O aumento simultâneo da atividade do miR156 e da giberelina no meristema floral de tomateiro resulta em ovários malformados e frutos amorfos e sem sementes (imagem: acervo dos pesquisadores)
Trabalho feito na Esalq-USP mostra como a interação do hormônio vegetal giberelina com pequenas moléculas de RNA possibilita a formação do ovário e, na sequência, do fruto com sementes. Conhecimento indica caminhos para aumentar a produtividade de tomateiros
Trabalho feito na Esalq-USP mostra como a interação do hormônio vegetal giberelina com pequenas moléculas de RNA possibilita a formação do ovário e, na sequência, do fruto com sementes. Conhecimento indica caminhos para aumentar a produtividade de tomateiros
O aumento simultâneo da atividade do miR156 e da giberelina no meristema floral de tomateiro resulta em ovários malformados e frutos amorfos e sem sementes (imagem: acervo dos pesquisadores)
Julia Moióli | Agência FAPESP – Em artigo publicado na revista Development, pesquisadores da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq-USP) descrevem mecanismos relacionados ao desenvolvimento do tomateiro (Solanum lycopersicum) e apontam caminhos para novas tecnologias capazes de aumentar a produtividade da planta.
Como explicam os pesquisadores, todas as estruturas das flores surgem a partir do meristema floral, região da planta rica em células-tronco. O tomateiro possui flores que contêm tanto o órgão masculino (cones de anteras) quanto o feminino (gineceu, no qual se localiza o ovário). Após a fertilização e a polinização, o ovário dá origem ao fruto. Os óvulos (gametas femininos) são formados durante o desenvolvimento do ovário e, depois de fecundados, dão origem às sementes.
De acordo com o estudo, mesmo em condições ideais de polinização e fertilização, o tomateiro só é capaz de se desenvolver se vias mediadas por microRNAs (pequenas moléculas de RNA que regulam a expressão de outros genes) e um hormônio vegetal chamado giberelina interagirem corretamente e proporcionarem o desenvolvimento inicial do ovário.
Há quase uma década, estudos prévios do mesmo grupo já haviam demonstrado o efeito de um microRNA – o miR156 – na regulação do desenvolvimento dos tomates em termos de tamanho, formato e produção de sementes. Foram descritas, naquela ocasião, duas vias genéticas: uma envolvida com o estabelecimento inicial do ovário como fruto e outra com a formação de sementes dentro do fruto.
“Ao longo do caminho, percebemos que esses pequenos RNAs poderiam interagir com certos hormônios vegetais, que também são importantes na formação e no estabelecimento do ovário e seu posterior desenvolvimento em fruto”, conta Fábio Tebaldi Silveira Nogueira, pesquisador do Laboratório de Genética Molecular do Desenvolvimento Vegetal do Departamento de Ciências Biológicas da Esalq-USP e coordenador do trabalho. “Um desses fitormônios é a giberelina que, em associação com esses microRNAs, permite o florescimento do tomate.”
Agora, no estudo atual, financiado pela FAPESP por meio de três projetos (18/17441-3, 18/13316-0 e 19/20157-8), os pesquisadores foram capazes de conectar as duas informações e mostrar, de forma inédita na literatura, que as vias genéticas reguladas pelo miR156 interagem fortemente com a giberelina quando o ovário se forma no meristema floral.
Para entender exatamente o processo, foi feita uma análise do transcriptoma do tomateiro (todo o conjunto de RNAs expressos pelos genes da planta), que passou por duas modificações genéticas para que produzisse muito e pouco do fitormônio e muito e pouco microRNA. Inicialmente foram geradas plantas transgênicas com maior atividade do miR156. Essas plantas foram então combinadas com plantas mutantes com alta resposta à giberelina. Combinando essas alterações numa mesma planta, os pesquisadores observaram que o ovário é incapaz de formar frutos.
“Observamos que, quando essas duas vias são alteradas e não conseguem mais conversar entre si, ou seja, ou não interagem ou interagem de maneira defeituosa, o meristema floral, que deveria dar origem ao ovário e aos frutos, desenvolve estruturas totalmente amorfas, que não formam as cavidades loculares onde as sementes deveriam se desenvolver”, explica Nogueira. “Com isso, descrevemos o controle inicial do estabelecimento da formação do ovário nos meristemas florais de tomateiro, fase fundamental para a planta produzir o fruto posteriormente.”
De acordo com Nogueira, mesmo que o tomateiro tenha todas as condições de polinização e fertilização, o fruto não vai se formar se o desenvolvimento inicial do ovário não ocorrer de forma correta, ou seja, se a interação entre a giberelina e as vias de microRNAs não acontecer da maneira apropriada.
Interesse econômico
Apesar de a literatura científica já dispor de informações robustas sobre a genética e a fisiologia do desenvolvimento do ovário, esta foi a primeira vez que a interação entre microRNAs e giberelina foi descrita – especialmente em uma planta de interesse econômico como o tomateiro.
“Com esse conhecimento, temos a base genética e fisiológica de como poderíamos, por exemplo, manipular e aumentar a quantidade de sementes dentro de um fruto, aumentando sua produtividade, além de modular seu tamanho”, comenta Nogueira. “Vale lembrar, inclusive, que a semente é um dos itens de valor mais elevados nos cultivares de tomateiro para produção de mesa ou tomateiro industrial.”
Agora os pesquisadores querem investigar se outras vias de microRNAs e diferentes hormônios também interagem e influenciam no desenvolvimento, por exemplo, aumentando a quantidade e o tamanho de frutos.
O estudo contou ainda com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e do Biotechnology and Biological Sciences Research Council (Reino Unido).
O artigo Gibberellin and miRNA156-targeted SlSBP genes synergistically regulate tomato floral meristem determinacy and ovary patterning pode ser lido em: https://journals.biologists.com/dev/article-abstract/doi/10.1242/dev.201961/333463/Gibberellin-and-the-miRNA156-targeted-SlSBPs?redirectedFrom=fulltext.
A Agência FAPESP licencia notícias via Creative Commons (CC-BY-NC-ND) para que possam ser republicadas gratuitamente e de forma simples por outros veículos digitais ou impressos. A Agência FAPESP deve ser creditada como a fonte do conteúdo que está sendo republicado e o nome do repórter (quando houver) deve ser atribuído. O uso do botão HMTL abaixo permite o atendimento a essas normas, detalhadas na Política de Republicação Digital FAPESP.