Relações perigosas
14 de julho de 2003

Dezenas dos mais influentes assessores do governo britânico para assuntos relacionados à saúde e meio-ambiente têm estreitas relações com grandes empresas farmacêuticas e químicas, revela reportagem do jornal The Observer

Relações perigosas

Dezenas dos mais influentes assessores do governo britânico para assuntos relacionados à saúde e meio-ambiente têm estreitas relações com grandes empresas farmacêuticas e químicas, revela reportagem do jornal The Observer

14 de julho de 2003

 

(Agência FAPESP) - Dezenas dos mais influentes assessores do governo britânico para assuntos relacionados à saúde e meio-ambiente têm estreitas relações com grandes empresas farmacêuticas e químicas. A revelação foi feita pelo jornal inglês The Observer, a partir de dossiê obtido do governo.

Em reportagem publicada no domingo (13/7), o diário tornou público a preocupação do governo britânico com o assunto, conforme descrita no dossiê preparado pelo Departamento para Assuntos de Meio-ambiente e Agricultura (Defra). Os documentos revelam pela primeira vez a estreita relação entre as empresas e cientistas contratados pelo governo na qualidade de assessores.

Segundo o dossiê, muitos dos assessores pertencem ao quadro de funcionários e alguns até mesmo possuem ações das empresas citadas. O relatório mostra o descontentamento dos ministros Michael Meacher (Meio-ambiente) e Lord Whitty (Agricultura), preocupados que tais cientistas estivessem à frente de comitês dos mais diversos, que discutiam da qualidade do ar aos organismos geneticamente modificados.

Alguns exemplos obtidos no dossiê:

  • Phil Mullineaux, importante integrante do comitê que analisa a segurança de produtos transgênicos, recebeu verbas para pesquisa das gigantes Monsanto e Syngenta.
  • Mais de três quartos dos integrantes do comitê que assessora o governo sobre segurança alimentar têm relações com gigantes como Novartis e Astra-Zeneca. O chefe do comitê, Ieuan Hughes, é acionista de empresas como BP Amoco e Pharmacia.
  • Alan Boobis, do Imperial College e ex-presidente do comitê do governo que examina a segurança em pesticidas, recebeu verbas para pesquisa da GlaxoSmithKline, mas nunca as declarou. Outros integrantes do comitê estão ligados a empresas como Aventis, Astra Zeneca e Monsanto.
  • O líder do grupo que examina a qualidade do ar na Inglaterra, Stephen Holgate, é consultor da Merck.
  • Cerca de três quartos dos membros do comitê sobre riscos de câncer em produtos químicos e alimentícios ou trabalham ou detêm ações de grandes empresas de biotecnologia ou farmacêuticas.
Apesar de muitos dos cientistas citados terem declarado previamente as relações que tinham com empresas, o jornal diz que Meacher havia demonstrado tamanha preocupação com a estrutura dos comitês de consultoria ao ministério do Meio-ambiente, que intercedeu diversas vezes na tentativa de incluir pessoas de confiança entre os assessores.

"Os comitês têm importância crítica. Eles fornecem opiniões definitivas que servem como base para as ações dos ministérios. Eu tenho defendido que ninguém com relações comerciais significativas deveria ter a permissão de participar de tais comitês. É fundamental que eles sejam realmente independentes", disse Mercher ao The Observer.

"Como o público pode confiar no que os ministérios dizem se seus conselhos e posições são derivados de pessoas com relações nas indústrias?", questiona ao jornal Tony Juniper, diretor do Friends of the Earth.

Ouvidos pelo diário inglês, cientistas se defenderam, negando que o fato de terem relações com empresas pudesse prejudicar na qualidade do trabalho de assessoria ao governo.

Citado no dossiê, Alan Boobis disse: "A maioria dos cientistas de reputação internacional têm ou tiveram relações com a indústria no passado. Mas, é ridículo dizer que colocaríamos em risco nossa integridade profissional só porque temos umas poucas ações de empresas".


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