Estudo realizado por pesquisadores da USP, em parceria com o Hospital Estadual de Bauru, identifica sete proteínas presentes no plasma de pacientes hospitalizados que abrem caminho para novos tratamentos e metodologias capazes de identificar casos que tendem a se agravar (técnica de laboratório manuseia equipamento que identifica as proteínas do plasma sanguíneo; foto: Marília Buzalaf/USP)

Análise sanguínea de pacientes com COVID-19 revela possíveis marcadores de gravidade e alvos terapêuticos
01 de fevereiro de 2021
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Estudo realizado por pesquisadores da USP, em parceria com o Hospital Estadual de Bauru, identifica sete proteínas presentes no plasma de pacientes hospitalizados que abrem caminho para novos tratamentos e metodologias capazes de identificar casos que tendem a se agravar

Análise sanguínea de pacientes com COVID-19 revela possíveis marcadores de gravidade e alvos terapêuticos

Estudo realizado por pesquisadores da USP, em parceria com o Hospital Estadual de Bauru, identifica sete proteínas presentes no plasma de pacientes hospitalizados que abrem caminho para novos tratamentos e metodologias capazes de identificar casos que tendem a se agravar

01 de fevereiro de 2021
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Estudo realizado por pesquisadores da USP, em parceria com o Hospital Estadual de Bauru, identifica sete proteínas presentes no plasma de pacientes hospitalizados que abrem caminho para novos tratamentos e metodologias capazes de identificar casos que tendem a se agravar (técnica de laboratório manuseia equipamento que identifica as proteínas do plasma sanguíneo; foto: Marília Buzalaf/USP)

 

Maria Fernanda Ziegler | Agência FAPESP – Pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) identificaram sete proteínas presentes no plasma sanguíneo de pacientes hospitalizados por COVID-19 que podem servir como indicadores de gravidade e até indicar alvos terapêuticos.

São moléculas associadas a resposta imunológica, proteção do pulmão, complicações vasculares e descontrole inflamatório (tempestade de citocinas), comuns em alguns pacientes com COVID-19. A ação das proteínas e seus efeitos no agravamento da doença serão agora estudados com maior profundidade pelo grupo.

“Alterações nos níveis de proteínas do plasma sanguíneo são bons indicadores de como ocorre o desenvolvimento das doenças, inclusive infecções virais. Com a análise das variações da expressão proteica [proteômica] de pacientes hospitalizados, selecionamos sete moléculas que nos pareceram mais interessantes para serem investigadas dada a fisiopatologia da COVID-19”, diz Marília Rabelo Buzalaf, pesquisadora do Departamento de Ciências Biológicas da Faculdade de Odontologia de Bauru (FOB-USP).

O estudo é parte da tese de doutorado de Daniele Castro di Flora e conta também com a colaboração de Carlos Ferreira dos Santos, diretor da FOB-USP, Deborah Maciel Cavalcanti Rosa, diretora do Hospital Estadual de Bauru, e Virginia Bodelão Richini Pereira, do Instituto Adolfo Lutz de Bauru.

Os dados preliminares foram publicados na plataforma medRxiv, ainda sem a revisão de pares. O grupo de pesquisadores é apoiado pela FAPESP por meio de um Projeto Temático e um Auxilio Regular à Pesquisa, cujos recursos foram redirecionados para o estudo da COVID-19.

“Trata-se de uma enfermidade com grande variação de sintomas e de gravidade, e proteínas relacionadas a diferentes complicações e estágios da infecção podem abrir caminho para a identificação de alvos terapêuticos e biomarcadores que auxiliem a tomada de decisão por parte dos profissionais de saúde”, afirma à Agência FAPESP.

O estudo avaliou, entre 4 de maio e 4 de julho de 2020, 163 pacientes internados no Hospital Estadual de Bauru com diagnóstico confirmado de COVID-19 por teste de RT-PCR. Os pacientes foram divididos em três grupos: 76 indivíduos que tiveram alta hospitalar sem internação em Unidade de Terapia Intensiva (UTI) ou casos suaves, 56 que tiveram alta após permanecerem um período na UTI (casos severos) e 31 que morreram mesmo sob acompanhamento na UTI (críticos).

