Além de apresentar dados observados entre 1950 e 2012, plataforma PULSE-Brasil possibilita avaliação dos impactos dos extremos climáticos (reprodução; capa: Angela Peres/Agência de Notícias do Acre)
Além de apresentar dados observados entre 1950 e 2012, plataforma PULSE-Brasil possibilita avaliação dos impactos dos extremos climáticos
Além de apresentar dados observados entre 1950 e 2012, plataforma PULSE-Brasil possibilita avaliação dos impactos dos extremos climáticos
Além de apresentar dados observados entre 1950 e 2012, plataforma PULSE-Brasil possibilita avaliação dos impactos dos extremos climáticos (reprodução; capa: Angela Peres/Agência de Notícias do Acre)
Por Karina Toledo, de Fortaleza
Agência FAPESP – Uma ferramenta capaz de fazer análises integradas de dados sobre clima, ambiente e saúde pública e de fornecer cenários climáticos futuros para orientar a tomada de decisão relacionada a eventos extremos já está disponível gratuitamente na internet.
Denominada PULSE-Brasil (Platform for Understanding Long-term Sustainability of Ecosystems), a plataforma foi desenvolvida por pesquisadores brasileiros e britânicos no âmbito do projeto “Impact of climate extremes on ecosystem and human health in Brazil”, apoiado pela FAPESP e pelo Natural Environment Research Council (NERC), do Reino Unido.
A pesquisa é coordenada por Jose Antonio Marengo Orsini, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), e por Peter Michael Cox, da University of Exeter (Reino Unido). Resultados parciais foram apresentados no dia 13 de maio, em Fortaleza, durante a conferência internacional Adaptations Futures 2014.
"O projeto nasceu de uma colaboração existente há mais de uma década entre pesquisadores do Inpe e de Exeter para estudos sobre a Amazônia. O apoio do NERC e da FAPESP foi fundamental para garantir a continuidade das pesquisas, que têm como objetivo democratizar o conhecimento sobre o clima e informar decisores políticos e a sociedade em geral, uma vez que a Amazônia é um tema que interessa a todo o mundo", afirmou Marengo.
De acordo com Cox, a Amazônia representa uma peça-chave no sistema climático mundial e é potencialmente vulnerável ao aquecimento global – por esse motivo precisa ser mais bem estudada. "É importante que os formuladores de políticas públicas tenham acesso a informações mais atualizadas para orientar a tomada de decisões. Nós desejamos ajudar a fornecer essas informações", disse.
No momento, a ferramenta já permite visualizar dados de clima observado entre 1950 e 2012 e projeções de clima futuro baseado nos modelos mais recentes do IPCC [Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas].
O próximo passo, já iniciado, é usar essas informações para fazer avaliação de impactos, ou seja, investigar como um determinado evento climático resultou em uma enchente ou uma epidemia, por exemplo.
Entre as informações de clima disponíveis na plataforma estão temperatura máxima, mínima e média, cuja variabilidade em cada estado brasileiro ou em todo o território nacional pode ser visualizada por mês ou por ano.
Também há dados sobre precipitação pluviométrica, sobre a vazão dos rios e sobre casos de dengue, malária, diarreia, leptospirose e doenças respiratórias – doenças consideradas sensíveis à variação de temperatura e de chuva.
A fonte usada foi o Climatic Research Unit (CRU), da University of East Anglia, no Reino Unido, referência mundial para dados observados. Para se conseguir informação desde 1950, época em que praticamente não havia estações de medição, os dados foram calculados por modelos matemáticos, como explicou Duarte Costa, gerente do projeto pelo lado britânico e pesquisador da Faculdade de Engenharia, Matemática e Ciências Físicas da University of Exeter.
"Os dados locais observados nas estações existentes são interpolados por algoritmos numéricos e, assim, são geradas informações para onde não existe medição. É uma forma cientificamente válida de compensar as áreas em que faltam dados de séries temporais. Quanto mais recentes são os dados, mais fidedignos, pois há mais estações de medição que contribuem para a validação dos dados interpolados”, explicou Costa.
Já as projeções de clima futuro são baseadas no segundo cenário (RCP4.5) apresentado no último relatório do IPCC, que prevê até 2100 um aumento da temperatura média global entre 1,1 °C e 2,6 °C e uma elevação do nível do mar entre 32 e 63 centímetros.
“É um cenário mediano, não é dos mais pessimistas. Mas, em vez de consultar vários cenários, a ferramenta permite consultar a projeção de cerca de 25 diferentes modelos – desenvolvidos pelos principais centros mundiais de pesquisa sobre o tema – dentro de um mesmo cenário”, disse Costa.
“Permite também ao usuário selecionar o modelo que quer analisar escolhendo entre o que mais subestima, sobrestima ou se aproxima da mediana da projeção de uma determinada variável e entre um conjunto de modelos”, disse.
