Um dos conceitos centrais do simpósio é a gestão de ecossistemas de inovação: em vez de empresas isoladas que buscam ser mais sustentáveis, é importante ter redes integradas – com pesquisadores, governo, empresas, cooperativas e comunidades (imagem: EESC-USP/divulgação)
Encontro reúne pesquisadores vinculados ao CEPID Bridge da FAPESP e especialistas da Austrália e objetiva construir soluções práticas com comunidades tradicionais, catadores e cooperativas
Encontro reúne pesquisadores vinculados ao CEPID Bridge da FAPESP e especialistas da Austrália e objetiva construir soluções práticas com comunidades tradicionais, catadores e cooperativas
                                Um dos conceitos centrais do simpósio é a gestão de ecossistemas de inovação: em vez de empresas isoladas que buscam ser mais sustentáveis, é importante ter redes integradas – com pesquisadores, governo, empresas, cooperativas e comunidades (imagem: EESC-USP/divulgação)
Roseli Andrion | Agência FAPESP – A Escola de Engenharia de São Carlos da Universidade de São Paulo (EESC-USP) promove amanhã (05) e quinta-feira (06/11) o Simpósio Internacional Austrália-Brasil: Ecossistemas de Inovação Circular. Aldo Roberto Ometto, presidente da comissão organizadora do simpósio, lembra que grande parte da economia circular no Brasil é exercida por cooperativas e catadores. “É fundamental, então, que venha deles a inspiração para uma transição sistêmica que integre regeneração, negócios, inclusão e clima”, diz Ometto, que é coordenador de inovação e ecossistemas circulares do CEPID Bridge: Gestão de Ecossistemas para transições sustentáveis, um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão financiado pela FAPESP com sede na Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária da Universidade de São Paulo (FEA-USP).
Coordenado pela EESC-USP, pelo CEPID Bridge e pela Griffith University, da Austrália, o encontro pretende criar inovações radicais e disruptivas para a gestão inclusiva de ecossistemas circulares.
Túlio de Lima, engenheiro ambiental e pesquisador de pós-doutorado em engenharia de produção na EESC-USP, atua na organização da reunião e explica a filosofia da conferência. O primeiro dia será dedicado a ouvir as vozes da comunidade. “Não podemos partir do princípio de que nós, que estamos na academia, somos os solucionadores de todos os problemas. É preciso entender a realidade e os desafios dos atores desses ecossistemas antes de falar sobre tecnologia e investimento”, explica Lima.
Segundo o Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil 2024, divulgado pela Associação Brasileira de Resíduos e Meio Ambiente (Abrema), a taxa de reciclagem do país foi de apenas 8% dos 81 milhões de toneladas de resíduos produzidos em 2023. O estudo aponta que, desses 8%, dois terços são coletados por catadores, que garantem que esse material não vá para aterros sanitários. Quando o trabalho é feito por cooperativas, a taxa de reciclagem supera 80% – algumas chegam a 97% de aproveitamento dos materiais coletados. “Eles são os protagonistas da economia circular no Brasil há décadas, mas seguem invisibilizados”, aponta Ometto.
O Anuário da Reciclagem 2024 indica que existem mais de 3 mil cooperativas de catadores espalhadas pelo país e que elas reúnem aproximadamente 70 mil trabalhadores organizados. De acordo com o Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), essas organizações atuam em mais de 1,1 mil municípios brasileiros.
A meta da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) é quadruplicar o volume de materiais reciclados nas cooperativas nos próximos anos.
A ideia do simpósio surgiu em 2023, quando Ometto atuava como professor visitante na Griffith University, com bolsas da FAPESP e do Programa Institucional de Internacionalização da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes-PrInt). Ele pesquisa economia circular, um conceito que propõe transformar o fluxo linear dos produtos de “produzir, usar e descartar” em sistemas que adicionem e recuperem valor sem depender da extração de novos recursos naturais.
Na Austrália, Ometto conheceu Anya Phelan, especialista em empreendedorismo social da Griffith Business School. “Quando o Ministério de Relações Internacionais australiano, por meio do Conselho para as Relações entre a Austrália e a América Latina, o Coalar, lançou um edital para financiar iniciativas de cooperação, vimos a oportunidade de trazer a visão de inovação social deles para o contexto brasileiro”, explica.
A proposta foi aprovada e a comitiva de professores, pesquisadores, empresários e especialistas australianos vai compartilhar experiências em economia circular aplicada a comunidades remotas, indígenas e em situação de vulnerabilidade, além de modelos de negócios inovadores e oportunidades de empreendedorismo social com tecnologias acessíveis.
No primeiro dia, quando serão ouvidas as vozes da comunidade, participam o representante de uma aldeia indígena de Bertioga (que atua na regeneração costeira), catadores autônomos e cooperativas de materiais recicláveis. Haverá, ainda, a apresentação de soluções de cooperativas brasileiras: uma delas, de Araraquara (SP), desenvolveu, em parceria com o Enactus da USP de São Carlos, equipamentos de moagem, extrusão e injeção para agregar valor aos materiais reciclados.
Além disso, as professoras Cara Beal, da Griffith University, e Roberta de Castro Souza Pião, do Departamento de Engenharia de Produção da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP), vão abordar soluções inovadoras em comunidades e justiça social.
No segundo dia, representantes da Austrália vão apresentar soluções tecnológicas e casos práticos de inovação sociotécnica já implementados em comunidades remotas. Phelan e o professor Leonardo Gomes, da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA-USP), abordarão o empreendedorismo social e a inovação em ecossistemas regenerativos.
A Marulho, organização da região da Ilha Grande, no Rio de Janeiro, que recupera plásticos vindos do mar, vai mostrar no encontro como atua na limpeza costeira e no gerenciamento de resíduos marinhos. Outras startups vão compartilhar experiências de aproveitamento de resíduos de atividades agropecuárias brasileiras, no contexto da química verde. Já Maxim Mintchev, pesquisador da Universidade Técnica de Berlim, na Alemanha, apresentará o Passaporte Digital de Produtos, que permite rastrear informações em todos os processos da economia circular.
Um dos conceitos centrais do simpósio é a gestão de ecossistemas de inovação: em vez de empresas isoladas que buscam ser mais sustentáveis, é importante ter redes integradas – com pesquisadores, governo, empresas, cooperativas e comunidades. “O CEPID Bridge busca ser essa ponte”, explica Ometto. “A ideia é que o evento não termine em si mesmo. Queremos mapear os ecossistemas necessários, identificar os principais atores, seus papéis e suas atividades para apoiar essas soluções.”
Após o encontro, Ometto e Gomes embarcam para Belém (PA) com o objetivo de apresentar as conclusões e propostas construídas em São Carlos na 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30).
Na COP30, o objetivo é liderar rodas de conversa sobre gestão de múltiplos ecossistemas para inovação regenerativa como forma de levar a perspectiva brasileira de economia circular com forte componente social. “O Brasil é um dos únicos países que têm condições reais de oferecer soluções regenerativas em larga escala”, afirma Ometto. “Temos as áreas, a biodiversidade e o conhecimento tradicional das comunidades. Agora, precisamos de uma nova mentalidade, de novos modelos de negócio que integrem a diversidade e a criação de valor compartilhado.”
 
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