Ao comparar o proteoma dos três grupos, os pesquisadores observaram níveis altos das proteínas IREB2, GELS, POLR3D, PON1, SFTPD e ULBP6 apenas nos casos mais suaves.

As amostras de sangue analisadas foram coletadas no momento em que os doentes deram entrada no hospital. Também foram coletadas amostras semanais para acompanhar a evolução de cada participante. Esses dados serão analisados nas próximas etapas da pesquisa.

“A análise proteômica nos indicou uma proteína exclusiva de casos graves e críticos [Gal-10] que, uma vez validada, poderá servir como marcador de prognóstico. Outras seis foram encontradas apenas em pacientes suaves e podem nos dar pistas importantes sobre possíveis alvos terapêuticos”, diz.

No estudo, apenas pacientes que precisaram de tratamento intensivo apresentavam a proteína Gal-10 no plasma sanguíneo quando deram entrada no hospital. Trata-se de um conhecido marcador de morte de células de defesa (eosinófilos), o que sugere, de acordo com os pesquisadores, algum grau de comprometimento do sistema imune.

“Quando os eosinófilos morrem, liberam moléculas de Gal-10, que se ligam formando cristais altamente imunogênicos – cristais de Charcot-Leyden (CLCs) –, responsáveis por promover a imunidade do tipo 2 [que envolve outras subpopulações de linfócitos]. Esses cristais têm efeito pró-inflamatório importante justamente no pulmão, levando a um influxo de outras células de defesa, como neutrófilos e monócitos. O aumento de Gal-10 nos pacientes críticos e severos pode estar associado à tempestade de citocinas que leva ao descontrole da inflamação”, explica.

De acordo com a pesquisadora, um estudo recente mostrou que anticorpos contra a Gal-10 conseguem dissolver completamente os cristais presentes no muco em apenas duas horas. “No momento, estamos aguardando a chegada de reagentes para validar o aumento dessa proteína no plasma dos casos severos e críticos. Uma vez confirmado o fenômeno, anticorpos contra a Gal-10 poderão ser testados no tratamento de doentes que apresentarem alto nível dessa proteína ou de CLCs no momento da admissão hospitalar”, diz.

Outros estudos apoiados pela FAPESP identificaram marcadores de prognóstico. As proteínas S-TREM e a SAA1e SAA2, também aumentadas conforme o agravamento da doença, podem servir como um “termômetro biológico” capaz de orientar a tomada de decisão pelas equipes de saúde (leia mais em: agencia.fapesp.br/34265/ e agencia.fapesp.br/34456/). No presente estudo, as proteínas SAA1 e SAA2 também estavam aumentadas nos casos severos e críticos, confirmando os achados prévios.

Potenciais alvos terapêuticos

Também associada à tempestade de citocinas, a proteína IREB2 tem o papel de impedir a formação de ferritina, mediador da desregulação do sistema imune. De acordo com o estudo da FOB-USP, por impedir o avanço do efeito cascata que leva à inflamação desregulada, essa proteína foi encontrada apenas nos pacientes suaves.

“Pesquisas anteriores já haviam demonstrado o aumento dos níveis de ferritina nos pacientes com casos graves da doença e a importância que esse fenômeno tem no agravamento. Portanto, não foi uma surpresa encontrarmos IREB2 exclusivamente nos pacientes que tiveram bom prognóstico [casos suaves]”, diz.

De acordo com Buzalaf, o objetivo agora é identificar drogas capazes de aumentar a expressão da IREB2 e, por consequência, reduzir a ferritina.

