Análises multivariadas feitas com crânios da região de Lagoa Santa (MG) reforçam a tese de que o continente americano foi colonizado por duas populações distintas do ponto de vista biológico (foto: divulgação)

Origens diversas
13 de dezembro de 2005

Análises multivariadas feitas com 81 crânios da região de Lagoa Santa (MG) reforçam a tese de que o continente americano foi colonizado por duas populações distintas do ponto de vista biológico

Origens diversas

Análises multivariadas feitas com 81 crânios da região de Lagoa Santa (MG) reforçam a tese de que o continente americano foi colonizado por duas populações distintas do ponto de vista biológico

13 de dezembro de 2005

Análises multivariadas feitas com crânios da região de Lagoa Santa (MG) reforçam a tese de que o continente americano foi colonizado por duas populações distintas do ponto de vista biológico (foto: divulgação)

 

Por Eduardo Geraque

Agência FAPESP - Há 11 mil anos, segundo a marcação dos geólogos, começou o que se convencionou chamar de Período Holoceno, que veio depois do Pleistoceno. É exatamente nesse intervalo cronológico que teria ocorrido a colonização, pela espécie humana, das Américas. Isso se apenas os dados morfológicos (medições de ossos e crânios) forem levados em conta, pois alguns estudos, feitos com base no DNA, mostram que o início da travessia do estreito de Bering pode ter sido bem antes, há 20 mil anos.

As análises morfológicas desenvolvidas por Walter Neves, do Laboratório de Estudos Evolutivos Humanos da Universidade de São Paulo, além da idade da ocupação do Novo Mundo, apontam para mais uma peculiaridade do processo migratório. Para ele, não apenas uma, mas duas populações humanas biologicamente distintas fizeram a travessia e conheceram aquilo que seriam as três Américas atuais.

Defensor árduo dessa tese, muitas vezes ignorada pelos seus pares no hemisfério Norte, Neves, junto com Mark Hubbe, também da USP, publica nesta semana na edição on-line da Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), e depois na versão impressa, mais uma evidência de que tal raciocínio científico deve ser considerado.

Os críticos dessa tese não podem mais dizer que tudo foi pensado com base em apenas um único crânio, como havia ocorrido nos tempos da publicação dos dados sobre a Luzia, um dos crânios com 11 mil anos descobertos na região de Lagoa Santa, em Minas Gerais.

"Este trabalho é a síntese final de todos os crânios de Lagoa Santa existentes em museus no Brasil e no exterior. Apenas não inclui o material mais novo, escavado a partir de 2000", disse Neves à Agência FAPESP.

Foram feitos três tipos de análises multivariadas com medidas obtidas a partir de 81 crânios. "Os métodos usados confirmam mais uma vez a semelhança entre os paleoíndios americanos e os grupos melanésios e australianos", afirma.

Por causa da proximidade morfológica entre os grupos, os pesquisadores acreditam que não foram apenas os tradicionais habitantes do nordeste da Ásia que vieram para as Américas. Segundo Neves e Hubbe, essa tese pode ser validada sem a ocorrência de uma imigração transoceânica. Os grupos australianos e melanésios, os registros mostram, chegaram até a Ásia. A partir daquela região do mundo, dizem, eles também podem ter atravessado o estreito de Bering.

Com um conjunto de dados cada vez mais robusto, Neves já percebe uma mudança na forma com que os pesquisadores estrangeiros tratam suas descobertas. "Diria que pelo menos agora eles não me ignoram mais", afirma.

Outro ponto sempre polêmico, a diferença de idade da ocupação que surge quando os dados são analisados do ponto de vista exclusivamente do DNA, sem as medições dos ossos, também não tira mais o sono do pesquisador. "Estamos trabalhando com sistemas genéticos muito distintos. Eles, com marcadores de mitocôndria, cromossomo Y. Eu, com morfologia. O dia em que eles estudarem os genes ligados à morfologia vão chegar à mesma conclusão", aponta.

Além disso, para o pesquisador da USP, os geneticistas não chegaram ainda a um acordo. "Uns dizem que foi uma única migração. Outros duas, três ou quatro. Em termos de tempo, ele varia de 12 mil a 35 mil anos. Pode?", questiona.

O artigo Cranial morphology of early Americans from Lagoa Santa, Brazil: Implications for the settlement of the New World, de Walter A. Neves e Mark Hubbe, pode ser lido no site da Pnas, em www.pnas.org.


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