Objetivo é facilitar a captação de recursos financeiros para projetos de restauração (foto: Renato Gaiga/Wikimedia Commons)
Cientistas do projeto BIOTA Síntese auxiliaram no desenvolvimento da estratégia que usa finanças combinadas para promover a restauração e a conservação de ecossistemas no Estado
Cientistas do projeto BIOTA Síntese auxiliaram no desenvolvimento da estratégia que usa finanças combinadas para promover a restauração e a conservação de ecossistemas no Estado
Objetivo é facilitar a captação de recursos financeiros para projetos de restauração (foto: Renato Gaiga/Wikimedia Commons)
Pedro A. Duarte | Agência FAPESP* – Lançado em junho pela Secretaria de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística de São Paulo (Semil), o programa Finaclima-SP busca financiar ações de restauração de ecossistemas no Estado. Foi proposto para facilitar a captação e a gestão de recursos financeiros utilizados em ações de mitigação de emissões de gases de efeito estufa e para apoiar a implementação do Plano de Ação Climática (PAC) e do Plano Estadual de Adaptação e Resiliência Climática (Pearc). A criação desse instrumento, assim como de parte dos dois planos, teve como base pesquisas desenvolvidas no Núcleo de Análise e Síntese de Soluções Baseadas na Natureza da Universidade de São Paulo (USP), um projeto conhecido como BIOTA Síntese e financiado pela FAPESP por meio do Programa BIOTA-FAPESP.
Instituído pelo Decreto 68.577/24, o Finaclima-SP permite a combinação de recursos públicos e privados. Essa estratégia, conhecida como finanças combinadas (blended finance), é reconhecida como o meio mais eficiente de atrair capital privado dentro de um ambiente sob a tutela do Estado, aumentando o montante do orçamento para projetos de restauração e conservação de ecossistemas. Apesar de proporcionarem diversos benefícios ambientais e sociais, os projetos de restauração têm um alto custo e demandam tempo para alcançar os retornos esperados, o que torna o financiamento pouco atrativo para a iniciativa privada.
“Quando se faz um financiamento para a restauração de ecossistemas, o custo é muito caro”, comenta Fernando Henrique de Sousa, especialista em instrumentos econômicos para conservação e restauração e pós-doutorando na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq-USP). “Então a proposta é juntar esses capitais, recursos públicos com recursos filantrópicos [por exemplo de ONGs ou de fundos filantrópicos] e de organismos multilaterais [como o Banco Mundial], bem como investidores privados, diminuindo os possíveis riscos.”
No âmbito do projeto BIOTA Síntese, os pesquisadores estudaram arranjos possíveis de serem implementados como política pública de forma a viabilizar a prática de finanças combinadas para captar recursos para a restauração.
“Fomos atrás de estudar as fontes potenciais de financiamento”, conta Sousa. “Então elencamos mais de 20 fontes internacionais e nacionais que poderiam apoiar a restauração no Estado de São Paulo, por exemplo, fundos do BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social] específicos para restauração e até fundos internacionais que têm essa pauta da restauração como parte do seu bojo.”
Os pesquisadores perceberam que a regulamentação era um gargalo para viabilizar esse tipo de financiamento. “Quando se começou a discutir a estratégia de Pagamento por Serviços Ambientais [PSA] no Estado de São Paulo, o grupo liderado pela [engenheira agrônoma] Helena Carrascosa, da Semil, viu a possibilidade de ter um mecanismo de financiamento que fosse além do PSA”, lembra o ecólogo Jean Paul Metzger, que é professor do Instituto de Biociências (IB) da USP e diretor científico do BIOTA Síntese.
As discussões de financiamento para o PSA foram ampliadas com a proposta de implementar a lógica das finanças combinadas para apoiar a restauração no Estado de São Paulo. “Nessas sessões de síntese, desenhamos uma arquitetura de como deveria ser essa governança de maneira mais transparente, isonômica e que pudesse dar conta do desafio que é fazer blended finance no caso do Estado de São Paulo”, relata Sousa. A Nota Técnica, produzida pelo BIOTA Síntese, serviu como uma proposta para a Semil, que por sua vez contratou a assessoria jurídica da Fundação Instituto de Administração (FIA) para ajudar a delinear um texto para o decreto.
