Trabalho coordenado por equipe da UFSCar mostra como a espécie Aspergillus fumigatus regula a produção do metabólito fumiquinazolina C. Testes indicam que a substância ajuda o fungo a driblar o ataque de microrganismos competidores e de células imune de mamíferos (imagens: CDC/Wikimedia Commons)

Mecanismo de defesa usado por fungo causador de doença pulmonar invasiva é descrito
30 de junho de 2021
EN ES

Trabalho coordenado por equipe da UFSCar mostra como a espécie Aspergillus fumigatus regula a produção do metabólito fumiquinazolina C. Testes indicam que a substância ajuda o fungo a driblar o ataque de microrganismos competidores e de células imune de mamíferos

Mecanismo de defesa usado por fungo causador de doença pulmonar invasiva é descrito

Trabalho coordenado por equipe da UFSCar mostra como a espécie Aspergillus fumigatus regula a produção do metabólito fumiquinazolina C. Testes indicam que a substância ajuda o fungo a driblar o ataque de microrganismos competidores e de células imune de mamíferos

30 de junho de 2021
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Trabalho coordenado por equipe da UFSCar mostra como a espécie Aspergillus fumigatus regula a produção do metabólito fumiquinazolina C. Testes indicam que a substância ajuda o fungo a driblar o ataque de microrganismos competidores e de células imune de mamíferos (imagens: CDC/Wikimedia Commons)

 

André Julião | Agência FAPESP – O Aspergillus fumigatus é um tipo de bolor responsável por cerca de 90% dos casos de aspergilose pulmonar invasiva, doença que acomete pacientes com o sistema imune comprometido e mata entre 60% e 90% dos infectados.

Em estudo publicado na revista Genetics, pesquisadores brasileiros descreveram como a espécie regula a produção de um metabólito chamado fumiquinazolina C, que aparentemente tem a função de proteger o fungo de outros microrganismos e também do ataque de células do sistema imune de mamíferos. A descoberta pode levar ao desenvolvimento de novos medicamentos.

“A fumiquinazolina C é um metabólito secundário [não diretamente envolvido nos processos de crescimento, desenvolvimento e reprodução] que demanda bastante energia para ser produzido pelo A. fumigatus. Sua função, portanto, deve estar associada a uma adaptação que permite ao organismo persistir no ambiente”, explica Iran Malavazi, professor do Departamento de Genética e Evolução do Centro de Ciências Biológicas e da Saúde da Universidade Federal de São Carlos (CCBS-UFSCar) e coordenador do estudo.

A fumiquinazolina C é um dos poucos metabólitos secundários produzidos pelo A. fumigatus e se acumula nos chamados conídios do fungo, pequenas estruturas que se espalham pelo ar ou pela água e permitem a reprodução assexuada da espécie. Esse fungo vive no solo de praticamente todos os ambientes da Terra e pode se adaptar a diversas situações de estresse. Seus conídios são tão abundantes no ar que estudos já estimaram que uma pessoa inala entre 100 e 200 conídios por dia.

“Normalmente, essas estruturas chegam às vias aéreas e são fagocitadas por nossas células de defesa, debelando a infecção. Em pessoas imunossuprimidas, porém, é diferente. Pacientes internados em unidades de terapia intensiva ou submetidos a tratamentos que inibem o sistema imune são extremamente vulneráveis à infecção. A maioria vai a óbito”, conta o pesquisador.

O trabalho é parte do doutorado de Marina Campos Rocha, primeira autora do artigo, e integra projeto financiado pela FAPESP.

Inibidor de fagocitose

Por meio de uma série de experimentos, os pesquisadores descobriram que a fumiquinazolina C provavelmente tem uma função protetora para o conídio. Ela funciona como um veneno para células que fazem fagocitose, como as do sistema imune ou de bactérias e protozoários competidores do solo. Na fagocitose, as células usam sua própria estrutura para encapsular o invasor, impedindo sua ação. Os resultados da pesquisa sugerem que a fumiquinazolina C causa uma diminuição desse processo.

Os experimentos foram feitos com versões mutantes do A. fumigatus. Por meio de alterações no DNA, alguns microrganismos passaram a produzir conídios com até 4,5 vezes mais fumiquinazolina C e outros com entre 50% e 95% menos do que o normal encontrado na linhagem selvagem, usada para comparação. Em um dos testes, os conídios foram colocados para interagir com amebas da espécie Dictyostelium discoideum, que vivem no solo e competem pelos mesmos recursos com o A. fumigatus.

Em contato com mutantes que produziam mais fumiquinazolina C, as amebas fagocitaram menos conídios. Já ao interagir com aqueles que produziam menor quantidade do metabólito, mais conídios foram fagocitados. Para confirmar o papel da substância nessa competição, os pesquisadores a isolaram em larga escala e a aplicaram num meio em que havia as amebas e os conídios com pouca produção da fumiquinazolina C. Como consequência, os conídios passaram a ser menos fagocitados.

Outro experimento substituiu as amebas por macrófagos (um tipo de célula de defesa) isolados de camundongos e obteve resultados semelhantes. O teste evidencia um provável papel da fumiquinazolina C nas infecções em humanos e sugere um mecanismo adicional pelo qual os conídios desse fungo interagem com o sistema imune inato.

Para poder chegar até a substância responsável por essa função tão importante no ciclo de vida do fungo, no entanto, foi preciso desvendar uma cascata de sinalização celular, que tem sido alvo principal dos estudos conduzidos por Malavazi.

Os pesquisadores estavam interessados sobretudo na chamada via de integridade da parede celular, responsável por sintetizar, reparar e remodelar essa organela da célula e, por isso, um potencial alvo para novos medicamentos. Os resultados do estudo mostraram, pela primeira vez, o envolvimento dessa via de sinalização na produção de um metabólito secundário em A. fumigatus.

Agora, o grupo possui dados que permitirão, em breve, entender melhor o papel da fumiquinazolina C quando em contato com células humanas. Os pesquisadores pretendem ainda investigar se o fungo produz um antídoto para a substância, de forma a não morrer com o próprio veneno – fenômeno já observado tanto em A. fumigatus quanto em outros microrganismos que produzem toxinas do tipo. Essas respostas podem abrir caminho para o desenvolvimento de drogas mais eficazes contra a aspergilose invasiva.

O trabalho tem ainda entre os coautores Gustavo Henrique Goldman, professor da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FCFRP-USP), também apoiado pela Fundação.

Além da UFSCar e da USP, o estudo teve participação de pesquisadores das universidades estaduais paulista (Unesp), de Campinas (Unicamp), Universidade Federal do ABC (UFABC) e do Hans Knöll Institute, em Jena, na Alemanha.

O artigo Transcriptional Control of the Production of Aspergillus fumigatus Conidia-Borne Secondary Metabolite Fumiquinazoline C Important for Phagocytosis Protection pode ser lido em: https://academic.oup.com/genetics/advance-article-abstract/doi/10.1093/genetics/iyab036/6168429.
 

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