Felipe González, primeiro-ministro da Espanha entre 1982 e 1996 e titular da cátedra José Bonifácio da USP, participou da abertura da conferência comemorativa do 28º aniversário da Magna Charta Universitatum (Foto: Wikimedia Commons (2012))

Universidades devem preparar estudantes para tempos de incerteza
27 de outubro de 2016

Avaliação foi feita por Felipe González, primeiro-ministro da Espanha entre 1982 e 1996 e titular da cátedra José Bonifácio da USP, na abertura da conferência comemorativa do 28º aniversário da Magna Charta Universitatum

Universidades devem preparar estudantes para tempos de incerteza

Avaliação foi feita por Felipe González, primeiro-ministro da Espanha entre 1982 e 1996 e titular da cátedra José Bonifácio da USP, na abertura da conferência comemorativa do 28º aniversário da Magna Charta Universitatum

27 de outubro de 2016

Felipe González, primeiro-ministro da Espanha entre 1982 e 1996 e titular da cátedra José Bonifácio da USP, participou da abertura da conferência comemorativa do 28º aniversário da Magna Charta Universitatum (Foto: Wikimedia Commons (2012))

 

Elton Alisson | Agência FAPESP – Além da missão de educar e de capacitar os milhares de estudantes que forma anualmente para transformar o que aprenderam em algo de valor para a sociedade, as universidades devem prepará-los para enfrentar as incertezas do mundo globalizado.

As instituições universitárias, contudo, ainda não estão suficientemente preparadas para enfrentar esse desafio, avaliou Felipe González, primeiro-ministro da Espanha entre 1982 e 1996 e titular este ano da cátedra José Bonifácio do Centro Ibero-Americano (Ciba) da Universidade de São Paulo (USP), durante palestra na abertura da conferência comemorativa do aniversário da Magna Charta Universitatum, no dia 20/10, em São Paulo.

Realizado pela primeira vez fora da Europa, o evento que ocorre anualmente tem o objetivo de discutir os atuais desafios para as universidades preservarem os valores e princípios fundamentais estabelecidos na Magna Charta Universitarium.

Lançado em setembro de 1988, no aniversário de 900 anos de fundação da Università di Bologna, na Itália – considerada a universidade mais antiga do mundo ocidental, fundada em 1088 –, o documento foi assinado naquela ocasião por 388 reitores. Dentre eles, José Goldemberg, então reitor da USP e atual presidente da FAPESP.

Atualmente, 805 reitores de universidades situadas em 85 países subscrevem o documento. Os três últimos foram os reitores das Universidades Federais do Rio Grande do Sul (UFRGS) e de Minas Gerais (UFMG) e da Universidade do Minho, em Portugal, que assinaram a Magna Charta durante uma cerimônia realizada no dia 21/10 na Sala do Conselho Universitário da USP.

Um dos princípios fundamentais estabelecidos pelo documento é que a universidade é uma instituição autônoma que, de modo crítico, produz e transmite conhecimento através da pesquisa e do ensino. E que, nas universidades, a atividade didática é indissociável da pesquisa.

Essa missão de produzir e transmitir conhecimento por meio da pesquisa e do ensino tem sido cumprida diligentemente pelas melhores universidades no mundo, como a USP, avaliou González. “O cumprimento dessa missão, inclusive, é usado como critério de qualificação das universidades nos rankings internacionais”, ressaltou.

As universidades, contudo, não têm dado muita atenção para capacitar os estudantes que coloca no mercado para transformar o conhecimento em algo de valor para a sociedade – por meio do estímulo ao empreendedorismo e à inovação, por exemplo –, e ainda não estão prontas para prepará-los para as incertezas do mundo globalizado, ponderou.

“Vivemos uma revolução tecnológica que rompeu a barreira do tempo e do espaço da comunicação, aumentou a velocidade de circulação do capital e colocou em crise nossa ideia do Estado-Nação como o âmbito de realização da soberania, da identidade da moeda e do mercado, entre outros impactos, que têm tornado o presente e o futuro cada vez mais incertos”, avaliou González.

“As universidades não estão preparadas para ajudar os estudantes a lidar com essas incertezas”, apontou.

Uma das razões para essa falta de preparo das universidades, na opinião dele, é que o pensamento dos educadores, a exemplo dos pais, está mais voltado para garantir aos jovens um futuro próspero, de plena realização pessoal e profissional, sem levar em conta o imponderável.

“Como dizer ao jovem que estamos educando que a maior certeza que temos hoje é que temos que prepará-los para incertezas causadas por mudanças abruptas, que exigem flexibilização e conhecimento contínuo?”, questionou González.

O advogado e político espanhol tem se dedicado a estudar e discutir com outros pesquisadores no âmbito da cátedra José Bonifácio os desafios da governança na democracia representativa e os impactos da globalização na soberania dos países.

Na avaliação de González , a globalização tem gerado uma desigualdade insustentável na distribuição de riqueza no mundo e no ingresso às universidades.

“Mesmo em países que experimentaram um crescimento econômico acelerado nos últimos anos, como a China, além de outros, como a Dinamarca, Estados Unidos, Espanha e países da América Latina, como o Brasil, o acesso à universidade ainda é muito desigual”, afirmou.

A ampliação do acesso ao sistema de educação e de formação profissional é um componente fundamental para enfrentar a desigualdade na distribuição de riqueza no mundo, avaliou.

“O acesso ao sistema educacional e de formação profissional representa um dos mecanismos mais eficazes de distribuição de renda porque permite a igualdade de oportunidades de melhores salários” avaliou.

Ação conjunta

Na avaliação de Sijbolt Noorda, presidente da Magna Charta Observatory – uma associação criada em 2000 com o objetivo de monitorar a situação da liberdade acadêmica e autonomia institucional das universidades signatárias do documento –, os desafios impostos pela revolução na informação terão que ser atacados de forma conjunta pelas instituições de pesquisa e ensino superior no mundo.

“Os desafios não serão solucionados localmente e atacados integralmente. As universidades estão sendo pressionadas a unir suas forças para buscar soluções conjuntas. Por isso, viemos pela primeira vez à América Latina e nos próximos anos devemos ir para África e Ásia”, afirmou.

O próximo encontro anual da entidade será realizado na University of Pécs, na Hungria.

A edição do evento no Brasil teve como principais palestrantes, além de González, o ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso e a embaixadora do México no Brasil, Beatriz Paredes Rangel.

Mais informações sobre a Magna Charta Universitatum podem ser obtidas em www.magna-charta.org/.
 

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