Em conferência no IEA, Jacob Palis, do Impa, falou sobre o momento atual da matemática (foto: E.Geraque)

Matemática qualitativa
29 de outubro de 2004

Em conferência no Instituto de Estudos Avançados, Jacob Palis, do Impa, fala sobre o momento atual da matemática. Apaixonado pela disciplina, o professor desconstrói, entre outros mitos, o conceito de ciência aplicada

Matemática qualitativa

Em conferência no Instituto de Estudos Avançados, Jacob Palis, do Impa, fala sobre o momento atual da matemática. Apaixonado pela disciplina, o professor desconstrói, entre outros mitos, o conceito de ciência aplicada

29 de outubro de 2004

Em conferência no IEA, Jacob Palis, do Impa, falou sobre o momento atual da matemática (foto: E.Geraque)

 

Por Eduardo Geraque

Agência FAPESP - "A matemática que faço é qualitativa". A frase, usada para contrapor uma opinião da platéia de que a matemática fez mal para todas as ciências nas últimas décadas, pois todos buscariam "matematizar seus conceitos", revela a militância apaixonada do matemático Jacob Palis, que esteve essa semana no Instituto de Estudos Avançados (IEA) da Universidade de São Paulo para uma conferência.

Segundo Palis, engenheiro de formação mas matemático por convicção – "quando acabei o curso de engenharia percebi que queria aprender mais matemática e física", lembra – a ciência que pratica nunca esteve em momento tão bom quanto o atual. "É claro que não é uma ciência acabada, mas estamos em um período de excelente criatividade", conta o professor do Instituto de Matemática Pura e Aplicada (Impa).

Palis, que entre outros cita como mestres Stephen Smale – ganhador em 1966 da Medalha Fields, uma das maiores distinções da matemática – e Maurício Peixoto – um dos mais célebres matemáticos brasileiros e fundador do Impa –, busca um exemplo na área das ciências biológicas para mostrar a importância dos modelos matemáticos. "Foram os conhecimentos dos sistemas dinâmicos que permitiram o desenvolvimento do coquetel usado atualmente contra a Aids", afirma o mineiro de Uberaba que dirigiu entre 1993 e 2003 o Impa, no Rio de Janeiro, cidade que escolheu viver desde os tempos universitários.

"Não existe ciência aplicada, mas aplicação da ciência. O importante é fazer boa ciência", afirmou Palis em sua conferência no IEA. Ao relembrar batalhas intelectuais como as que ocorreram entre Henri Poincaré (1854 e 1912) e David Hilbert (1862-1943), Palis aproveitou para colocar a sua posição de forma clara. "A matemática é uma ciência que tem que crescer por causa da sua beleza interna e também pelo contato que deve ter com as demais ciências. Essas fronteiras são importantes", disse.

No embate histórico dos primeiros anos do século passado, enquanto o francês Poincaré defendia essa conversação da matemática com as demais áreas do conhecimento, Hilbert, nascido da Prússia, tinha um outro ponto de vista. "Ele achava que a matemática era tão poderosa que não precisava de mais nada, que ela deveria apenas servir aos outros", conta o pesquisador que já ganhou distinções importantes por sua atuação, como o Prêmio da Academia de Ciências do Terceiro Mundo (1988), o Prêmio da Organização dos Estados Americanos (1994), a Medalha da Ordem Nacional do Mérito Científico (1994) e os prêmios nacionais de C&T no Brasil (1990) e no México (2000).

Não foi apenas Poincaré que mereceu citações e elogios. Nomes como o de René Descartes (1596-1650) também foram lembrados por Palis. Não por acaso, ambos eram matemáticos e filósofos. "São ciências muito próximas. Ambas buscam uma forte estruturação e organização lógica. Não é coincidência o fato de grandes matemáticos terem sido também bons filósofos", disse o professor do Impa à Agência FAPESP.

Ao chegar no contexto contemporâneo, Palis até concorda com a tese de que a abstração da matemática fundamentada pelos gregos ajudou a complicar um pouco a relação dessa ciência com a sociedade. O fato de que hoje existe uma certa repelência à ciência, na opinião do pesquisador, pode ser explicada de várias formas.

"A maneira de educar matemática está errada. Ela está centrada em um excesso de formalismo, por exemplo", afirma o pesquisador que, para explicar os seus principais trunfos no exercício da matemática em seu currículo não usa fórmulas, apenas palavras. A criatividade e a intuição, segundo Palis, ainda são muito necessárias. "Existem problemas na matemática que resistem há 300 ou 400 anos", lembra.


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