Objetivo da Plataforma Brasileira sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (BPBES) é posicionar os dois temas no cerne do modelo de desenvolvimento do país de forma a acelerar a transição para a sustentabilidade (foto:Parque Estadual do Ibitipoca/MG/Wikimedia Commons)
Objetivo da Plataforma Brasileira sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (BPBES) é posicionar os dois temas no cerne do modelo de desenvolvimento do país de forma a acelerar a transição para a sustentabilidade
Objetivo da Plataforma Brasileira sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (BPBES) é posicionar os dois temas no cerne do modelo de desenvolvimento do país de forma a acelerar a transição para a sustentabilidade
Objetivo da Plataforma Brasileira sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (BPBES) é posicionar os dois temas no cerne do modelo de desenvolvimento do país de forma a acelerar a transição para a sustentabilidade (foto:Parque Estadual do Ibitipoca/MG/Wikimedia Commons)
Elton Alisson | Agência FAPESP – Um grupo de mais de 50 pesquisadores brasileiros, ligados às principais universidades e instituições de pesquisa do país, reunirá e sintetizará os dados disponíveis sobre a biodiversidade e serviços ecossistêmicos (como polinização e proteção de recursos hídricos) no Brasil para elaborar o primeiro diagnóstico nacional sobre esses temas.
Eles integram a Plataforma Brasileira sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (BPBES, na sigla em inglês), lançada oficialmente na terça-feira (21/02), durante um evento na FAPESP.
Como um grupo de trabalho criado pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), a BPBES terá a missão de produzir sínteses do melhor conhecimento disponível pela ciência e saberes tradicionais sobre biodiversidade, serviços ecossistêmicos e suas relações com o bem-estar humano no Brasil para auxiliar os tomadores de decisão na elaboração e implementação de ações voltadas à conservação e ao desenvolvimento sustentável.
A Plataforma Brasileira é apoiada pelo Programa FAPESP de Pesquisa em Caracterização, Conservação, Restauração e Uso Sustentável da Biodiversidade (BIOTA-FAPESP), pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e pela Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável (FBDS).
“Infelizmente, os dados sobre a biodiversidade e serviços ecossistêmicos no Brasil estão limitados hoje não só à sua origem, como à universidade ou à instituição em que o pesquisador que os coletou está vinculado, mas também aos órgãos responsáveis por abrigá-los, como os ministérios do Meio Ambiente e da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações e às instituições a eles subordinados”, disse Carlos Joly, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e um dos coordenadores do BPBES, à Agência FAPESP.
“Queremos integrar esses dados a fim de preencher uma lacuna na interlocução desse conjunto de informações científicas de alta qualidade com os tomadores de decisão, a exemplo do que o BIOTA-FAPESP conseguiu fazer no Estado de São Paulo”, afirmou Joly, que também é membro da coordenação do programa, lançado em 1999 pela FAPESP.
De acordo com o pesquisador, uma das ideias iniciais do BIOTA-FAPESP era disponibilizar as informações coletadas durante as pesquisas gratuitamente na internet para que fossem utilizadas por técnicos de órgãos como a Secretaria Estadual do Meio Ambiente, por exemplo.
A experiência mostrou, contudo, que era preciso traduzir as informações geradas para uma linguagem que pudesse ser mais facilmente compreendida e utilizada pelos tomadores de decisão para a elaboração de políticas públicas, como o Mapa de Áreas Prioritárias para Conservação e Restauração no Estado de São Paulo.
“Com isso é possível ter um instrumento que pode ser utilizado pelo gestor público. É essa ideia que pretendemos replicar para todo o Brasil com a BPBES, aumentando a interlocução que temos não só com os ministérios do Meio Ambiente e da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, como também com o do Planejamento, da Agricultura e outros setores da sociedade, como a iniciativa privada”, exemplificou.
Processo de elaboração
Os pesquisadores integrantes da Plataforma Brasileira pretendem lançar o diagnóstico em julho de 2018.
Como etapa inicial, eles prepararam um documento, intitulado “Contribuições para o diálogo intersetorial: a construção do diagnóstico brasileiro sobre biodiversidade e serviços ecossistêmicos”.
Com base no documento de 10 páginas foi iniciado um processo de consulta a diferentes setores da sociedade brasileira que em suas atividades, direta ou indiretamente, afetam ou são afetados pela biodiversidade e os serviços ecossistêmicos – como organizações não governamentais (ONGs), órgãos do governo, setor industrial, agropecuário, comunidades indígenas e representantes da comunidade internacional e da imprensa, entre outros – a fim de promover ajustes no diagnóstico.
“O relatório deverá ter um tom propositivo e crítico, mas não prescritivo, com o objetivo claro de posicionar a biodiversidade e os serviços ecossistêmicos no cerne do modelo de desenvolvimento do país de forma a acelerar a transição para a sustentabilidade”, disse Fábio Scarano, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), diretor da FBDS e membro da coordenação da BPBES, durante o evento.
“Pretendemos conseguir tirar gradativamente a biodiversidade e os serviços ecossistêmicos da posição marginal em que se encontram hoje no processo de desenvolvimento do país”, afirmou.
