comunidade científica.
Luiz Augusto Toledo Machado, pesquisador do Instituto de Física da USP, falou sobre efeitos sinergéticos das mudanças climáticas e do uso do solo nas fontes e sumidouros de carbono na Amazônia, tema de projeto apoiado pela FAPESP.
Para superar as limitações dos modelos e da falta de dados, Gabriel Martins Perez faz uso de inteligência artificial na modelagem de tempo e clima em sua empresa MeteoIA, apoiada pelo Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE) da FAPESP.
Saúde
No segundo dia de evento, Simone Miraglia, professora do Instituto de Ciências Ambientais, Químicas e Farmacêuticas da Universidade Federal de São Paulo (ICAQF-Unifesp), e Paulo Saldiva, professor da Faculdade de Medicina da USP, falaram sobre a relação entre mudanças climáticas e saúde e os impactos na economia.
“Tem um estudo muito interessante que mostra que a cada grau acima de 20 °C há uma perda de produtividade de cerca de 2%. Se pensarmos numa temperatura de 40 °C, é uma perda de quase metade da produtividade daquele trabalhador”, disse Miraglia.
A pesquisadora encerrou sua fala lembrando que a ação climática não está relacionada apenas à economia, mas também ao enfrentamento de uma emergência de saúde pública. Uma redução de eventos extremos, além de salvar vidas, evitaria bilhões em custos para o sistema de saúde; com menos mortes relacionadas ao calor, haveria uma redução de doenças respiratórias decorrentes da poluição e maior prevenção de surtos de doenças infecciosas.
Além disso, estimativa citada pela pesquisadora aponta que 175 milhões de pessoas poderiam sair da pobreza extrema até 2050 por meio de políticas integradas de clima e desenvolvimento, o que por sua vez levaria a melhores desfechos de saúde.
As palestras podem ser conferidas no site do evento: fapesp.br/17698/workshop-do-programa-mudancas-climaticas-globais.
COP30 e Ciência
A FAPESP lançou, em parceria com a Fundação Conrado Wessel, o site COP30 e Ciência, reunindo pesquisas e projetos apoiados por ambas as fundações que ampliam o conhecimento sobre o clima e podem ajudar a enfrentar os desafios do aquecimento global e das mudanças climáticas.
É possível acessar o site em: https://cop30.fapesp.br/.
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