Áreas de recuperação de substância cinzenta (vermelho) e substância branca (azuis) após a cirurgia para epilepsia de lobo temporal. (foto: divulgação)

Plasticidade premiada
05 de março de 2009

Trabalhos de pesquisadora da Unicamp, que resultaram em programa de computador capaz de investigar a plasticidade cerebral, rendem dois prêmios nacionais e três internacionais em neurologia e epilepsia

Plasticidade premiada

Trabalhos de pesquisadora da Unicamp, que resultaram em programa de computador capaz de investigar a plasticidade cerebral, rendem dois prêmios nacionais e três internacionais em neurologia e epilepsia

05 de março de 2009

Áreas de recuperação de substância cinzenta (vermelho) e substância branca (azuis) após a cirurgia para epilepsia de lobo temporal. (foto: divulgação)

 

Por Thiago Romero

Agência FAPESP – Novas funcionalidades em um software capaz de investigar a plasticidade cerebral após a cirurgia de epilepsia, desenvolvidas por Clarissa Yasuda, doutoranda da Faculdade de Medicina da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), renderam à pesquisadora e colegas, no último ano, dois prêmios nacionais e três internacionais na área de neurologia e epilepsia.

Clarissa tem apoio da FAPESP na modalidade Bolsa de Doutorado e realiza trabalhos de pesquisa no âmbito do programa Cooperação Interinstitucional de Apoio a Pesquisas sobre o Cérebro (CInAPCe) da Fundação. Ela é orientada pelo professor Fernando Cendes e co-orientada pelo docente Helder Tedeschi, ambos do Departamento de Neurologia da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp.

São dois os estudos premiados: um sobre a epilepsia refratária de lobo temporal e outro que aborda a epilepsia extratemporal. “O meu foco nesses projetos são os pacientes com epilepsia candidatos à cirurgia, uma vez que tentaram diversos medicamentos e continuam com crises”, disse à Agência FAPESP.

A epilepsia de lobo temporal constitui a forma mais comum da doença, com um grande número de pacientes que não responde aos medicamentos. Por isso, explica a pesquisadora, o tratamento cirúrgico tem sido a melhor opção de tratamento, podendo oferecer um bom controle das crises em aproximadamente 70% dos pacientes submetidos à cirurgia.

O primeiro estudo premiado em 2008 investigou as áreas de atrofia de substância branca e cinzenta em regiões do cérebro associadas a um pior ou melhor resultado cirúrgico. Esse mesmo trabalho também investigou se, após a cirurgia, os pacientes que conseguiram alcançar um bom controle de crises epilépticas poderiam se beneficiar do fenômeno de plasticidade cerebral e conseguir recuperar áreas com atrofia das substâncias branca e cinzenta.

O outro trabalho envolveu pacientes com epilepsia refratária de origem extratemporal, sem, no entanto, fazer relações com o resultado cirúrgico. “Nesse trabalho, investigamos se esses pacientes apresentavam áreas de atrofia de substância branca, como já tinha sido descrito para os pacientes com epilepsia temporal”, explicou.

Um dos principais resultados dos estudos foi a criação de novos códigos para o software SPM2 (Statistical Parametric Mapping, na sigla em inglês), utilizado na pesquisa de neuroimagem e que pode ser baixado na internet em www.fil.ion.ucl.ac.uk.

Essas novas funcionalidades permitem a análise das evidências de neuroplasticidade (regeneração e alterações de volume) nas substâncias branca e cinzenta associadas ao controle de crises em pacientes após a cirurgia. “O fenômeno de neuroplasticidade basicamente consiste na capacidade cerebral de se recuperar de lesões”, disse.

Branca e cinzenta

A tecnologia do novo software permite a aplicação da técnica conhecida como morfometria baseada em voxel (VBM) para a análise das substâncias branca e cinzenta do cérebro em ressonâncias magnéticas pré e pós-operatórias nos pacientes.

“A técnica de VBM permite comparações estatísticas entre grupos de indivíduos, mas não é utilizada para diagnóstico clínico. O novo software possibilitou o estudo das imagens pós-operatórias de forma que pudemos compará-las às pré-operatórias, determinando as áreas com relativo aumento de substâncias branca e cinzenta após a intervenção cirúrgica”, disse Clarissa.

Para a validação com os novos códigos, o software foi testado em um estudo comparativo com 67 pacientes submetidos à cirurgia de epilepsia no Ambulatório de Epilepsia do Hospital de Clínicas da Unicamp.

Por meio da técnica de VBM, a pesquisadora conseguiu quantificar e localizar áreas com aumento de substâncias branca e cinzenta após a cirurgia de epilepsia. As imagens foram analisadas e processadas no Laboratório de Neuroimagem do HC-Unicamp.

Com o software foi possível provar que o cérebro consegue se recuperar após sofrer intervenção cirúrgica. “Ao dividirmos esses pacientes operados em grupos, verificamos nas imagens pré-operatórias que os que ficaram livre de crises após a cirurgia apresentavam um padrão restrito de atrofia da substância cinzenta, enquanto que o grupo com crises refratárias após a cirurgia tinha padrão difuso de atrofia de substância cinzenta antes da cirurgia”, apontou.

Segundo Clarissa, a análise comparativa pré e pós-operatória nos pacientes operados indicou que a capacidade de recuperação dessas áreas com atrofia foi significativamente maior no grupo que ficou livre de crises. “Isso significa que o fenômeno de neuroplasticidade depende do controle das crises epilépticas”, disse.

As honrarias nacionais recebidas pela pesquisadora foram o Prêmio Paulo Niemeyer em Cirurgia de Epilepsia, oferecido no 32º Congresso Brasileiro de Epilepsia, além dos prêmios Paulo Pinto Pupo e Alois para Doença de Alzheimer, ambos oferecidos pela Academia Brasileira de Neurologia.

Os estudos de Clarissa estiveram ainda entre os melhores trabalhos apresentados no 62º Encontro Anual da Academia Americana de Epilepsia, em Seattle, nos Estados Unidos, e no 5º Congresso Latino-Americano de Epilepsia, em Montevidéu, no Uruguai.

“Vale ressaltar o caráter multidisciplinar da pesquisa. O trabalho com os pacientes operados, por exemplo, não teria sido realizado sem a cooperação dos clínicos, cirurgiões, engenheiros e físicos. Os prêmios recebidos por nossa equipe no contexto do projeto CInAPCe mostram que esse tipo de cooperação é essencial para que essas pesquisas inovadoras sejam desenvolvidas no Brasil”, destacou.

Em julho de 2007, com estudos sobre pacientes de epilepsia refratários à intervenção cirúrgica, a pesquisadora recebeu o Prêmio Jovem Pesquisador, no 27º Congresso Internacional de Epilepsia, em Cingapura. Na ocasião, oito trabalhos foram selecionados entre mais de 800 de todo o mundo.
 

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