João Steiner, novo diretor do Instituto de Estudos Avançados da USP (foto: Eduardo Geraque)

O futuro do IEA
25 de novembro de 2003

Novo diretor do Instituto de Estudos Avançados da USP, o astrofísico João Steiner revela, em entrevista à Agência FAPESP, os planos para os próximos quatro anos à frente da instituição. Uma das novidades é a criação de "semestres temáticos", para reunir jovens pesquisadores com nomes consagrados da ciência brasileira

O futuro do IEA

Novo diretor do Instituto de Estudos Avançados da USP, o astrofísico João Steiner revela, em entrevista à Agência FAPESP, os planos para os próximos quatro anos à frente da instituição. Uma das novidades é a criação de "semestres temáticos", para reunir jovens pesquisadores com nomes consagrados da ciência brasileira

25 de novembro de 2003

João Steiner, novo diretor do Instituto de Estudos Avançados da USP (foto: Eduardo Geraque)

 

Por Eduardo Geraque

Agência FAPESP - O Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (IEA-USP) está sob nova direção. Desde o final de setembro, o tradicional espaço de reflexão intelectual da universidade paulista traz à frente João Steiner, professor titular do Departamento de Astronomia do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da USP e presidente do Conselho Diretor do Consórcio Soar.

Em entrevista à Agência FAPESP, Steiner fala sobre os planos para o IEA, cuja diretoria assumiu para um mandato de quatro anos. Uma das primeiras novidades será a criação de "semestres temáticos", que deverão unir jovens pesquisadores com nomes consagrados da ciência paulista e brasileira.


Agência FAPESP – Em seu discurso de posse, o senhor lançou a idéia inédita de implantar semestres temáticos no IEA. Como vai funcionar essa proposta que conta, inclusive, com a aprovação do conselho deliberativo da instituição?
João Steiner - Esse é um projeto que ainda estamos estruturando. A idéia é, a cada seis meses, ter um tema central no IEA, assuntos que serão conduzidos por líderes. Ainda não definimos como será essa escolha, mas podemos dizer que tais profissionais ficarão um ano inteiro no instituto. No primeiro semestre, não farão nada que não seja o planejamento do segundo semestre, quando, então, serão realizadas as atividades referentes ao tema planejado. E isso vai incluir a realização de conferências, reuniões, workshops, simpósios, cursos, papers, dossiês e até livros. Esses líderes terão a colaboração de dois bolsistas de pós-doutoramento. Vamos ter sempre dois líderes e quatro bolsistas trabalhando. Metade do grupo planejando e a outra metade executando.

Agência FAPESP – Então, em quatro anos, serão oito temas. Eles estão definidos?
Steiner - Ainda não, mas, certamente, as temáticas escolhidas serão atuais, tanto de ciência como de cultura. Vamos, inclusive, abrir um espaço na homepage do IEA (www.usp.br/iea) para que a sociedade possa se manifestar. Todo aquele que tiver uma contribuição poderá nos enviar pela internet. Esse será um dos insumos que o conselho deliberativo irá considerar na definição dos temas semestrais.

Agência FAPESP – Apenas para dar um exemplo, os transgênicos, que estão sendo muito discutidos, poderiam ser um tema em potencial?
Steiner - Sem dúvida. Não estou querendo dizer que esse tema já foi escolhido, mas é um exemplo importante, um assunto em relação ao qual a sociedade está esperando uma contribuição da ciência e da universidade. A questão ambiental, por exemplo, que está cada vez mais dramática, também pode ser um outro bom exemplo de um tema semestral.

Agência FAPESP – A participação de doutores recém-formados nesse novo projeto tem algum motivo especial?
Steiner - A intenção é misturar a "senhoridade" com a "junioridade", o que é muito importante. Os jovens terão a oportunidade de ficar um ano aqui. Eles não vão ficar mais porque se trata de uma instituição de circulação de idéias, em que as pessoas devem dar espaço aos próximos. A programação temática semestral também acabará impondo um certo ritmo às atividades do IEA.

