Pinturas rupestres do Parque Nacional da Serra da Capivara, cuja fundação que o administra demitiu 79 funcionários na semana passada por não ter como pagar os salários, podem ter uma esperança de sobrevida (foto: Fumdham)
As pinturas rupestres do Parque Nacional da Serra da Capivara, cuja fundação que o administra demitiu 79 funcionários na semana passada por não ter como pagar os salários, podem ter uma esperança de sobrevida, se as intenções políticas anunciadas nesta quinta (6/5) se confirmarem
As pinturas rupestres do Parque Nacional da Serra da Capivara, cuja fundação que o administra demitiu 79 funcionários na semana passada por não ter como pagar os salários, podem ter uma esperança de sobrevida, se as intenções políticas anunciadas nesta quinta (6/5) se confirmarem
Pinturas rupestres do Parque Nacional da Serra da Capivara, cuja fundação que o administra demitiu 79 funcionários na semana passada por não ter como pagar os salários, podem ter uma esperança de sobrevida (foto: Fumdham)
Agência FAPESP - A área que levou a arqueóloga paulista Niède Guidon a abdicar do cargo de professora da Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais de Paris, há 30 anos, na França, é praticamente desconhecida dos brasileiros. Se não fosse o trabalho guerreiro da cientista, os 700 sítios arqueológicos que formam o que se convencionou chamar de Tradição Nordeste da arte rupestre pré-histórica não estariam mais presentes para que pudessem ser conhecidos e investigados.
O isolamento e o descaso com o Parque Nacional da Serra da Capivara não são recentes. Niède, mais do que ninguém, sabe disso. Além das pinturas rupestres, feitas há pelos menos 12 mil anos por aqueles que podem ter sido os primeitos habitantes da América do Sul, o local ainda está em uma região de caatinga, ambiente rico em biodiversidade que se encontra em estado crítico de conservação.
Na semana passada, mais uma crise aguda atingiu o interior do Piauí. Sem recursos desde agosto de 2003, a Fundação Museu do Homem Americano, criada por Niède para administrar o parque, teve que demitir todos os seus 79 funcionários. A fundação tem acordos que prevêm repasses dos ministérios da Cultura e do Meio Ambiente, por meio do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), que é a co-gestora do parque. Mas a penúria chegou ao ponto de a fundação ter que pagar o combustível dos carros do próprio Ibama, utilizados na manutenção do local.
Felizmente, a tradição nordestina da resistência parece ter sido incorporada pelo grupo de pesquisadores que optou por viver e trabalhar no sertão. Depois de tanto insistir, nos últimos dias eles conseguiram vencer algumas lutas travadas no campo político. Então, finalmente, boas notícias chegaram à região.
"Estamos bastante próximos de fechar com a Petrobras e os Correios um acordo de cinco anos para que a fundação receba mensalmente R$ 225 mil, suficientes para manter a infra-estrutura do parque e pagar os funcionários necessários para o trabalho", disse Niède à Agência FAPESP. Em outra boa notícia, o MEC acaba de anunciar a liberação de outros R$ 601 mil.
Com tudo isso, o sonho da pesquisadora de salvar o Parque Nacional da Serra Capivara está um pouco menos com a forma de pesadelo que culminou com as demissões na semana passada. Mas a luta continua. "Infelizmente, ainda não consegui levantar um clamor nacional forte o suficiente para salvar este maravilhoso legado que o primeiro homem americano nos deixou", afirma Niède, que também confessa uma decepção. "A depredação foi o que acabou com o vizinho Parque Nacional da Serra das Confusões, uma região fabulosa que não consegui salvar."
Para resolver os problemas que se somam desde agosto de 2003, a diretora da Fundação Museu do Homem Americano espera que outra promessa se cumpra nos próximos dias. "A Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (Chesf) se comprometeu a destinar R$ 2 milhões, mas, para conseguirmos receber, temos que contar com uma autorização do Ministério do Meio Ambiente, uma vez que o dinheiro será aplicado em um parque nacional", disse.
Dentro do plano de vôo de Niède, que pretende tornar auto-sustentável a fundação, há muitas outras batalhas a vencer. "Temos muitos problemas imediatos, como o conserto de estradas e passarelas de visitação de sítios arqueológicos, danificadas pelas trombas de água deste ano. A construção de um aeroporto também é absolutamente necessária. O acesso ao parque pelas estradas, ou melhor, pelas fitas de buracos chamadas de ‘BR’, é muito demorado. Estamos no sudeste do Piauí, longe de tudo", contou. Com um "carro muito bom e alto", segundo a arqueóloga, a viagem demora pelo menos cinco horas.
Outra boa notícia recente acabou se transformando em mais uma preocupação para Niède. Em 29 de abril, o governo do Piauí inaugurou as obras do aeroporto da Serra da Capivara. No dia seguinte, depois que dois tratores trabalharam por algumas horas, as máquinas simplesmente desligaram seus motores e não funcionaram mais. "Hoje (6/5), falei com o Ministro do Turismo (Walfrido Mares Guia) e ele contou que os últimos problemas legais foram resolvidos e que os recursos estavam sendo liberados", disse a arqueóloga.
Se tudo correr bem, um estudo feito pela fundação que a arqueóloga dirige dá uma boa pista de como a caatinga e as pinturas rupestres do interior do Piauí podem ser preservadas. "Quando todos os nossos projetos estiverem prontos – estradas, passarelas, chalés nas florestas vizinhas, acampamentos e tendas para observação de animais à noite – a região deverá atrair 3 milhões de pessoas ao ano", acredita Niède. Isso, claro, se o aeroporto estiver pronto. Quando a fundação for auto-suficiente, imagina a cientista, será possível fazer acordos com empresas privadas e obter recursos para manter as pesquisas, museu, escolas e o parque.
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