Para coordenador-geral da plataforma, publicação de manuscritos em repositório antes da avaliação de pares está alinhada ao movimento global de ciência aberta (foto: Felipe Maeda / Agência FAPESP)
Para coordenador-geral da plataforma, publicação de manuscritos em repositório antes da avaliação de pares está alinhada ao movimento global de ciência aberta
Para coordenador-geral da plataforma, publicação de manuscritos em repositório antes da avaliação de pares está alinhada ao movimento global de ciência aberta
Para coordenador-geral da plataforma, publicação de manuscritos em repositório antes da avaliação de pares está alinhada ao movimento global de ciência aberta (foto: Felipe Maeda / Agência FAPESP)
Maria Fernanda Ziegler | Agência FAPESP – O Scientific Electronic Library Online (SciELO) – programa financiado pela FAPESP – adotará duas novas ações com o intuito de se alinhar ao movimento global de ciência aberta.
O primeiro é atingir a meta de 75% dos periódicos científicos que integram a plataforma serem editados em inglês, o que deve ocorrer em março de 2018. A segunda é adotar o chamado preprint, isto é, a publicação do manuscrito em um repositório que poderá receber comentários de outros pesquisadores, antes de o artigo ser submetido a periódicos científicos.
Os anúncios foram feitos durante a VII Reunião Anual da SciELO, realizada no auditório da FAPESP no dia 12 de dezembro. O evento contou com a presença de 145 editores dos 287 periódicos científicos que integram atualmente a plataforma.
“Isso consiste em um grande movimento de alinhamento com as boas práticas de comunicação da ciência aberta [que prevê que os artigos científicos e os dados que o embasaram estejam disponíveis para a comunidade científica], que tem como proposta um processo aberto, transparente e acessível. Vamos começar com o preprint em julho de 2018”, disse Abel Packer, coordenador-geral do SciELO.
Para que todo o processo de publicação de artigos científicos na plataforma seja aberto, transparente e acessível, também foi anunciada a parceria com o Center for Open Science (COS) – startup de tecnologia sem fins lucrativos que está desenvolvendo uma plataforma na qual cientistas podem realizar pesquisas de forma aberta.
A intenção é antecipar-se a uma tendência global entre as publicações científicas: aderir ao movimento ciência aberta. A Comunidade Europeia, por exemplo, terá todos os periódicos científicos em acesso aberto até 2020.
“A Comunidade Europeia está equacionando os preprints e a gestão dos dados das pesquisas abertos na proposta política para a ciência aberta chamada Open Science Policy Plataform (OSPP)”, disse Packer.
Para Packer, o objetivo do SciELO com o acesso aberto é tornar as revistas mais interessantes internacionalmente. “É uma maneira de as revistas se fortalecerem em termos de qualidade: quanto mais transparência houver, maior será a qualidade das publicações. É uma questão de sobrevivência das revistas que estarão alinhadas a todo um movimento global”, disse.
Publicando manuscritos
Preprint é a publicação do manuscrito antes da avaliação dos pares. O texto é depositado pelo autor em um servidor de artigos, geralmente organizado por temas, seguindo procedimentos públicos. Ao depositar os preprints, os autores podem solicitar comentários e acrescentar sugestões ao manuscrito, que é enviado posteriormente ao processo editorial formal de um periódico.
O SciELO está avaliando as estratégias que deve seguir para adotar a publicação de manuscritos, mas já definiu algumas ações. Entre elas, a plataforma vai trabalhar com critério de depósito direto baseado em um sistema automático de controle do histórico do autor, com identificadores como o Open Researcher and Contributor ID (ORCID) ou o Digital Object Identifier (DOI). A partir dessa identificação, será verificado o histórico de publicação do autor.
“Se o autor tem um histórico de publicação, o manuscrito é depositado diretamente no repositório e a moderação é feita posteriormente. Se o que ele publicou não for aceitável, o editor vai pedir a retirada do texto do repositório. Aqueles autores que não têm ORCID ou que não têm publicação ainda vão passar por moderação prévia”, disse Packer.
Entre as vantagens apresentadas na reunião do SciELO sobre a adoção dos preprints estão o acesso aberto de forma imediata ao artigo, a divulgação pública de trabalhos recentes e a maior velocidade nas publicações.
“Embora seja uma prática que estamos debatendo agora para a publicação em todas as áreas do conhecimento, já temos registros de preprints na década de 1960, depositados por pesquisadores da área da física. Acredito que seja necessário estender essa prática para outras áreas e publicações, pois ela é o caminho principalmente em uma sociedade conectada e cada vez mais em rede como a nossa. A ciência não foge disso”, disse Luciene Delazari, pesquisadora da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e editora-chefe do periódico Boletim de Ciências Geodésicas.
Redes colaborativas
As preocupações em relação a fraudes, plágios e à baixa qualidade das pesquisas também estiveram na pauta. “Honestamente, acho otimista demais o pressuposto de que os pesquisadores não colocariam a reputação em risco, publicando apenas manuscritos de boa qualidade. Se fosse assim, não teríamos artigos recusados imediatamente”, disse Marta Arretche, editora-chefe do periódico Brazilian Political Science Review e mediadora da mesa-redonda “Alinhamento do SciELO com a Ciência Aberta”.
Para Arretche, outro risco do preprint está na pressa em publicar, que tem como símbolo máximo a frase “publicar ou morrer”, muito repetida no meio acadêmico.
“Pelo modo como é feita a ciência, no mundo ou no Brasil, há poderosos incentivos para se escrever linhas no currículo Lattes com rapidez. Penso que o melhor procedimento para enfrentar esse problema, caso se adote a política do preprint, não está em negar que esse fato existe, mas admitir que isso é um fato e encontrar uma maneira de lidar com ele”, disse a coordenadora do Centro de Estudos da Metrópole (CEM), um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPID) financiado pela FAPESP.
Entre os questionamentos sobre a adoção da publicação de manuscritos em repositórios, a única certeza é o caráter transformador. Para Claude Pirmez, editora-chefe do periódico Memórias do Instituto Oswaldo Cruz, a adoção do preprintvai trazer uma resposta muito diferente para o processo editorial.
“Acho que vai ser uma experiência muito transformadora. Vai aumentar a possibilidade de redes colaborativas. Vai nos obrigar a pensar de outra forma e medir ciência e a performance da ciência de uma maneira muito diferente”, disse.
Moises Goldbaum, editor-chefe da Revista Brasileira de Epidemiologia concorda com Pirmez de que a adoção de preprints mudará inclusive a maneira como os cientistas são avaliados.
“O que estamos discutindo aqui é um processo revolucionário na ciência. O nosso pensamento acaba sendo conduzido por aquilo que entendemos como avaliação”, disse.
O Memórias do Instituto Oswaldo Cruz passou a aceitar submissão de manuscritos preprints em 2017.
“Em relação à questão da confidencialidade de dados [resolução 446/12 de ética em pesquisa com seres humanos], que particularmente na área da biomedicina é uma questão importante, temos trabalhado na Fundação Bill e Melinda Gates em um grande banco de dados em big data e toda a confidencialidade é preservada inteiramente. Além disso, existe um processo de curadoria para a análise dos projetos de quem vai acessar e como vai acessar”, disse.
Goldbaum afirma ainda que poderá haver impacto inclusive no direcionamento da pesquisa. “A impressão é que estamos em um momento importante, no qual a pós-graduação dirige a pesquisa. Está na hora de revermos isso, da pesquisa ser o vetor da pós-graduação, e assim privilegiar a pesquisa”, disse.
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