Também foi selecionada para estudo a proteína ULBP6, associada à resposta imune adaptativa (específica para cada patógeno). Essa molécula se liga e ativa o receptor NKG2D, localizado na superfície das células imunes, que tem papel importante no controle imunológico. “O receptor medeia a toxicidade das células imunes do tipo natural killer [um tipo de linfócito que mata células infectadas]. Além disso, essas proteínas têm influência no resultado clínico de uma variedade de patologias ligadas ao sistema imune, como nefropatia diabética e alopecia areata. Mas o que mais nos interessou foi seu polimorfismo [forma alternativa da molécula]”, afirma a pesquisadora.

Buzalaf explica que existe uma forma alternativa da ULBPC em que, na cadeia de aminoácidos que constitui a proteína, ocorre a troca de uma arginina por uma leucina, o que aumenta ainda mais a afinidade pelo receptor NKG2D. Segundo a pesquisadora, essa maior afinidade reduz a ativação das células natural killer, prejudicando a resposta do sistema imune inato.

“É possível, e precisamos investigar ainda, que os pacientes críticos tenham esse polimorfismo, o que poderia acarretar uma resposta imunológica prejudicada”, diz.

De acordo com a pesquisadora, se for comprovado que indivíduos com essa forma alternativa da ULBP6 são mais acometidos pela forma grave da COVID-19, será possível desenvolver um método que identifique essa suscetibilidade genética precocemente.

Outra proteína selecionada pelos pesquisadores e exclusivamente encontrada em pacientes que não foram internados na UTI foi a geosolina. “Essa molécula tem propriedades anti-inflamatórias, pois se liga ao cálcio e, assim, remove filamentos de actina que estão circulando na corrente sanguínea, com ação inflamatória. Estudos clínicos realizados em outros países já estão investigando a suplementação de geosolina recombinante como potencial terapia. O nosso achado corrobora essa hipótese”, diz.

O mesmo será investigado com a proteína POLR3D, também encontrada apenas entre os hospitalizados com bom prognóstico. “Essa enzima está envolvida na resposta imune inata, na produção de interferon do tipo 1 [citocina importante na resposta antiviral] e tem como função limitar a infeção por bactérias e vírus intracelulares. Talvez uma possível terapia seja aumentar a expressão dessa enzima nos estágios iniciais da doença”, afirma.

Outra proteína encontrada apenas em pacientes suaves é a SFTPD, que tem relação direta com a defesa do pulmão contra os microrganismos inalados, por formar uma espécie de camada protetora na superfície do órgão. “Ela está relacionada ao surfactante pulmonar, líquido que reduz de forma significativa a tensão superficial dentro do alvéolo pulmonar, prevenindo o colapso durante a expiração. No nosso estudo, pacientes mais graves não tinham essa proteína. Com o agravamento da doença, o paciente vai ter pouca capacidade de proteger o pulmão”, diz.

Buzalaf comenta que um estudo recente mostrou que a melatonina aumenta a formação de surfactante no pulmão (leia mais em agencia.fapesp.br/34959/).

A última proteína selecionada, e que pode indicar caminhos para o desenvolvimento de novos tratamentos, é a PON-1, enzima que degrada fosfatos orgânicos. “Trata-se de uma molécula envolvida na proteção das lipoproteínas de baixa densidade contra o dano oxidativo e a formação de ateroma. Portanto, ela evita que aconteça peroxidação lipídica com dano para a parede do vaso sanguíneo. Mas também é importante para a resposta imune”, diz.

De acordo com a pesquisadora, estudo realizado por outro grupo, envolvendo a análise de drogas candidatas contra a COVID-19, descobriu que os genes correlacionados com ACE-2 (receptor da célula para a entrada do vírus SARS-COV-2) são enriquecidos na atividade de degradação de fosfatos orgânicos. “Isso é mais um indicativo de que a PON-1 pode ter alguma relação com a progressão da doença”, afirma.

O artigo Quantitative plasma proteomics of survivor and non-survivor COVID-19 patients admitted to hospital unravels potential prognostic biomarkers and therapeutic targets pode ser lido em www.medrxiv.org/content/10.1101/2020.12.26.20248855v1.
 

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