Estima-se que as hiperacumuladoras de metais representem apenas 0,2% de todas as plantas conhecidas atualmente; a Pycnandra acuminata (na foto) já é usada comercialmente para agromineração na Indonésia, por exemplo (imagem: Henry Benoît/Biodiversity4all)

Mineração
Pesquisadores buscam encontrar no Brasil plantas que acumulam altos teores de metais para agromineração
16 de julho de 2025

Por meio de expedições em campo e análise de coleções de herbários foram identificadas espécies hiperacumuladoras de níquel, zinco e manganês; projeto foi apresentado durante a 77ª Reunião Anual da SBPC, no campus da UFRPE, em Recife

Mineração
Pesquisadores buscam encontrar no Brasil plantas que acumulam altos teores de metais para agromineração

Por meio de expedições em campo e análise de coleções de herbários foram identificadas espécies hiperacumuladoras de níquel, zinco e manganês; projeto foi apresentado durante a 77ª Reunião Anual da SBPC, no campus da UFRPE, em Recife

16 de julho de 2025

Estima-se que as hiperacumuladoras de metais representem apenas 0,2% de todas as plantas conhecidas atualmente; a Pycnandra acuminata (na foto) já é usada comercialmente para agromineração na Indonésia, por exemplo (imagem: Henry Benoît/Biodiversity4all)

 

Elton Alisson, de Recife | Agência FAPESP – Nos últimos anos um grupo de pesquisadores vinculados ao Departamento de Agronomia da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), em Recife, tem percorrido áreas de preservação ambiental de mineradoras e também os principais herbários do país buscando identificar espécies de plantas raras e de alto interesse econômico. São as hiperacumuladoras de metais – espécies de plantas que absorvem níquel, zinco, cobre, manganês e outros minérios de alto valor comercial do solo em concentrações centenas ou milhares de vezes maiores em comparação com outras.

Em razão dessa capacidade, elas têm sido utilizadas para promover a chamada agromineração: o uso de plantas para extrair metais de ambientes contaminados e comercializá-los, atendendo aos preceitos da economia circular.

“O trabalho de identificar essas plantas é como tentar encontrar agulha no palheiro”, comparou Clístenes Williams Araújo do Nascimento, professor da UFRPE e pioneiro no desenvolvimento da técnica no Brasil, durante palestra proferida segunda-feira (14/07) na 77ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), que acontece até sábado (19/07) no campus da UFRPE, em Recife.

“Mas já encontramos algumas espécies de plantas hiperacumuladoras de níquel, zinco e manganês no país – incluindo algumas novas, que eram desconhecidas –, que estão disponíveis para iniciarmos testes em casa de vegetação e em campo para levarmos até as mineradoras e implantarmos em tecnossolos [substratos minerais produzidos a partir de rejeitos da mineração]”, afirmou Nascimento, que é engenheiro agrônomo graduado pela Universidade Federal da Paraíba com doutorado em solos e nutrição de plantas pela Universidade Federal de Viçosa e pós-doutorados pela University of Massachusetts e pela North Carolina State University.

De acordo com Nascimento, estima-se que as hiperacumuladoras de metais representem apenas 0,2% de todas as plantas conhecidas atualmente – um universo de 350 mil a 400 mil espécies catalogadas. Duas delas, como a Pycnandra acuminata, já são usadas comercialmente para a agromineração em países como a Albânia, além da Malásia e da Indonésia.

“Essas espécies são adaptadas ao clima temperado e tropical. No Brasil ainda não identificamos uma hiperacumuladora ideal e estamos promovendo uma verdadeira caça por todo o país, que tem grande potencial para essa área porque tem a maior biodiversidade de plantas do planeta”, disse Nascimento.

Na concepção da agromineração, as plantas hiperacumuladoras ideais são aquelas que apresentam alto poder de bioconcentração, ou seja, são capazes de reter níquel, por exemplo, em teor comparável ao encontrado no solo. Além disso, precisam ter alta capacidade de translocação dos metais para a parte aérea (porção que se desenvolve acima do solo, incluindo caule, folhas, flores e frutos) e alta produção de biomassa para serem incineradas – o minério é então extraído de suas cinzas.

“Não adianta uma planta concentrar muito metal mas ser pequena. No caso do níquel, para ser considerada eficiente para agromineração, uma espécie de planta candidata precisa permitir produzir 10 toneladas por hectare”, explicou Nascimento.

Por meio de estudos de campo realizados em Niquelândia, em Goiás, os pesquisadores identificaram algumas espécies de interesse. Algumas das limitações, contudo, é que não crescem em outros ambientes que não o Cerrado, produzem pouca biomassa e acumulam pouca quantidade do metal.