O novo instrumento também vai ao encontro do Marco Global da Biodiversidade, publicado em 2022, que estipula a prática das finanças combinadas como um mecanismo de captação de recursos. Para Sousa, que contribuiu no âmbito do BIOTA Síntese com o levantamento e a análise de informações que embasaram a criação do Finaclima-SP, o ponto principal do novo mecanismo é criar a figura do gestor técnico dos recursos.
“O Estado vai abrir licitações para convidar entidades a atuar na gestão desses recursos. Só que ele tem uma governança pública formada por atores do Estado, atores da sociedade civil e atores do mercado”, explica. “Todo esse mecanismo é para fazer cumprir o interesse público da restauração e da conservação no Estado, de forma a atingir as metas do Plano de Ação Climática, que prevê 1,5 milhão de hectares sendo restaurados.”
O retorno dos investimentos está atrelado às diversas formas de fazer restauração. “Uma coisa que a gente trabalha muito no BIOTA Síntese é a lógica de florestas multifuncionais, que também são produtivas”, explica Sousa. “Você pode ter sistemas agroflorestais e sistemas de vegetação nativa com o uso econômico dentro dessa lógica.”
Esforços de coprodução
A criação do Finaclima-SP teve seu início em 2022, momento em que pesquisadores e técnicos da Semil uniam esforços para contribuir com a elaboração do Plano de Ação Climática. “A demanda principal era promover a captura de carbono por meio do Refloresta-SP, além da meta de 1,5 milhão de hectares a serem restaurados usando o Código Florestal”, lembra Metzger. “Além de implementar o Código Florestal no Estado, como poderíamos, por meio de estímulos econômicos, estimular a economia florestal de forma a ir além do que é obrigatório por lei?”
A partir de discussões feitas para contribuir com a formulação do PAC e da percepção de que era necessário elaborar uma regulamentação para o financiamento desses programas, os membros do BIOTA Síntese formaram um grupo de trabalho para pesquisar sobre o tema das finanças combinadas.
“Juntamos nossos pesquisadores e mais alguns convidados de organizações parceiras, como The Nature Conservancy, Fundação SOS Mata Atlântica, World Resources Institute e também do BNDES”, recorda Sousa. “Essa é a ferramenta principal do BIOTA Síntese: esse modelo de juntar mentes com diferentes repertórios para pensar de maneira sintética uma proposta para política pública.”
Nas duas reuniões de síntese sobre o tema, a equipe elaborou uma estrutura para a implementação da prática de finanças combinadas, desenhando as finalidades dos recursos e o tipo de captação que o Estado de São Paulo faria junto às organizações multilaterais ou junto ao investimento privado; além de elaborar a proposta do instrumento e sua governança. A proposta de fomentar as finanças combinadas foi apresentada na nota técnica Restauração de ecossistemas: financiamento por meio de Blended Finance e Fundos de Biodiversidade, assinada por Fernando Henrique Sousa, Rafael Chaves (vice-diretor do BIOTA Síntese e especialista ambiental da Semil) e Alexandre de Gerard Braga (especialista ambiental da Semil).
Após a elaboração de um texto para o decreto elaborado pela FIA a partir da nota técnica, ocorreu uma terceira sessão de síntese em maio de 2024, para apreciar o texto proposto pela consultoria jurídica. Com isso, novas contribuições foram dadas e, então, o decreto do Finaclima-SP foi finalizado.
Segundo Sousa, esse decreto é produto das discussões entre esses pesquisadores. “Acho que, se a gente não tivesse colocado todos esses especialistas juntos para debater, esses insights para tornar a coisa mais operacional e mais efetiva, [o Finaclima SP] não aconteceria. Então acho que esse é um baita destaque do potencial que o BIOTA Síntese traz como aglutinador de conhecimentos da ciência em diversos domínios.”
Metzger reconhece que a proposta principal do projeto é sustentar as demandas, preocupações e necessidades de formulação de políticas públicas colocadas pelos gestores e atores institucionais governamentais. “Como podemos atuar? Estando presentes, encontrando esse matching dos dados com as demandas de política pública. É por meio da atuação nessa interface da ciência com a política, dando credibilidade, sustentação, dados consistentes.”
* Pedro A. Duarte é bolsista de jornalismo científico da FAPESP vinculado ao projeto BIOTA Síntese.
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