De acordo com os pesquisadores, a ferramenta PULSE-Brasil pode mostrar com toda a clareza aos técnicos ambientais e aos gestores políticos se um determinado evento, como uma seca mais intensa e prolongada, está realmente fora do padrão dos últimos 60 anos e pode ser considerado um evento extremo associado à instabilidade do sistema climático global.
No caso da saúde pública, por exemplo, permite ver, com base no registro de notificação obrigatória de doenças da base de dados do Datasus, se um surto de dengue ou de malária está dentro do padrão de um determinado estado em uma determinada época do ano.
Impactos
O trabalho de avaliação de impactos integrados de clima, saúde e ambiente começou há cerca de dois anos com uma análise exploratória sobre o impacto de secas sobre a ocorrência de doenças respiratórias realizada para a Amazônia. A análise foi publicada no periódico Scientific Reports, da Nature.
Atualmente, estão sendo feitos de forma piloto no Estado do Acre estudos visando ao entendimento de outras doenças. O grupo integra pesquisadores do Inpe, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp), do governo do Acre, da Secretaria Estadual de Saúde, da Fundação de Ciência e Tecnologia do Acre (Funtac), da Defesa Civil estadual e municipal (Rio Branco), da Universidade Federal do Acre (Ufac) e do Instituto de Mudanças Climáticas.
"Escolhemos o Acre como modelo de estudo por ser um dos estados mais afetados pelos eventos extremos recentes, como as secas de 2005 e de 2010 e as enchentes de 2009, 2012, 2013 e 2014. Os impactos foram graves na saúde e na infraestrutura física e acreditamos ser importante para a população conhecer esses impactos", afirmou Marengo.
Outro motivo que levou os pesquisadores a escolher o Acre, segundo Cox, foi o engajamento de agentes locais no desenvolvimento da plataforma PULSE-Brasil, especialmente Vera Reis, assessora técnica da Secretaria de Estado do Meio Ambiente, e Foster Brown, pesquisador da Ufac.
Entre as análises feitas está a relação entre o índice de precipitação e a ocorrência de enchentes na cidade de Rio Branco. Os cientistas pretendem descobrir em quais áreas da bacia hidrográfica as chuvas intensas representam maior risco de alagamento. Outra meta é descobrir com qual antecedência é possível prever a ocorrência da enchente, uma vez que o tempo varia de acordo com condições geomorfológicas.
Os resultados da análise da relação entre chuva e enchentes serão cruzados com as projeções do modelo climático regional ETA, do Inpe, para a elaboração de cenários futuros.
“O que aconteceria com o nível do Rio Branco, por exemplo, se tivermos uma condição climática como a prevista no modelo. Será que o rio pode alagar uma área ainda maior que a atual? Poderão ocorrer alagamentos em períodos diferentes do ano? Com o envolvimento de atores locais, como a Defesa Civil, a ferramenta pode servir para a elaboração de um plano de longo prazo, para mostrar onde há maior risco de alagamento e a população mais vulnerável se o nível do rio alcançar uma nova cota”, afirmou Costa.
Outra avalição em andamento liderada por Luiz Aragão, pesquisador do Inpe e coordenador da cooperação internacional, é a de risco de fogo. A análise leva em conta fatores como uso da terra, desmatamento, umidade, temperatura no continente e até mesmo temperatura do oceano.
Isso porque estudos mostraram que a temperatura em determinadas áreas do Atlântico Tropical pode causar ondas de calor no continente e modificar a umidade e o risco de fogo no sul e no sudoeste da Amazônia.
Outra vertente da investigação são os impactos na área da saúde pública, cujo objetivo é verificar como as populações reagirão ao clima futuro e quais as áreas mais vulneráveis a, por exemplo, surtos de dengue ou malária.
De acordo com os cientistas, a informação poderá contribuir para a organização dos serviços de saúde e a previsão de custos com a doença – possibilitando um planejamento de longo prazo.
Marengo conta que o próximo trabalho a ser feito ainda no âmbito do projeto financiado pela FAPESP e pelo NERC será a avaliação de impacto de extremos climáticos para São Paulo.
"O trabalho desenvolvido no estado do Acre nos fornece a metodologia e dados para estudos de saúde e, no longo prazo, pretendemos replicar para todo o Brasil. Mas até o fim deste projeto, que termina em 2015, será possível aplicar somente em São Paulo. Pretendemos estudar os setores de saúde e de recursos hídricos”, disse.
Segundo Marengo, os resultados dos estudos desenvolvidos no Acre também serão de grande utilidade para outro Projeto Temático que está sendo desenvolvido no âmbito de um convênio da FAPESP com o Belmont Forum, grupo de instituições de fomento à pesquisa sobre mudanças globais.
"O objetivo, nesse caso, é avaliar a vulnerabilidade em quatro regiões costeiras do mundo. No Brasil, o sítio de estudo será a cidade de Santos, no litoral paulista", disse Marengo.
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