O homenageado Kleppner, em meio aos laureados pelo Nobel, em São Carlos. Da esquerda para a direita: Herschbach, Phillips, Cornell, Kleppner, Haroche e Wineland (foto: Edu César)

‘Pai’ da física atômica moderna torna-se professor honorário da Universidade de São Paulo
12 de março de 2013

Daniel Kleppner, do MIT, foi homenageado em evento que reuniu na cidade de São Carlos cinco vencedores do Prêmio Nobel e outros expoentes da área

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Daniel Kleppner, do MIT, foi homenageado em evento que reuniu na cidade de São Carlos cinco vencedores do Prêmio Nobel e outros expoentes da área

12 de março de 2013

O homenageado Kleppner, em meio aos laureados pelo Nobel, em São Carlos. Da esquerda para a direita: Herschbach, Phillips, Cornell, Kleppner, Haroche e Wineland (foto: Edu César)

 

Por Karina Toledo

Agência FAPESP – Boa parte dos cientistas dedicados a desvendar os mistérios dos átomos e da mecânica quântica – aquela das partículas subatômicas – cultiva certa obsessão por alcançar temperaturas extremamente baixas, cada vez mais próximas do chamado “zero absoluto” (0 K na escala Kelvin ou -273,15°C na escala Celsius).

Em entrevista à Agência FAPESP, o vencedor do Prêmio Nobel de Física de 2001, Eric Cornell, explicou por quê: “Você pode pensar na temperatura como barulho, falando metaforicamente. Quanto mais baixa ela estiver, mais quieto será. E se estiver suficientemente silencioso, você conseguirá ouvir a natureza murmurando seus segredos.”

Entender como a mecânica quântica funciona quando milhares de partículas interagem entre si simultaneamente é uma das grandes charadas deste século. Como tudo se move mais lentamente à medida que a temperatura cai, o desafio se torna relativamente mais fácil quando se está perto do zero absoluto.

Muitos dos experimentos realizados nos últimos anos com esse objetivo têm como base o trabalho desenvolvido pelo físico norte-americano Daniel Kleppner, um dos fundadores do Centro de Átomos Ultrafrios, que congrega nos Estados Unidos pesquisadores do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) e da Universidade Harvard.

No fim de fevereiro, Kleppner recebeu o título de professor honorário do Instituto de Física de São Carlos, da Universidade de São Paulo (IFSC-USP), do qual tem sido uma espécie de conselheiro há mais de dez anos.

A homenagem foi feita durante um simpósio organizado pelo Centro de Pesquisa em Óptica e Fotônica (Cepof) de São Carlos, um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPID) apoiados pela FAPESP, e reuniu no interior de São Paulo alguns dos mais destacados cientistas da área.

“Dan acaba de completar 80 anos e, para um físico, a melhor forma de celebrar alguma coisa é organizando um simpósio”, brincou o vencedor do Nobel de Física de 1997 William Phillips, também professor honorário do IFSC-USP, durante a abertura do evento.

Mais conhecido no meio acadêmico como Bill, Phillips, pesquisador do National Institute of Standards and Technology (NIST), dos Estados Unidos, foi aluno de Kleppner e recebeu o Nobel – com Steven Chu e Claude Cohen-Tannoudji – por ter inventado uma espécie de armadilha para imobilizar átomos que une raios laser e campos magnéticos.

A técnica permitiu aos cientistas alcançar uma temperatura seis vezes mais baixa do que se acreditava ser possível – algo em torno de 40 milionésimos de um grau Celsius acima do zero absoluto. “Isso é quatro milhões de vezes mais frio que a temperatura do espaço sideral e 100 milhões de vezes mais frio do que nitrogênio líquido, com certeza a coisa mais gelada que você já viu na vida”, explicou Phillips.

Além de possibilitar o desenvolvimento de relógios quânticos extremamentes precisos – que por sua vez possibilitaram a criação do Global Positioning System (GPS), já presente na maioria dos carros das grandes cidades –, a invenção de Phillips também tornou possível o experimento que rendeu o Nobel a Cornell, Carl Wieman e Wolfgang Ketterle: alcançar um estado da matéria conhecido como condensado de Bose-Einstein, no qual ao chegar próximo do zero absoluto ela se comporta como um fluido com viscosidade zero – o chamado superfluido – capaz de se deslocar em velocidades baixas sem dissipar energia.

A existência do condensado de Bose-Einstein foi prevista por Albert Einstein em 1925, a partir do trabalho de Satyendra Nath Bose (1894-1974). Os experimentos realizados por Cornell, Wieman e Ketterle nos anos 1990 abriram caminho para as pesquisas hoje em andamento no Cepof, sob coordenação do professor Vanderlei Bagnato, do IFSC-USP, que trabalhou com Kleppner durante seu doutorado no MIT.

Em 2009, um estudo feito pelo grupo de Bagnato em parceria com pesquisadores da Universidade de Florença, na Itália, demonstrou que o fenômeno da turbulência – que ocorre em líquidos e gases submetidos a movimentos desordenados – também pode ser observado no condensado de Bose-Einstein. A descoberta abriu uma nova janela para a investigação em dois dos principais desafios na física contemporânea: o estudo dos fenômenos de turbulência e dos superfluidos.

Tecnologia do futuro

Outros dois colaboradores de Kleppner que estiveram no simpósio foram David Wineland, do NIST, e Serge Haroche, do Collège de France. Ambos ganharam o Nobel de Física em 2012 por pesquisas que permitiram manipular, analisar e contar partículas quânticas sem destruí-las. Entre as promessas de novas tecnologias que deverão surgir a partir desse feito estão os computadores quânticos ultravelozes.

“Ao analisar a história da tecnologia, podemos perceber que o futuro está nas coisas muito pequenas, ou seja, está na direção da mecânica quântica”, afirmou Cornell, que atualmente é professor da Universidade do Colorado, nos Estados Unidos.

No grupo de vencedores do Nobel presente em São Carlos para homenagear Kleppner, Dudley Herschbach, de Harvard, era o único que visitava o Brasil pela primeira vez. Também era o único cuja área de atuação não era a física atômica e sim a físico-química.

Herschbach recebeu o prêmio máximo da ciência em 1986 por seus experimentos pioneiros com a técnica de feixes moleculares cruzados para estudar reações químicas e a dinâmica dos átomos das moléculas em tempo real. “Mas acho que fui convidado para este simpósio, na verdade, porque sou amigo de Kleppner há mais de 50 anos, desde a graduação”, contou.

A programação do evento contou ainda com outros palestrantes ilustres, como o francês Alain Aspect, cotado para receber o Nobel por suas pesquisas na área de óptica que permitiram o desenvolvimento da criptografia quântica, tecnologia que promete tornar inviolável a segurança de informações sigilosas e que já está sendo adotada em alguns bancos.

“Eu diria que não apenas o trabalho dos aqui hoje presentes, como a maior parte do que está acontecendo na física atômica em todo o mundo está de alguma forma conectada às pesquisas de Kleppner”, avaliou Phillips.

Considerado um injustiçado no meio científico por nunca ter ganho um Nobel, apesar de ter ajudado a formar tantos vencedores do prêmio, Kleppner – apelidado por Phillips de “o Poderoso Chefão do condensado de Bose-Einstein” – mantém-se modesto.

“Acho que a vinda de uma audiência tão extraordinária ao Brasil é mais uma demonstração de reconhecimento e respeito pelo trabalho que vem sendo realizado pelo grupo do professor Bagnato do que uma demonstração de afeto por mim. Eles poderiam me encontrar a qualquer momento nos Estados Unidos”, brincou.
 

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