Benefícios promovidos pela bactéria Bifidobacterium longum são avaliados em pesquisa feita na USP com camundongos (foto:Mark Schell/University of Georgia)
Benefícios promovidos pela bactéria Bifidobacterium longum são avaliados em pesquisa feita na USP com camundongos
Benefícios promovidos pela bactéria Bifidobacterium longum são avaliados em pesquisa feita na USP com camundongos
Benefícios promovidos pela bactéria Bifidobacterium longum são avaliados em pesquisa feita na USP com camundongos (foto:Mark Schell/University of Georgia)
Por Karina Toledo, de Caxambu
Agência FAPESP – Resultados de uma pesquisa realizada na Universidade de São Paulo (USP) indicam que o consumo do probiótico Bifidobacterium longum pode trazer benefícios para quem sofre de asma.
Em experimentos feitos com camundongos, o tratamento com a bactéria diminuiu a quantidade de muco no pulmão e a presença de mediadores inflamatórios típicos de doença alérgica das vias aéreas. Além disso, foi observada diminuição na hiper-reatividade brônquica – contração exagerada da musculatura lisa dos brônquios característica da asma.
Os resultados preliminares da pesquisa, realizada com apoio da FAPESP, foram apresentados durante a 28ª Reunião Anual da Federação de Sociedades de Biologia experimental (FeSBE), realizada entre os dias 21 e 24 de agosto em Caxambu, Minas Gerais.
“Nossa hipótese é que o acetato, um ácido graxo de cadeia curta produzido em grandes quantidades por bactérias da espécie B. longum (BL), seja o responsável pela diminuição da inflamação alérgica”, disse Caroline Marcantonio Ferreira, pesquisadora do Instituto de Ciências Biomédicas da USP e coordenadora da pesquisa.
Segundo Ferreira, são considerados probióticos os microrganismos que, quando ingeridos vivos e em quantidades adequadas, promovem benefícios à saúde.
“Dados da literatura científica indicam que devem existir entre 107 e 109 unidades formadoras de colônia por grama ou por mililitro do alimento para entrar na definição de probiótico. Em quantidades muito pequenas, os microrganismo não conseguem colonizar o intestino e promover benefícios”, afirmou.
Ferreira conta que o uso de probióticos tem sido recomendado desde o século 19. Até pouco tempo atrás, no entanto, o objetivo era apenas promover benefícios locais, como a regularização do intestino e o combate a doenças inflamatórias intestinais crônicas.
“Nos últimos cinco anos, porém, estudos começaram a apontar efeitos benéficos dos probióticos em órgãos distantes, como pulmão e cérebro. Há trabalhos mostrando até que a microbiota intestinal influencia o comportamento. Mas ainda há muitas lacunas e essas relações precisam ser mais bem estudadas. Nós estamos tentando desvendar o efeito dos probióticos sobre a asma”, explicou.
Para a realização do experimento, os animais foram divididos em seis grupos. O primeiro, considerado controle, recebeu apenas placebo e não passou pelo procedimento para indução da asma.
No segundo grupo, foi induzida a asma e os animais foram tratados apenas com placebo. O terceiro grupo apenas recebeu o tratamento com o probiótico BL. O quarto, recebeu apenas tratamento com um outro tipo de probiótico chamado Bifidobacterium adolescentis (BA), que também produz acetato, mas em menor quantidade. O quinto grupo foi tratado com BL e passou pela indução da asma. O sexto, foi tratado com BA e passou pela indução da asma.
“A utilização de duas bactérias probióticas que produzem diferentes quantidades de acetato permite avaliar a importância dessa substância – e a quantidade necessária – para a prevenção da asma”, afirmou a pesquisadora.
O tratamento com os dois tipos de probióticos teve início duas semanas antes do procedimento que induziu nos animais uma inflamação alérgica semelhante à da asma. As bactérias foram administradas diretamente no esôfago dos animais por um método conhecido como gavagem.
