Pesquisadores do LNBio identificam compostos capazes de inibir uma enzima essencial para a sobrevivência do parasita Trypanosoma cruzi. Trabalho ganhou prêmio da Associação Britânica de Cristalografia (divulgação)

Estudo abre caminho para nova droga contra Chagas
12 de maio de 2015

Pesquisadores do LNBio identificam compostos capazes de inibir uma enzima essencial para a sobrevivência do parasita Trypanosoma cruzi. Trabalho ganhou prêmio da Associação Britânica de Cristalografia

Estudo abre caminho para nova droga contra Chagas

Pesquisadores do LNBio identificam compostos capazes de inibir uma enzima essencial para a sobrevivência do parasita Trypanosoma cruzi. Trabalho ganhou prêmio da Associação Britânica de Cristalografia

12 de maio de 2015

Pesquisadores do LNBio identificam compostos capazes de inibir uma enzima essencial para a sobrevivência do parasita Trypanosoma cruzi. Trabalho ganhou prêmio da Associação Britânica de Cristalografia (divulgação)

 

Karina Toledo | Agência FAPESP – Em busca de um novo fármaco para o tratamento da doença de Chagas, pesquisadores do Laboratório Nacional de Biociências (LNBio), em Campinas, têm se dedicado a estudar uma enzima conhecida como glicose-6-fosfato desidrogenase (G6PDH) – essencial para a sobrevivência do parasita Trypanosoma cruzi no organismo humano.

Durante o doutorado de Gustavo Fernando Mercaldi, foram identificados ao menos 10 compostos químicos capazes de inibir a ação da enzima e matar o parasita com eficiência comparável à da principal droga hoje usada na clínica: o benzonidazol. A pesquisa contou com Bolsa da FAPESP e foi orientada pelo pesquisador Artur Torres Cordeiro, do LNBio.

Mercaldi tenta agora – durante estágio que realiza na Universidade de Dundee, na Escócia, também com apoio da FAPESP – entender como esses inibidores se ligam à enzima-alvo e desvendar a estrutura tridimensional do complexo formado por essa ligação.

Os primeiros resultados da investigação, conduzida em Dundee sob a supervisão do professor Willian Hunter, já renderam ao brasileiro a indicação para o prêmio David Blow Memorial, concedido anualmente pela Associação Britânica de Cristalografia (BCA, na sigla em inglês).

“Esses compostos capazes de inibir a ação da G6PDH podem servir de inspiração para o desenvolvimento de uma nova droga antichagásica, mas antes é preciso entender de que forma se ligam à enzima. Se conseguirmos desvendar a estrutura tridimensional, poderemos desenhar moléculas com ação potencializada”, explicou Mercaldi.

No T. cruzi, a G6PDH está envolvida no metabolismo de glicose. Dados da literatura científica indicam que, quando a enzima é inibida, o parasita torna-se mais suscetível a morrer em decorrência do estresse oxidativo – condição em que ocorre um aumento nos níveis de espécies reativas de oxigênio que danificam moléculas importantes para o funcionamento das células.

Em estudos anteriores, Cordeiro havia testado um grupo de inibidores pertencentes à classe dos esteroides. Mas, como esse tipo de substância interfere no equilíbrio hormonal humano, poderia desencadear efeitos colaterais indesejáveis. Por esse motivo, durante o doutorado de Mercaldi, o grupo decidiu realizar uma triagem de compostos pertencentes a outras classes químicas.

Por um método conhecido como high throughput screening (triagem automatizada em larga escala), os pesquisadores testaram in vitro – colocando apenas a enzima e o candidato a inibidor para interagir – cerca de 30 mil compostos. Os mais promissores foram testados em culturas do parasita. Foram selecionadas 32 moléculas pertencentes a duas classes químicas: tienopiridinas e quinazolinonas.

“Cerca de 10 dessas moléculas, em especial entre a quinazolinonas, mostraram atividade equivalente à do benzonidazol, que é o composto de referência para o tratamento da doença de Chagas. O caminho até chegar a um novo fármaco ainda será longo, mas comprovamos que é possível matar o parasita ao inibir a enzima G6PDH”, avaliou Mercaldi.

Desvendando a estrutura

O passo seguinte é descrever a estrutura do complexo formado pela enzima e cada um dos inibidores candidatos, bem como determinar em que local da proteína esses compostos se ligam.

“O problema é que a G6PDH é uma proteína difícil de estudar. Há uma certa dificuldade experimental para se obter cristais pelo fato de ela ser muito flexível. Existem algumas regiões que formam alças totalmente móveis e isso resulta em mudanças conformacionais”, explicou Mercaldi.

Graças a um novo método desenvolvido pelo grupo em Dundee, foi possível obter pela primeira vez o cristal da G6PDH de T. cruzi em complexo ternário formado pela enzima, seu substrato (glicose-6-fosfato que será oxidado pela enzima para formar o produto da reação) e seu cofator (outra molécula orgânica não proteica capaz de se ligar à enzima).

“Uma das estratégias que usamos foi tirar algumas regiões da proteína para ela ficar mais estável e aumentar a probabilidade de cristalização. Ainda não conseguimos alcançar nossa principal meta, que é obter o cristal da enzima com os inibidores. Mas mostramos pela primeira vez tanto o substrato como o cofator ocupando ao mesmo tempo os seus respectivos sítios de ligação na molécula de G6PDH. Nas pesquisas feitas com enzimas de eucariontes, foi a estrutura com maior resolução já obtida e, assim, um maior nível de detalhes sobre a G6PDH pode ser desvendado”, disse Mercaldi.

Reconhecimento

O pôster descrevendo os resultados foi selecionado durante a BCA Spring Meeting, realizada entre fim de março e início de abril de 2015. Mercaldi será o primeiro pesquisador brasileiro a gravar seu nome no troféu Blue John Crystal.

“O ganhador deve trazer o troféu até a sua instituição de vínculo – no meu caso LNBio e Unicamp no Brasil, bem como a Universidade de Dundee na Escócia – para gravar o nome. No ano seguinte, deve passar o troféu ao novo vencedor”, explicou Mercaldi.

O primeiro grupo a gravar o nome no Blue John Crystal, em 1988, contou com a participação do inglês Richard Charles Garratt, professor da Universidade de São Paulo (USP) e um dos precursores da cristalografia de proteínas no Brasil.
 

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