Alguns dos apontamentos feitos pelos pesquisadores no documento preparatório do relatório são que a economia depende do uso sustentável da biodiversidade e dos serviços ecossistêmicos e que o uso desses ativos da natureza não tem implicado na redução de pobreza no país.
Uma pesquisa de doutorado, que está sendo realizada por Thaís Kasecker sob orientação de Scarano, apontou que 52% da população dos 437 municípios brasileiros com maior cobertura vegetal no Brasil vive em condições de pobreza.
A maioria dessa população, que representa 13% dos pobres brasileiros, vive no oeste amazônico, na Caatinga – especialmente na bacia do São Francisco – e no Cerrado, apontou Scarano.
“Se para sair da pobreza essas pessoas recorrerem ao modelo tradicional de desenvolvimento econômico, que é o da substituição da natureza por outros tipos de uso da terra, corremos o risco de perder quase metade da cobertura vegetal brasileira. Por isso, precisamos pensar em meios de melhorar a qualidade de vida dessas populações que têm muita biodiversidade, mas não vivem tão bem, mantendo a biodiversidade e os serviços ecossistêmicos ”, indicou.
De acordo com o pesquisador, o relatório apresentará não só problemas, mas também indicará soluções que estão em curso e deverá ter equilíbrio regional – de regiões geopolíticas e biomas do país –, de ambientes terrestre, de água doce e marinho, e contemplará não só o conhecimento científico, mas também o indígena e de comunidades tradicionais.
O relatório terá cinco capítulos e uma estrutura muito parecida com os relatórios publicados pela Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (IPBES), afirmou.
Fonte de inspiração
Lançada em 2012, no Panamá, com o objetivo de informar aos governos o estado do conhecimento sobre biodiversidade e serviços ecossistêmicos para a conservação e o desenvolvimento sustentável – a exemplo do que o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) faz em relação ao clima –, a IPBES serviu de inspiração para a criação da BPBES.
Em 2015, um grupo de 18 pesquisadores que participam dos grupos de trabalho e forças-tarefa da IPBES se reuniu em Indaiatuba, no interior de São Paulo, e propôs a criação da BPBES e uma agenda de trabalho, iniciando pela elaboração do primeiro diagnóstico brasileiro sobre biodiversidade e serviços ecossistêmicos.
“A ideia de criação do Painel Brasileiro surgiu justamente em razão de um conjunto expressivo de pesquisadores brasileiros participarem dos diversos grupos de trabalho do IPBES”, disse Joly, que é co-chair do Painel Multidisciplinar de Especialistas (MPE, na sigla em inglês) da IPBES.
“O fato de termos um grupo tão grande de brasileiros atuando na IPBES é um reconhecimento da qualidade da ciência que se faz em um país megadiverso e que, portanto, lida diariamente com os conflitos de integração da biodiversidade e serviços ecossistêmicos com outros setores da sociedade, que gostaríamos que tivessem uma maior compatibilidade”, avaliou Joly.
No ano passado, a IPBES publicou seu primeiro diagnóstico global sobre polinização relacionada à produção de alimentos e sobre metodologias para construção e análise de cenários e modelagem de biodiversidade.
O diagnóstico sobre metodologias contou com a participação de Jean Paul Metzger, professor do Instituto de Biologia da USP.
E a coordenação do diagnóstico global sobre polinização foi dividida entre Vera Imperatriz Fonseca, professora do Departamento de Ecologia do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (ICB-USP) e membro do Programa BIOTA-FAPESP, e Simon Potts, professor da University of Reading, da Grã-Bretanha.
O diagnóstico foi apresentado e discutido na 13ª Conferência das Partes da Convenção da Diversidade Biológica (CDB), realizada no México no início de dezembro de 2016, e motivou a criação de uma coalizão internacional para tomar medidas nacionais para proteger os polinizadores e seus habitats.
“O sonho de todo cientista é ser relevante. E acho que, no caso das organizações governamentais e internacionais na área de biodiversidade [como a IPBES], elas estão conseguindo realizar um pouco esse sonho de ser relevante”, disse José Goldemberg, presidente da FAPESP, durante o evento.
Na avaliação dele, os cientistas de São Paulo e a ação da FAPESP têm sido muito eficazes na área de biodiversidade porque têm conseguido influir efetivamente nas políticas públicas relacionadas à área.
Um dos exemplos dados por ele foi a elaboração do mapa de zoneamento econômico e ecológico do Estado de São Paulo, realizado pelo Programa BIOTA/FAPESP, que delimitou as áreas onde poderiam ser instaladas usinas de cana-de-açúcar no estado, sem afetar a biodiversidade e os serviços ecossistêmicos.
“O mapa de São Paulo foi ‘pintado’ em várias cores e ficou estabelecido que em alguns lugares do estado não se pode plantar cana e ponto final. Com isso, um projeto de instalação de uma usina em uma dessas áreas passou a nem entrar mais no processo de avaliação da Secretaria Estadual do Meio Ambiente”, afirmou Goldemberg. “Na área de Mata Atlântica em São Paulo é inútil entrar com qualquer espécie de pedido de instalação de empreendimentos hoje.”
Também participaram do evento Helena Nader, presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), e José Pedro de Oliveira Costa, secretário de Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente (MMA), entre outros.
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