Cientistas de duas universidades norte-americanas e uma sueca podem ter resolvido mistério da formação do gelo

Perfeitamente cristalino
07 de abril de 2004

Cientistas de duas universidades norte-americanas e uma sueca podem ter resolvido mistério da formação do gelo. O estudo descobriu que o gelo pode ter a forma de um cristal perfeito e ser manipulado por campos elétricos

Perfeitamente cristalino

Cientistas de duas universidades norte-americanas e uma sueca podem ter resolvido mistério da formação do gelo. O estudo descobriu que o gelo pode ter a forma de um cristal perfeito e ser manipulado por campos elétricos

07 de abril de 2004

Cientistas de duas universidades norte-americanas e uma sueca podem ter resolvido mistério da formação do gelo

 

Agência FAPESP - Um grupo de pesquisadores de duas universidades norte-americanas e uma sueca pode ter colocado um fim a um debate científico de 70 anos sobre a natureza fundamental do gelo.

Uma nova teoria de análise estatística confirmou o que alguns cientistas apenas suspeitavam: sob condições específicas, moléculas de água se unem quando congeladas de modo exato para formar um cristal perfeito, que pode ser manipulado por campos elétricos da mesma forma com que ímãs respondem a campos magnéticos. Normalmente, quando a água congela, sua estrutura cristalina está longe de ser perfeita, o que elimina a possibilidade de usos elétrico.

Embora o gelo provavelmente nunca se tornará um componente utilizado na eletrônica, a descoberta pode aumentar o conhecimento de como partículas de gelo que ocorrem naturalmente interagem com o meio ambiente, de acordo com Sherwin Singer, professor de química da Universidade do Estado de Ohio e um dos responsáveis pela pesquisa.

O estudo foi apresentado por outros dos autores, Jer-Lai Kuo, da mesma universidade, na última quarta-feira (31/3), durante encontro da Sociedade Química Norte-Americana, na Califórnia. Estão ainda envolvidos na pesquisa os cientistas Michael Klein, da Universidade da Pensilvânia, e Lars Ojamäe, da Universidade Linköping, na Suécia.

Segundo Singer, a descoberta tem muitas implicações. Das profundezas oceânicas às camadas superiores da atmosfera, importantes reações químicas ocorrem na superfície de cristais de gelo. "A forma como moléculas de água se organizam na superfície cristalina é absolutamente crítica para essas reações", disse o pesquisador.

"Caso as moléculas dentro do cristal sejam ordenadas de uma determinada maneira, isso pode afetar a ordenação delas na superfície. Então, qualquer coisa que ajude a entender como o gelo forma uma certa estrutura pode nos ajudar a compreender tais reações."

Cientistas têm tentado há décadas explicar o modo como o gelo é formado. Em 1935, o célebre químico norte-americano Linus Pauling (1901-1994) previu que as moléculas de água se agrupavam de forma desordenada. No ano seguinte, a natureza desordenada foi confirmada experimentalmente. Isso mostrou que o gelo, na realidade, não era exatamente um cristal.

"Por cristal geralmente pensamos num diamante, em outra pedra lindamente lapidada ou em gelo. Mas, para um cientista, chamar um material de cristal implica que seus átomos formem um arranjo regular e repetitivo, como o dos ovos em uma bandeja. Pela definição científica, um ‘cristal de gelo’ não é um cristal perfeito", disse Singer.

Desde a época de Pauling, cientistas têm tentado demonstrar como o gelo poderia formar um cristal perfeito. O quebra-cabeças incluía calcular a energia de todas as possíveis orientações das moléculas de água no gelo. Cada molécula tem um átomo de oxigênio e dois de hidrogênio e, enquanto os átomos de oxigênio se alinham perfeitamente, os de hidrogênio podem apontar para qualquer uma de seis direções diferentes. Prever a estrutura de um único cristal de gelo exigiria calcular a energia de bilhões de diferentes orientações das moléculas de água, tarefa tão complexa que a maioria dos cientistas imaginava que nunca poderia ser feita.

A chave para resolver o enigma surgiu quando Singer e colegas aplicaram uma técnica matemática para simplificar a análise. Eles usaram funções chamadas invariantes gráficas para relacionar simetrias entre moléculas para outras propriedades físicas, como energia.

Os cientistas, então, passaram a tentar calcular a estrutura de uma das formas exóticas de gelo feitas em laboratórios. O gelo utilizado, conhecido como Gelo-XI, foi criado na década de 1980, na Universidade de Osaka.

Apesar de a estratégia de utilizar as invariantes ter simplificado os cálculos, os pesquisadores levaram um ano para processar os números. Grande parte desse trabalho foi feito no Centro de Supercomputadores de Ohio. Para verificar que os cálculos estavam corretos, eles compararam a temperatura de transição de fase prevista para a estrutura do cristal com a temperatura medida no laboratório da universidade japonesa. A temperatura prevista foi de 70 kelvin, enquanto que a medida foi 72 kelvin.

De acordo com a estrutura prevista pelos cientistas, as moléculas do Gelo-XI estavam perfeitamente ordenadas, com cada sub-seção do cristal, ou cristalito, tendo um lado com uma carga eletricamente positiva e outro com uma carga negativa. Isso mostrou que o gelo era ferroelétrico e que podia ser manipulado por um campo elétrico.

Como as pequenas cargas elétricas das moléculas de água podem afetar reações químicas que ocorrem na superfície de qualquer cristal de gelo, um dos próximos passos dos pesquisadores é usar o conhecimento obtido até agora para tentar entender a superfície das partículas de gelo encontradas na atmosfera terrestre.


  Republicar
 

Republicar

A Agência FAPESP licencia notícias via Creative Commons (CC-BY-NC-ND) para que possam ser republicadas gratuitamente e de forma simples por outros veículos digitais ou impressos. A Agência FAPESP deve ser creditada como a fonte do conteúdo que está sendo republicado e o nome do repórter (quando houver) deve ser atribuído. O uso do botão HMTL abaixo permite o atendimento a essas normas, detalhadas na Política de Republicação Digital FAPESP.