Pesquisa com participação de cientistas da USP será publicada na Proceedings of the National Academy of Sciences

Polimorfismo em antígeno de grupo sanguíneo afeta suscetibilidade à malária
29 de novembro de 2011

Pesquisa com participação de cientistas da USP será publicada na Proceedings of the National Academy of Sciences

Polimorfismo em antígeno de grupo sanguíneo afeta suscetibilidade à malária

Pesquisa com participação de cientistas da USP será publicada na Proceedings of the National Academy of Sciences

29 de novembro de 2011

Pesquisa com participação de cientistas da USP será publicada na Proceedings of the National Academy of Sciences

 

Por Fábio de Castro

Agência FAPESP – Os receptores conhecidos como antígenos do grupo sanguíneo Duffy são fundamentais para que o Plasmodium vivax – um dos principais causadores da malária no mundo – possa invadir os eritrócitos, as células do sangue humano nas quais o parasita se multiplica durante seu ciclo vital.

De acordo com um estudo internacional, com participação brasileira, um polimorfismo no antígeno Duffy do eritrócito afeta a suscetibilidade à malária provocada pelo Plasmodium vivax.

O estudo, que será publicado na revista Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), foi realizado por cientistas do Universidade de Cleveland, da Universidade do Sul da Flórida, em Tampa – ambas nos Estados Unidos –, da Universidade de Oxford, no Reino Unido, e do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da Universidade de São Paulo (USP).

Participaram do trabalho Marcelo Urbano Ferreira, professor de Parasitologia do ICB-USP, e Monica da Silva-Nunes, professora do Departamento de Ciências da Saúde e Educação Física da Universidade Federal do Acre. Silva-Nunes fez doutorado direto com Bolsa da FAPESP, sob orientação de Ferreira.

Ferreira coordena atualmente três projetos apoiados pela FAPESP na modalidade Auxílio à Pesquisa – Regular: “Dinâmica populacional de polimorfismos de Plasmodium vivax na Amazônia rural brasileira”, Resistência a cloroquina em Plasmodium vivax: avaliação fenotípica e molecular na Amazônia Ocidental brasileira” e “Caracterização fenotípica e funcional de populações de Linfócitos T CD4+ com possível função imunorreguladora na malária humana”.

A malária é uma das principais endemias parasitárias brasileiras, com 460 mil casos clínicos notificados na Amazônia brasileira em 2007. O Plasmodium vivax é a principal causa de malária fora da África, afetando especialmente a Ásia e as Américas. O Plasmodium falciparum, cujo genoma foi sequenciado em 2002, provoca o tipo mais severo da doença.

De acordo com o estudo, a importância do Plasmodium vivax como ameaça à saúde pública tem aumentado em relação ao falciparum. O vivax é o único entre os parasitas da malária cuja invasão de eritrócitos é quase que completamente dependente do receptor da superfície do glóbulo vermelho do sangue conhecido como antígeno do grupo sanguíneo-Duffy (Fy).

O Fy, segundo o estudo, tem duas variantes imunologicamente distintas, A e B, codificadas pelos alelos denominados Fya e Fyb, que diferem entre si por uma única mutação. Embora o antígeno Duffy seja o ligante que permite a invasão do glóbulo vermelho pelo parasita, até agora, de acordo com os cientistas, não se havia confirmado se esse polimorfismo afeta a suscebilidade clínica da malária transmitida pelo vivax.

No estudo, os cientistas mostraram que, em comparação ao Fyb, o Fya diminui de forma considerável a ligação do parasita na superfície do eritrócito, estando associado com uma redução do risco de malária causada pelo vivax.

Os eritrócitos que expressam Fya têm capacidade de ligação de 41% a 50% mais baixa em comparação com as células Fyb. De acordo com Ferreira, a relação do antígeno Duffy com a suscetibilidade à malária foi descoberta na década de 1970, durante a guerra do Vietnã.

“Na região existem tanto o vivax como o falciparum, mas um fato chamava a atenção: os soldados brancos contraíam infecções das duas espécies e os negros quase nunca contraíam a malária vivax. Como era conhecido que o plasmodium invade os glóbulos vermelhos, logo surgiu a hipótese de que, na população negra, algo nessas células evitava a invasão do parasita”, disse Ferreira à Agência FAPESP.

Ainda na década de 1970, segundo ele, descobriu-se e comprovou-se experimentalmente que os indivíduos com antígeno Duffy negativo são resistentes à infecção por vivax.

“Sabia-se que na África Ocidental a maior parte dos indivíduos são Duffy negativo e o restante, em geral, são Fyb. Já na Ásia, quase todo mundo é Fya. Nas populações europeias há uma mistura mais equilibrada de Fya e Fyb. Até aquela época, achava-se que o que determinava a maior suscetibilidade era ter fenótipo de Duffy positivo, não importando se se tratava de Fya ou Fyb”, explicou.

Quebra-cabeça

O novo estudo indica que há uma diferença de grau de suscetibilidade à malária entre os indivíduos Fya e Fyb. E essa diferença se deve ao fato de que a proteína do parasita que interage com o antígeno Duffy é capaz de interagir de maneira mais eficiente com o Fyb.

A descoberta tem impacto sobre teses amplamente divulgadas na área de genética de populações. Segundo Ferreira, sempre se acreditou que o vivax foi o fator seletivo que assegurou a fixação do fenótipo Duffy negativo na África.

“A hipótese era que, por conferir resistência contra o vivax, o fenótipo de Duffy negativo era vantajoso no continente africano. Mas esse raciocínio tem alguns problemas. Um deles é que a malária transmitida pelo vivax não é uma doença tão grave assim”, disse.

Outro ponto contraditório da hipótese, segundo Ferreira, é que o vivax se originou a partir de parasitas de macacos asiáticos e os parasitas humanos surgiram naquele continente.

“Não faria sentido um parasita se originar na Ásia, depois de muito tempo chegar a outros continentes e selecionar um fenótipo de resistência na África, mas não na Ásia, onde o convívio com humanos é muito mais antigo”, declarou.

O novo estudo, segundo ele, aponta para uma solução do quebra-cabeça: o tipo ancestral seria o Fyb. Na África teria sido selecionada uma mutação não exatamente na região promotora de Fy.

“Assim, o que chamamos de Duffy negativo é um indivíduo que é Fyb na região codificadora do gene. O Duffy negativo, que é encontrado na África, seria um Fyb com uma mutação na região promotora. Em outras palavras: o indivíduo não expressa a proteína Fyb no glóbulo vermelho. Já o Fya, uma mutação na região codificadora do gene, teria sido selecionado na Ásia”, explicou.

De acordo com o estudo, o que provavelmente aconteceu é que na Ásia pressão seletiva exercida pelo vivax selecionou Fya, enquanto na África teria sido selecionada outra mutação, essa na região promotora do gene, resultando no fenótipo Duffy negativo”, segundo o cientista.

O artigo Fya/Fyb antigen polymorphism in human erythrocyte Duffy antigen affects susceptibility to Plasmodium vivax malaria, de Marcelo Urbano Ferreira, Mônica Nunes e outros, pode ser lido por assinantes da PNAS em www.pnas.org .

 

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