Couto, da FM-USP: Uma das abordagens que se mostraram mais eficazes foi apresentar a vacinação não apenas pelos riscos da doença, mas apontando a segurança e eficácia da vacina (foto: Érika de Faria/Temporal Filmes)

Escola Interdisciplinar FAPESP
Razões para a hesitação vacinal variam entre classes sociais
08 de dezembro de 2025

Tema foi abordado pela professora da USP Márcia Couto no penúltimo dia da Escola Interdisciplinar FAPESP: Humanidades, Ciências Sociais e Artes

Escola Interdisciplinar FAPESP
Razões para a hesitação vacinal variam entre classes sociais

Tema foi abordado pela professora da USP Márcia Couto no penúltimo dia da Escola Interdisciplinar FAPESP: Humanidades, Ciências Sociais e Artes

08 de dezembro de 2025

Couto, da FM-USP: Uma das abordagens que se mostraram mais eficazes foi apresentar a vacinação não apenas pelos riscos da doença, mas apontando a segurança e eficácia da vacina (foto: Érika de Faria/Temporal Filmes)

 

André Julião | Agência FAPESP – Nos últimos 13 anos, a antropóloga Márcia Couto, professora da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FM-USP), tem se dedicado a um tema que, de tão emergente, nem sequer tinha um termo formal até 2014, quando a Organização Mundial da Saúde (OMS) oficializou o conceito de hesitação vacinal – o atraso ou a recusa em aceitar vacinas recomendadas, mesmo quando os serviços de vacinação estão disponíveis. A OMS considera esse comportamento uma das dez maiores ameaças à saúde global.

A primeira contribuição que o grupo da pesquisadora do Departamento de Medicina Preventiva da FM-USP trouxe para o campo veio de uma então aluna de pós-graduação, que é médica pediatra infectologista.

“Ela vinha notando que pais de alta renda e escolaridade não estavam vacinando seus filhos”, disse Couto, palestrante do quarto dia da Escola Interdisciplinar FAPESP: Humanidades, Ciências Sociais e Artes, ocorrida no Instituto Principia, em São Paulo, entre 1º e 5 de dezembro (leia mais em: agencia.fapesp.br/56665).

A partir da inquietação de sua aluna, Couto desenvolveu uma série de estudos em que busca compreender, tanto pelo recorte de classe e escolaridade quanto de gênero e raça, as razões para a hesitação vacinal dentro do Brasil e em comparação com outros países tanto do Norte quanto do Sul Global.

Num dos estudos, foram analisadas 44 famílias de duas capitais brasileiras, São Luís (MA) e Florianópolis (SC), e outra da África do Sul, Capetown, num total de 62 pais ou cuidadores de crianças até 5 anos. Uma das conclusões foi que a hesitação em vacinar expressa disputas simbólicas, desigualdades e modos diversos de cuidado.

Para as famílias de baixa renda, os obstáculos são de cunho prático: acesso, tempo, esquecimento e atendimento precário. Para as de maior escolaridade e renda, as razões são geralmente críticas à indústria farmacêutica, valorização da autonomia parental e a percepção da vacina como a ameaça, em vez da doença, como se os eventuais efeitos adversos fossem mais perigosos do que a enfermidade em si.

“No caso da COVID-19, a não vacinação passa a ser instrumentalizada no Brasil pelo discurso político, algo que nem na ditadura militar ocorreu”, lembrou a pesquisadora, citando protestos contra as vacinas movidos por eleitores do então presidente da República. Outra pesquisa do seu grupo, inclusive, sobrepôs mapas de vacinação aos do eleitorado nas duas últimas eleições presidenciais, corroborando o que se observou nos protestos.

Em outros trabalhos, publicados entre 2014 e 2018, portanto antes da pandemia de COVID-19, o grupo da professora já havia levantado algumas crenças e percepções usadas como justificativas para a hesitação vacinal, observadas tanto em países do Sul como do Norte Global.

Antes mesmo dos “sommeliers de vacina” da pandemia, críticas à composição e aos mecanismos dos imunizantes e a desconfiança em relação à indústria farmacêutica já eram fatores apontados. Além disso, a crença de que a doença em questão não é grave, é rara ou foi eliminada – paradoxalmente, justamente pelo efeito da vacinação em massa – foi outro fator relatado. Soma-se o medo de efeitos adversos e uma valorização da imunidade natural sobre a imunidade vacinal, somada à crença de que hábitos de vida saudáveis dispensariam a vacinação.

Para a pesquisadora, a eliminação ou redução da hesitação vacinal deve ser enfrentada como uma tarefa essencial para a saúde pública, buscando-se tanto compreendê-la como desenvolvendo formas de superá-la.

Em estudo fruto de projeto apoiado pela FAPESP, seu grupo testou diferentes formas de comunicar a importância da vacinação de maneira efetiva. Uma das abordagens que se mostraram mais eficazes foi apresentar a vacinação não apenas pelos riscos da doença, mas apontando a segurança e eficácia da vacina. “Essa abordagem se mostrou mais efetiva para diminuir a resistência das pessoas às vacinas”, contou.
 

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