“Elas atingem o limiar de concentração de níquel para serem consideradas hiperacumuladoras de mil ppm [partes por milhão] do metal na parte aérea, mas não alcançam a meta de 10 mil ppm, que as tornariam interessantes para uso comercial”, disse Nascimento.

Caça às hiperacumuladoras

A fim de tentar identificar candidatas a hiperacumuladoras de metais ideais no Brasil, os pesquisadores têm feito parcerias com as principais mineradoras do país para realização de estudos em campo em áreas de mineração e em outros lugares onde são encontrados os chamados solos ultramáficos (originados de rochas muito ricas em níquel, cromo e cobalto, por exemplo).

De acordo com o pesquisador, esse tipo de solo ocupa entre 1% e 3% da superfície terrestre, tem baixos teores de nutrientes essenciais para as plantas, como nitrogênio, fósforo, potássio e cálcio, e alta relação de magnésio. “Para um solo ser viável para a agricultura ele precisa, geralmente, ter mais cálcio do que magnésio. No caso dos solos ultramáficos, essa relação é inversa: têm maiores proporções de magnésio do que cálcio”, explicou o pesquisador.


Nascimento, da UFRPE: "Não adianta uma planta concentrar muito metal mas ser pequena; no caso do níquel, para ser considerada eficiente, uma espécie candidata precisa produzir 10 toneladas por hectare" (foto: Elton Allison/Agência FAPESP)

“Por isso, as plantas que conseguiram se adaptar a esses ambientes, ao longo de milhões de anos, são muito especiais porque algumas conseguem evitar a absorção desses metais disponíveis nesses solos, como níquel, cromo, cobalto e ferromanganês. Já outras, como as hiperacumuladoras, desenvolveram a habilidade de crescer nesses solos pobres em nutrientes, ricos em metais pesados tóxicos para outras espécies e absorvê-los em altas concentrações.”

Para ser considerada hiperacumuladora, uma espécie de planta precisa apresentar a capacidade de absorver mais de 100 microgramas por grama de cádmio, ou mais de 300 de cobalto, mais de mil de níquel, 3 mil de zinco e 10 mil de manganês, apontou Nascimento.

“Algumas teorias sobre as razões de essas plantas terem desenvolvido a capacidade de hiperacumulação de metais focam a proteção do ataque de patógenos e pragas ou a ocupação de nichos ambientais. Poderia ser uma vantagem para elas crescerem em um ambiente onde outras espécies não resistiriam”, detalhou o agrônomo.

Busca em herbários

Outros lugares onde os pesquisadores têm procurado identificar essas espécies de plantas são nos principais herbários do país. Por meio de análises realizadas nesses espaços, eles identificaram em Pernambuco, em 2024, uma espécie de planta conhecida popularmente como feijão-bravo-preto ou folha-dura (Capparidastrum frondosum), capaz de acumular grandes quantidades de zinco. “Essa planta também possui grande quantidade de biomassa”, afirmou Nascimento.

Para medir a concentração de metais em expedições em campo ou herbários, os pesquisadores usam um equipamento portátil de fluorescência de raios x. Com ele é possível estimar, em até 30 segundos, a concentração de metais nas folhas e nos caules das plantas. “Por meio desse equipamento é possível analisar mais de 300 espécies de plantas por dia disponíveis nas coleções dos herbários”, disse Nascimento.

Os pesquisadores já visitaram e estão analisando as coleções dos herbários da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e da UFRPE, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), em Manaus, da Embrapa Recursos Genéticos e Tecnologia, da Universidade de Brasília (UnB) e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em agosto deste ano vão iniciar o mesmo trabalho no herbário da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), na Bahia, e do Jardim Botânico do Rio de Janeiro, considerado o maior do país. “Até o momento já fizemos a análise de mais de 8 mil exsicatas [amostras de partes de plantas desidratadas] presentes nessas coleções”, afirmou Nascimento.

O trabalho deve ganhar maior impulso com a recente aprovação pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) da criação do Instituto Nacional de Biotecnologias para o Setor Mineral (Inabim), coordenado por Nascimento e sediado na UFRPE. Um dos objetivos do Inabim é buscar soluções para desafios nacionais, como a recuperação de áreas degradadas pela mineração, o aproveitamento de resíduos e a produção de novos materiais.

O instituto terá a participação de pesquisadores vinculados à Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq-USP) e da Universidade Estadual Paulista (Unesp), entre outras instituições, sublinhou o pesquisador. “Também pretendemos analisar o herbário da Esalq a fim de identificar espécies de plantas candidatas para agromineração”, antecipou Nascimento à Agência FAPESP.
 

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