Niels Böhr (Oswaldo Mendes) e Werner Heisenberg (Carlos Palma)

Quando a ciência questiona a vida
02 de setembro de 2003

Grupo Arte Ciência no Palco parte para mais uma temporada em São Paulo divulgando a cultura científica no teatro. Dessa vez, a vida do matemático inglês Alan Mathison Turing (1912-1954) é que está na berlinda, na peça Quebrando Códigos

Quando a ciência questiona a vida

Grupo Arte Ciência no Palco parte para mais uma temporada em São Paulo divulgando a cultura científica no teatro. Dessa vez, a vida do matemático inglês Alan Mathison Turing (1912-1954) é que está na berlinda, na peça Quebrando Códigos

02 de setembro de 2003

Niels Böhr (Oswaldo Mendes) e Werner Heisenberg (Carlos Palma)

 

Por Eduardo Geraque

Agência FAPESP - Santiago do Chile, 1995. Do outro lado da Cordilheira dos Andes, está o publicitário e artista plástico Carlos Palma, chamado para resolver um urgente problema de trabalho para um cliente. Durante um momento de folga, à noite, ele resolve ir ao teatro.

Palma, também ator formado pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP), resolve ir assistir à montagem chilena de Einstein, do canadense Gabriel Emanuel, baseada na vida do cientista e autor da teoria da relatividade.

"Gostei muito do que vi. De volta ao Brasil, decidi que iria tentar montar aquela peça", disse Palma à Agência FAPESP. "Fui atrás dos direitos autorais e, durante as negociações, quiseram saber quem seria o ator principal", recorda. Sem ter outra pessoa a quem recorrer naquele momento, Palma decidiu aceitar o desafio de ser também o protagonista.

Einstein foi um grande sucesso de público e estimulou Palma a fechar seu estúdio de criação para se dedicar totalmente ao teatro. Não de um tipo comum, mas com perfil inovador, voltado à divulgação de temas científicos. Montou o grupo Arte Ciência no Palco, que há três semanas estreou em São Paulo sua quinta peça Quebrando Códigos. Palma mais uma vez é o protagonista, no papel do matemático inglês Alan Mathison Turing (1912 - 1954), considerado um dos criadores da computação digital.

Carlos Palma não tem pudor em admitir que, até 1995, não gostava de ciência. Segundo conta, achava o assunto bastante hermético, rígido, sem nenhuma ligação com arte, a abstração, o lado humano que os artistas gostam de explorar sobre os tablados. "Tive que estudar muito para fazer o Einstein. Comecei a perceber que os questionamentos da ciência muitas vezes nascem por causa do ser humano, do cientista. A ciência não é algo isolado e fechado em si. Ela tem muito da abstração que alimenta o teatro", disse.

Inserido no mundo da divulgação científica, principalmente depois do contato estabelecido com os professores Ildeu de Castro Moreira, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, e Ernst Hamburger e João Zanetic, ambos do Instituto de Física da USP, Palma começou a sentir "as fichas caindo", como contou.

Percebeu que a ciência e o teatro poderiam caminhar juntas. A temporada de Einstein no Rio de Janeiro, na Casa da Ciência, teve um papel fundamental nessa trajetória, ao mostrar o apoio popular a um tema científico. "O nosso teatro não tem o objetivo de ser didático. Queremos, por intermédio da ciência, chegar nos questionamentos que o ser humano costuma fazer", disse.

Bomba atômica e criptografia

Depois de Einstein e da peça infanto-juvenil Da Vinci, Pintando o Sete, o grupo Arte Ciência no Palco, estreou, em 2000, Copenhagen, um texto denso do inglês Michael Frayn. "Tivemos muita dificuldade em montá-la. Alguns atores, e até mesmo diretores, que foram convidados, não quiserem participar". Segundo Palma, as recusas ocorreram por dois motivos. "Alguns achavam que ninguém iria assistir aquilo. Outros confessaram que não estavam preparados".

Copenhagen contou a história da bomba atômica e do conflito humano e ético estabelecido por dois cientistas importantes em seu desenvolvimento, Niels Böhr e Werner Heisenberg. Dirigida por Marco Antonio Rodrigues, foi outro sucesso de público.

Depois de montar a peça Perdida, em 2001, que não teve boa repercussão, o grupo volta ao palco agora. "Quebrando Códigos tem tudo para dar certo", acredita Palma. No texto do inglês Hugh Whitemore, a essência do teatro do grupo está presente outra vez. "Vamos usar a ciência para mostrar as contradições do ser humano e as relações sociais e políticas que isto pode ter", define Palma.

No palco, a história de Alan Turing, um gênio da matemática que teve participação fundamental na Segunda Guerra Mundial, quando foi um dos principais responsáveis por decifar os códigos do sistema de criptografia Enigma, utilizado para a comunicação dos nazistas. O inglês foi o primeiro a propor a idéia de um computador capaz de executar diferentes programas. Foi também o autor do Teste de Turing, utilizado por especialistas em inteligência artificial como um paradigma para medir a capacidade de uma máquina de pensar.

"Tenho um sonho para os próximos anos", fala Palma sobre o futuro. "Gostaria de promover um concurso de dramaturgia científica." Quem entender que a arte e a ciência podem andar juntas, e ainda apreciar as histórias da física, química, biologia ou matemática já tem potencial para se candidatar, mesmo antes de o concurso abrir. "Chegamos a contratar um autor para escrever sobre Darwin, mas o texto ficou didático demais. Resolvemos deixar o material de lado".

Quebrando Códigos é dirigida por Roberto Vignati e conta com as participações de Rubens de Falco, Flavia Pucci e Oswaldo Mendes. A peça está em cartaz no Espaço Promon, à Av. Juscelino Kubitschek, 1830, em São Paulo. O telefone do teatro é (11) 3847-4111.

Mais informações: http://www.arteciencianopalco.com.br.


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