O sertão vai virar mar?
19 de julho de 2005

Em debate acalorado na reunião da SBPC, o ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes, diz que o projeto de transposição do rio São Francisco não resolve o problema da seca no Nordeste, mas acaba com o desperdício nos açudes

O sertão vai virar mar?

Em debate acalorado na reunião da SBPC, o ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes, diz que o projeto de transposição do rio São Francisco não resolve o problema da seca no Nordeste, mas acaba com o desperdício nos açudes

19 de julho de 2005

 

Por Karin Fusaro, de Fortaleza

Agência FAPESP - O tema é polêmico e discutido com paixão. O projeto do governo federal de transpor as águas do rio São Francisco para abastecer parte do semi-árido nordestino opõe governo, comunidade científica e organizações de proteção ambiental.

A apresentação do ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes, durante o primeiro dia da 57ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), gerou debate acalorado e manifestações políticas. Entre a platéia, lotada de estudantes e pesquisadores, manifestantes estendiam faixas contestando os possíveis benefícios do plano.

O Projeto de Integração da Bacia do Rio São Francisco com as Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional é um plano de segurança hídrica. Ele visa a garantir o abastecimento humano e animal em caso de evaporação, transbordamento ou uso total da água armazenada nos açudes espalhados pelos estados de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará. Segundo Ciro Gomes, o projeto beneficiaria 12 milhões de pessoas do Nordeste setentrional, cerca de 45% do total de habitantes daquela região.

"É importante deixar claro que a interligação das bacias não acaba com a seca, mas evita perdas. A insegurança hídrica gera o desperdício nas barragens. A água acumulada e não utilizada transborda e vai embora", afirmou.

"O projeto não é claro em vários sentidos", contrapôs Yvonilde Medeiros, pesquisadora da Universidade Federal da Bahia (UFBA), na palestra A seca no semi-árido e a questão da interligação das bacias hidrográficas.

Citando um documento publicado pela SBPC em 2004, depois de uma discussão sobre o tema, a pesquisadora disse que o projeto não identifica os reais beneficiários do projeto, quais os cenários de evolução da demanda e nem qual será a parcela de contribuição dos estados para a recepção das águas. "Oficialmente, não temos conhecimento das reais necessidades dos estados receptores", afirmou.

Outro problema a ser resolvido é a questão do abastecimento das populações difusas, aquelas que vivem em regiões isoladas ou muito espalhadas no sertão. "É mais racional que, em primeiro lugar, os estados resolvam as questões hídricas locais para depois pensar numa solução como a transposição", disse a pesquisadora.

Para Ciro Gomes, o Velho Chico é um rio "ferrado". "Ele está muito machucado. Há um conjunto de fatores que contribuem para a sua deterioração. Para se ter uma idéia, 170 cidades lançam seu lixo no rio", afirmou.

O Projeto de Integração da Bacia do São Francisco às Bacias Hidrográficas dos Nordeste Setentrional prevê a construção de dois canais. O canal norte levará água para os estados do Ceará e Rio Grande do Norte enquanto ao canal leste caberá o abastecimento de Pernambuco e da Paraíba.

Os canais, de 25 metros de largura por 5 metros de profundidade, terão capacidade de retirada de 26 metros cúbicos de água por segundo e serão construídos, de acordo com o ministro, nas proximidades de barragens já existentes. Também está prevista a construção de pequenas estações hidrelétricas. Ainda em fase de licitação, o projeto deverá levar até 24 meses para ser concluído após o início das obras.


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