“Camundongos não sofrem de asma naturalmente, mas há várias formas de induzir a doença para criar um modelo experimental. Nós usamos o método mais clássico, que é a administração de uma proteína do ovo chama ovalbumina, alergênica para os roedores”, contou Ferreira.
Em um primeiro momento, a ovalbumina foi administrada sistemicamente duas vezes em um intervalo de 7 dias, para promover a sensibilização do sistema imunológico. Após o intervalo de 14 e 21 dias, a proteína foi novamente administrada no pulmão. “As células de defesa, já sensibilizadas, agem rapidamente e desencadeiam a inflamação alérgica no local”, contou Ferreira.
Durante o período de indução da alergia, o tratamento com os probióticos foi mantido. No final, os pesquisadores compararam diversos marcadores inflamatórios nos diferentes grupos.
A análise das vias aéreas mostrou que, no grupo controle, 90% das células eram macrófagos. Já nos animais asmáticos não tratados, entre 60% e 70% das células presentes na amostra eram eosinófilos, consideradas marcadores da asma.
No grupo tratado com BL, a presença de eosinófilos caiu pela metade, ficando entre 20% e 30%. Nos animais tratados com BA foi observada uma redução menor desse marcador, que ficou entre 40% a 45%.
Para medir a presença de muco, uma amostra do tecido pulmonar foi retirada para análise histológica. O grupo asmático tratado com BL apresentou resultados semelhantes ao do grupo controle – o que significa que o probiótico inibiu quase totalmente a produção de muco. Já o grupo tratado com BA apresentou resultado equivalente aos asmáticos tratados com placebo: 80% das células estavam cobertas de muco.
Por último, no teste de função pulmonar, os pesquisadores observaram que o tratamento com BL reduziu em 35% a hiper-reatividade brônquica. O tratamento com BA não alterou esse parâmetro.
Modular o sistema biológico
Em um outro experimento, os animais asmáticos foram tratados apenas com o acetato – em dois diferentes protocolos de administração – e os resultados foram ainda mais promissores do que o tratamento com os probióticos.
“Para o primeiro grupo administramos o acetato sistemicamente, por meio de injeções intraperitoneais diárias. Para o outro grupo, o acetato foi colocado na água. Aparentemente a administração na água foi ainda mais eficaz. Talvez isso ocorra porque a todo momento o animal bebe o líquido e mantém estável o nível de acetato no organismo ao longo do dia. Mas precisamos repetir o experimento para poder afirmar com certeza”, disse Ferreira.
A hipótese levantada pela pesquisadora é de que o acetato atua por meio de um receptor chamado GPR43, expresso nas células dendríticas do sistema imunológico.
“Quando o receptor é ativado nessa células, de alguma maneira ainda não muito conhecida, ocorre a inibição da resposta inflamatória do tipo Th2 nas vias aéreas (tipo de resposta inflamatória alérgica)”, contou.
O próximo passo, de acordo com Ferreira, é tratar os camundongos asmáticos com a bactéria B. longum já morta. O objetivo é verificar se o benefício do probiótico está de fato relacionado a uma substância produzida pelo microrganismo ou se a simples presença da membrana bacteriana é capaz de modular o sistema imunológico.
“Para provar definitivamente que o benefício se deve ao acetato precisaríamos produzir uma bactéria geneticamente modificada para não produzir essa substância. Seria um desafio muito grande”, disse Ferreira.
O contrário também poderia ser feito, caso fique comprovada a relação entre o acetato e a diminuição da inflamação, afirmou Ferreira. “Poderíamos modificar geneticamente a bactéria para fazê-la produzir ainda mais acetato, o que, em tese, tornaria o tratamento ainda mais eficaz. Esse é o caminho dos estudos com probióticos. Desvendar como eles atuam e para quais doenças podem trazer benefícios”, afirmou Ferreira.
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