Segundo pesquisador, a abordagem tem potencial para monitorar e prevenir uma série de outros problemas ambientais, como incêndios, desmatamento, rebaixamento de solo e desertificação (imagem: Defesa Civil//Wikimedia Commons)

Desastres ambientais
Método estatístico prevê com mais precisão risco de deslizamentos de terra
10 de dezembro de 2025

Estratégia formulada por pesquisadores do ICMC-USP, em parceria com o Inpe, define os pesos de cada fator de contribuição objetivamente e foi validada com base nos inventários de deslizamento de São Sebastião, no litoral norte de São Paulo

Desastres ambientais
Método estatístico prevê com mais precisão risco de deslizamentos de terra

Estratégia formulada por pesquisadores do ICMC-USP, em parceria com o Inpe, define os pesos de cada fator de contribuição objetivamente e foi validada com base nos inventários de deslizamento de São Sebastião, no litoral norte de São Paulo

10 de dezembro de 2025

Segundo pesquisador, a abordagem tem potencial para monitorar e prevenir uma série de outros problemas ambientais, como incêndios, desmatamento, rebaixamento de solo e desertificação (imagem: Defesa Civil//Wikimedia Commons)

 

Reinaldo José Lopes | Agência FAPESP – Um método relativamente simples de análise estatística é capaz de prever com mais precisão o risco de deslizamentos de terra causados por chuva intensa, de acordo com um estudo coordenado por pesquisadores do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação da Universidade de São Paulo (ICMC-USP), em São Carlos, e do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). A estratégia formulada pelos pesquisadores foi validada com base em um evento real: as tempestades que destruíram áreas de São Sebastião, no litoral norte de São Paulo, em fevereiro de 2023.

Em artigo publicado no periódico Scientific Reports, a equipe comparou a eficiência da abordagem com a que é tradicionalmente usada em análises dessa natureza. De maneira geral, a técnica avaliada teve desempenho ligeiramente superior, com destaque para uma melhor classificação das áreas que podem ser afetadas pelos desastres em diferentes categorias.

“Embora os ganhos quantitativos sejam modestos, o método apresenta vantagens significativas: reduz ambiguidades e apresenta maior alinhamento com o comportamento real dos deslizamentos no território”, explica Rômulo Marques-Carvalho, doutorando do ICMC-USP e primeiro autor do estudo.

Em avaliações desse tipo de risco, um dos métodos mais empregados é o chamado AHP, sigla inglesa de “Processo de Hierarquia Analítica”. Nessa abordagem, usa-se uma lista de variáveis consideradas relevantes para o fenômeno investigado – no caso do tema do estudo, são 16 itens, que incluem fatores como elevação do terreno e o quão íngreme e acidentado ele é, a proximidade de rios e estradas, a cobertura do solo (vegetação, construções) etc.

No AHP “clássico”, os fatores desse painel são comparados em pares para avaliar o peso de cada variável, algo que envolve também a opinião de especialistas sobre a importância relativa deles para a ocorrência do evento. No novo estudo, a equipe aplicou o chamado AHP Gaussiano, que usa métodos estatísticos que “substituem totalmente as comparações pareadas do AHP tradicional”, diz Marques-Carvalho.

“O termo se refere ao fato de que o método adotado no trabalho utiliza a distribuição gaussiana ou curva de Gauss, também chamada de distribuição normal”, explica Cláudia Maria de Almeida, coautora do estudo que trabalha no Inpe. “Ela equivale à curva de distribuição de probabilidade, definida por dois parâmetros: a média e o desvio-padrão, o qual indica a dispersão dos dados.” Isso ajuda a definir os pesos de cada fator de forma objetiva, segundo Marques-Carvalho – a lista de fatores em si é a mesma em ambas as abordagens.

Para validar o método, os pesquisadores usaram dados de São Sebastião porque o município é um dos mais suscetíveis a deslizamentos de terra no território paulista, segundo uma análise feita pelos autores de acordo com o Índice de Vulnerabilidade aos Desastres Naturais Relacionados com Deslizamento de Terra (IVDDT). A equipe se baseou num inventário de imagens aéreas feitas após os desastres de fevereiro de 2023, com resolução de 10 cm, que foi complementado com fotos das plataformas Google Earth e PlanetScope.

Entre as principais estruturas catalogadas nas imagens estão 983 crown points – as chamadas coroas dos deslizamentos, no alto de uma encosta, por exemplo, onde o processo começa – e 1.070 “polígonos de cicatriz”, que delimitam toda a área afetada pelo deslizamento.

Com base nesses dados, o AHP Gaussiano atribuiu 26,31% da área analisada à categoria de suscetibilidade muito alta ao deslizamento, contra uma estimativa de 23,52% do AHP tradicional, mostrando que a capacidade de previsão do novo método foi melhor.

O trabalho, apoiado pela FAPESP (processos 24/02748-7, 21/11435-4 e 20/09215-3), também atribuiu pesos diferentes às principais variáveis. A variação da inclinação das encostas e a posição delas aparecem como os fatores mais importantes no AHP tradicional, enquanto na análise com AHP Gaussiano a lista é encabeçada pela geomorfologia (as formas do relevo na superfície) e pelas distâncias da área afetada em relação a rios e estradas.

“A proximidade de estradas é importante porque sua construção em locais de relevo acidentado pressupõe a execução de obras de movimento de terra, como cortes e aterros, que geralmente levam a uma instabilidade das encostas”, explica Almeida.

Segundo o atual orientador de Marques-Carvalho, André Ferreira de Carvalho, a abordagem tem potencial para monitorar e prevenir uma série de outros problemas ambientais, como incêndios, desmatamento, rebaixamento de solo e desertificação. “Por conta das mudanças climáticas, a frequência e a intensidade dessas catástrofes vão aumentar nos próximos anos”, lembra ele.

“O método é simples de aplicar”, destaca o primeiro autor da pesquisa. “Uma prefeitura precisaria apenas dos dados geoespaciais básicos e de um computador comum com QGIS [software livre de análise de dados georreferenciados].”

O artigo Comparative analysis of traditional and Gaussian Analytical Hierarchy Process (AHP) methods for landslide susceptibility assessment pode ser acessado em: www.nature.com/articles/s41598-025-22136-6.

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