Ao contrário da maioria dos cientistas dos EUA, Philip Portoghese trabalha apenas na universidade: "Nosso trabalho é desenvolver conceitos" (foto: Divulgação)

Tempo para pensar
30 de novembro de 2006

Ao contrário da maioria dos cientistas norte-americanos, Philip Portoghese, um dos maiores nomes da química medicinal, trabalha apenas na universidade. "Não precisamos competir com a indústria, nosso trabalho é desenvolver conceitos", diz

Tempo para pensar

Ao contrário da maioria dos cientistas norte-americanos, Philip Portoghese, um dos maiores nomes da química medicinal, trabalha apenas na universidade. "Não precisamos competir com a indústria, nosso trabalho é desenvolver conceitos", diz

30 de novembro de 2006

Ao contrário da maioria dos cientistas dos EUA, Philip Portoghese trabalha apenas na universidade: "Nosso trabalho é desenvolver conceitos" (foto: Divulgação)

 

Por Fábio de Castro

Agência FAPESP - O norte-americano Philip Portoghese, da Universidade de Minnesota, um dos mais conhecidos especialistas em química medicinal no mundo, considera que a principal tarefa do pesquisador acadêmico não é desenvolver produtos, mas criar novos conceitos.

"Nosso objetivo maior hoje, na universidade, não é descobrir medicamentos, mas desenvolver novas abordagens e conceitos para a produção de fármacos. Precisamos aproveitar aquilo que temos e que falta aos pesquisadores das empresas. A academia tem tempo para pensar e este é seu trabalho", disse à Agência FAPESP.

Nos Estados Unidos, ao contrário do que ocorre no Brasil, a maioria esmagadora dos pesquisadores trabalha na indústria. Apenas 20% são docentes de universidades ou atuam em institutos de pesquisa acadêmicos, como Portoghese.

"A indústria não tem tempo para pesquisa básica. Ela tem um trabalho dirigido para fazer, pois precisa desenvolver um produto", disse. "Não temos que competir com a indústria. Temos que aproveitar nossa disponibilidade de tempo e criar os modelos que a indústria usará no desenvolvimento tecnológico."

Trabalhando na área de química medicinal desde 1961, sempre na universidade, Portoghese conta que suas maiores descobertas nasceram da disponibilidade de tempo proporcionada pela academia. "Claro que não ignoramos as oportunidades para desenvolver um produto, mas isso é uma exceção. Já desenvolvemos um medicamento contra a Aids que nos rendeu um bom retorno financeiro, mas não é esse o foco", disse.

Uma das principais contribuições científicas de Portoghese foi descrever a maneira pela qual drogas como a morfina interagem com receptores de opióides. Os resultados foram utilizados pela indústria para o design de novas drogas. A descoberta lhe valeu o Prêmio da Sociedade Norte-Americana de Química.

"Foi um exemplo da aplicação de um conceito desenvolvido na academia. O importante é que não se trata de uma solução pontual, mas de um modelo que pode ser replicado em outros sistemas. A indústria não tem essa capacidade", disse.


Editor há 30 anos

A atuação na universidade também permitiu ao cientista exercer um papel importante que, segundo Portoghese, a indústria não permitiria. O pesquisador também é editor-chefe, desde 1976, da principal revista científica da área, o Journal of Medicinal Chemistry. "Trabalho com sete editores espalhados em vários Estados e dois na Europa, onde são produzidos em média 40% dos artigos científicos que publicamos", disse.

A configuração da ciência predominantemente industrial dos Estados Unidos também se reflete nas revistas, segundo o professor. "Em todas as publicações de química medicinal há muito mais artigos curtos e divulgação de resultados. Várias dessas revistas pertencem à indústria farmacêutica. Tentamos mudar um pouco esse padrão e publicar pesquisa básica", afirmou.

Em 45 anos de pesquisa, Portoghese destaca a notável evolução da química medicinal. "A tecnologia mudou muito o cenário ao longo dos anos. A química medicinal não se limita mais à síntese de compostos, ela foi gradualmente se deslocando rumo à biologia", disse.

Portoghese conta que as novas tecnologias o levaram a tirar da gaveta projetos antigos. "Abandonei uma pesquisa na década de 1980 por falta de recursos tecnológicos disponíveis no momento. Hoje, com a clonagem de receptores e tecnologias de microarray [empregada para estudos genéticos], pude retomá-la. Estou fazendo hoje coisas que não imaginei nem nos meus sonhos mais loucos de juventude", disse.


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