Agência FAPESP – Outra idéia apresentada em seu discurso da posse, e que sempre acaba provocando calorosas discussões acadêmicas, é sobre a questão da avaliação. A metodologia para essa proposta está definida?
Steiner - A idéia é fazer com que o IEA olhe para o futuro, não para o passado. Vamos dizer assim: gostariamos de desenhar o instituto para daqui a dez anos. Com esse desenho – que não será feito por nós –, será mais fácil saber para onde caminhar. Queremos que pessoas externas ao IEA nos digam o que esperam de nós. Pensamos em criar uma comissão formada por seis ou sete especialistas, todos de competência inquestionável. A intenção é escolher dois professores da USP. Um de humanidades e outro das áreas científicas. Nenhum deles veiculado ao IEA. Queremos também pessoas de fora da USP. Pretendemos selecionar um especialista não acadêmico, outro da própria academia e um terceiro do exterior. Acho importante que a comissão não tenha um prazo definido para a sua atuação. Ela precisa encontrar um certo ritmo, apesar de achar que dois anos, por exemplo, para se fazer um documento de avaliação do IEA, é bastante tempo.

Agência FAPESP – Como o senhor definiria, hoje, a missão do Instituto de Estudos Avançados?
Steiner - O papel do IEA atualmente, e não me sinto nem um pouco desconfortável com essa missão, não é ser um instituto de ensino. Nós temos como objetivo promover estudos, debates e publicações sobre questões atuais, em áreas da ciência e da cultura. O IEA tem uma vantagem grande. A instituição tem todas as condições de fazer um recorte interdisciplinar. É muito importante isso dentro da universidade, que sempre tem uma estrutura muito segmentada. Aqui também é um espaço aberto à experimentação. Não temos a preocupação de acertar em absolutamente tudo.

Agência FAPESP – Vários representantes da sociedade civil costumam reclamar que existe uma distância muito grande entre a universidade e a sociedade, os problemas do dia-a-dia do povo brasileiro, como, só para citarmos alguns, a fome, a violência ou o apagão energético. O IEA não teria o papel de fazer essa ponte?
Steiner - Um de nossos propósitos é ser uma ponta do conhecimento. O IEA tem condições de fazer a integração entre a universidade e a sociedade, de criar um ponto de encontro. Mas, também é importante mencionar, em relação a essa questão, que as pessoas têm, muitas vezes, uma idéia um pouco equivocada do que é a universidade. A missão da universidade é formar o capital intelectual capaz de enfrentar as demandas sociais, não é resolver imediatamente os problemas da sociedade. Na USP, que está desempenhando muito bem esse papel, hoje formam-se mais mestres e doutores do que alunos de graduação. Claro que a universidade não deve esquecer os seus compromissos. Toda a formação de capital intelectual deve ser feita dentro de um contexto, ela precisa estar comprometida com as carências da população.

Agência FAPESP – A USP não precisa melhorar em nada?
Steiner - Por estar na liderança do sistema universitário brasileiro, a USP tem que dar exemplo também no aperfeiçoamento. Há muito o que melhorar, como na questão da transdisciplinaridade. Apesar de que, mesmo nesse caso, existem bons exemplos como o curso de pós-graduação em Ciências Ambientais, o Procam.

Agência FAPESP - Está tudo pronto para a inauguração do telescópio Soar?

Steiner - A inauguração está marcada para 17 de abril, chova ou faça sol. Estamos discutindo, inclusive, a conexão de um link direto de internet 2 entre o Chile e o Brasil. Do IAG (Instituto Astronômico, Geofísico e Ciências Atmosféricas da USP), teremos acesso a absolutamente tudo, como se estivéssemos na sala de controle do telescópio, que fica em território chileno. Na sala, basta ter um técnico, para tomar algumas providências, mas a operação toda pode ser comandada daqui de São Paulo. Em abril, após a inauguração, será possível fazer observações assistidas. O Soar vai rivalizar com o telescópio espacial Hubble, o que não é pouca coisa. Não se trata de exagero, a única limitação para se fazer ciência, a partir de abril, serão os nossos neurônios.


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