Paulo Mazzafera, professor do Instituto de Biologia da Unicamp, estuda a criação de uma variedade de café sem cafeína e viável comercialmente (divulgação)

Trabalho de pesquisador brasileiro é destacado na Nature
11 de abril de 2012

Paulo Mazzafera, professor do Instituto de Biologia da Unicamp, estuda a criação de uma variedade de café sem cafeína e viável comercialmente

Trabalho de pesquisador brasileiro é destacado na Nature

Paulo Mazzafera, professor do Instituto de Biologia da Unicamp, estuda a criação de uma variedade de café sem cafeína e viável comercialmente

11 de abril de 2012

Paulo Mazzafera, professor do Instituto de Biologia da Unicamp, estuda a criação de uma variedade de café sem cafeína e viável comercialmente (divulgação)

 

Por Karina Toledo

Agência FAPESP – Há mais de 20 anos, o pesquisador Paulo Mazzafera tenta criar uma variedade de café naturalmente sem cafeína e viável de ser cultivada em escala comercial. O trabalho foi destacado na revista Nature do dia 15 de março.

Em dois momentos, Mazzafera, professor titular do Departamento de Biologia Vegetal do Instituto de Biologia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), chegou a acreditar que havia alcançado seu objetivo. O primeiro foi em 2004, quando em parceria com Maria Bernadete Silvarolla, pesquisadora do Instituto Agronômico de Campinas (IAC), descobriu algumas plantas originárias da Etiópia que, graças a mutações naturais, eram livres de cafeína.

Como as plantas eram da espécie Coffea arabica, considerada a de melhor sabor e maior valor comercial, a descoberta parecia promissora. Em publicado na Nature em 2004, o grupo descreveu que as variedades etíopes tinham uma alteração na etapa final do processo bioquímico que transforma a teobromina – substância diurética e levemente estimulante – em cafeína.

“Ficamos extasiados. Sabíamos que as plantas encontradas não eram muito produtivas, mas sendo C. arabica achávamos que seria fácil fazer cruzamentos e transmitir essa característica (a ausência de cafeína) para cultivares mais produtivos”, disse Mazzafera à Agência FAPESP.

Mas não foi tão simples assim, pois os cruzamentos faziam com que os descendentes recuperassem sua capacidade de sintetizar a cafeína.

A equipe do IAC ainda não perdeu a esperança e mantém a linha de pesquisa com coordenação de Silvarolla. Mazzafera decidiu tentar uma nova abordagem: tratar sementes de C. arabica – de uma variedade comercial conhecida como Catuaí Vermelho – com substâncias capazes de alterar o DNA da planta.

Em uma pesquisa financiada pela FAPESP, entre 2006 e 2008, quase 30 mil sementes foram expostas a dois agentes mutagênicos – azida sódica e metano sulfonato de etila –, na esperança de que o gene responsável pela síntese de cafeína fosse afetado em alguma delas.

Entre milhares de plantas analisadas, cinco mostraram ser boas candidatas e Mazzafera, mais uma vez, achou estar perto de alcançar a meta. “Fiquei empolgado, pois havia obtido uma variedade potencialmente muito produtiva, como o Catuaí, e sem cafeína.”

Mas durante os primeiros testes o pesquisador notou que as flores da planta mutante abriam antes da hora, deixando-a mais suscetível a receber pólen de variedades com teor normal de cafeína. “A polinização cruzada acaba restaurando o teor de cafeína. Para evitar isso, seria preciso isolar a plantação em um raio de 2 quilômetros, o que seria inviável”, contou.

A equipe sequenciou o gene da cafeína sintase na planta mutante e verificou que ele estava normal, mas tinha pouca expressão. “Provavelmente, atingimos um fator de transcrição, ou seja, um gene que controla a expressão do gene da cafeína sintase e também controla algum gene relacionado à abertura das flores”, explicou Mazzafera.

Alternativa transgênica

Há três anos, a equipe tenta corrigir o problema por meio de novos cruzamentos. Paralelamente, busca entender melhor o funcionamento do fator de transcrição afetado pelos mutagênicos.

“Temos dois bons candidatos. Vamos silenciar esses genes em uma planta normal para comprovar se, de fato, eles controlam tanto a síntese de cafeína como a abertura das flores. Uma segunda etapa seria fazer com que eles controlassem apenas a síntese de cafeína”, explicou Mazzafera.

Ainda que obtenham sucesso, os pesquisadores teriam de vencer o tabu relacionado ao consumo de alimentos transgênicos para transformar o resultado da pesquisa em um produto de valor comercial.

Grupos de outros países também tentaram, sem sucesso, desenvolver uma planta de café descafeinada por meio de engenharia genética, como apontou a reportagem da Nature. Como o mercado de descafeinados movimenta cerca de U$ 2 bilhões por ano, a busca dos cientistas não dá sinais de enfraquecimento, mesmo com os sucessivos reveses.

“Muitas pessoas não tomam café porque não querem sentir os efeitos estimulantes da cafeína e, ao mesmo tempo, acham o gosto do café artificialmente descafeinado ruim”, disse Mazzafera.

Isso ocorre porque os processos existentes atualmente para extrair a cafeína removem também outras substâncias do café, como os ácidos fenólicos e clorogênicos. E essas substâncias são importantes para garantir não somente o aroma e o sabor da bebida como também seu efeito antioxidante.

“Se conseguirmos criar uma variedade de café sem cafeína que mantenha as demais características do C. arabica, muito mais gente vai passar a tomar café”, opinou Mazzafera.

Novas pesquisas

Enquanto isso não ocorre, o pesquisador se dedica também a melhorar o processo de transformação da cana-de-açúcar em biocombustível. Em um Projeto Temático ligado ao Programa FAPESP de Pesquisa em Bioenergia (BIOEN), Mazzafera estuda fatores ambientais que influenciam a síntese de lignina na planta.

“Um dos fatores que dificultam a transformação do bagaço da cana em etanol de segunda geração é a lignina”, explicou. A substância é responsável pela rigidez, impermeabilidade e resistência dos tecidos vegetais, mas também dificulta a fermentação da celulose.

“As plantas não sobrevivem sem lignina, mas talvez seja possível modificar a substância ou reduzir seu teor. A ideia é tornar o bagaço mais digerível para os microrganismos ou tornar mais fácil a extração da lignina por outros processos químicos”, disse Mazzafera.

Em outro projeto recentemente aprovado em uma chamada da FAPESP e da Agilent Technologies, Mazzafera e sua equipe vão estudar como a variação de temperatura e as altas concentrações de dióxido de carbono na atmosfera influenciam a síntese de lignina em duas espécies de eucalipto.

“A Eucalyptus globulus, nativa de regiões frias, tem um rendimento maior de celulose do que a Eucalyptus grandis, espécie que existe no Brasil. De alguma forma o clima altera a estrutura da lignina da planta. Nosso objetivo é fazer com que a E. globulus consiga se adaptar a climas mais quentes, o que interessa ao mundo inteiro no atual contexto de aquecimento global”, disse.
 

  Republicar
 

Republicar

A Agência FAPESP licencia notícias via Creative Commons (CC-BY-NC-ND) para que possam ser republicadas gratuitamente e de forma simples por outros veículos digitais ou impressos. A Agência FAPESP deve ser creditada como a fonte do conteúdo que está sendo republicado e o nome do repórter (quando houver) deve ser atribuído. O uso do botão HMTL abaixo permite o atendimento a essas normas, detalhadas na Política de Republicação Digital FAPESP.