Em defesa da microescala: parte das pesquisas em cidades inteligentes ainda insiste em analisar a cidade focada no sistema inteiro, aponta Andrew Smith (foto: Erika de Faria/Temporal Filmes)

Escola Interdisciplinar FAPESP
Mais que tecnologia, cidades habitáveis exigem projetos focados nas pessoas
18 de novembro de 2025

Em palestra na Escola Interdisciplinar FAPESP, diretor do Smart Cities Center da Columbia University (EUA) defende iniciativas que tornem comunidades mais seguras e habitáveis por meio de "intervenções hiperlocais" no espaço urbano

Escola Interdisciplinar FAPESP
Mais que tecnologia, cidades habitáveis exigem projetos focados nas pessoas

Em palestra na Escola Interdisciplinar FAPESP, diretor do Smart Cities Center da Columbia University (EUA) defende iniciativas que tornem comunidades mais seguras e habitáveis por meio de "intervenções hiperlocais" no espaço urbano

18 de novembro de 2025

Em defesa da microescala: parte das pesquisas em cidades inteligentes ainda insiste em analisar a cidade focada no sistema inteiro, aponta Andrew Smith (foto: Erika de Faria/Temporal Filmes)

 

Maria Fernanda Ziegler | Agência FAPESP – Como toda ponte, a de Manhattan, em Nova York, balança em resposta ao tráfego de carros, à passagem do vento e da linha de metrô. Embora o efeito seja esperado, esse balanço combinado com torções pode causar fadiga nos componentes de aço e danificar a estrutura. Para monitorar esse efeito, engenheiros criaram há cerca de 30 anos um modelo virtual da ponte (digital twin), que permite simular o desempenho da estrutura, testar reparos e prever seu comportamento em situações extremas como, por exemplo, furacões.

Mais recentemente, um trabalho multidisciplinar envolvendo engenheiros, profissionais de saúde e bombeiros desenvolveu um sistema inteligente voltado para orientar o atendimento emergencial de ambulâncias na escolha do hospital mais próximo e adequado. Com base em dados clínicos, localização, trânsito e capacidade hospitalar, o sistema tem o objetivo de economizar tempo, reduzir custos e salvar vidas.

Outro projeto analisou como o desenho das vias afeta o comportamento dos motoristas e, por consequência, interfere na segurança do trânsito. O estudo correlacionou dados sobre velocidade, frenagens bruscas e locais de marcha lenta com registros de acidentes. Com isso, a partir de modelos preditivos com machine learning, o Departamento de Transportes da cidade tem uma ferramenta para planejar intervenções viárias e avaliar seus efeitos antes que ocorram novos acidentes.

“Esses são projetos que realizei ao longo de minha carreira como engenheiro na área de monitoramento de infraestrutura na cidade de Nova York. Apresento esses exemplos porque, ao olhar para trás, fica evidente a crescente importância da multidisciplinaridade e do foco na microescala, no humano, no campo de estudo de cidades inteligentes”, disse Andrew Smyth, diretor do Smart Cities Center at Columbia University’s Data Science Institute, nos Estados Unidos, durante apresentação no quarto dia de conferências da Escola Interdisciplinar FAPESP: Ciências Exatas e Naturais, Engenharia e Medicina, realizado de 10 a 14 de novembro, em São Paulo.

Smyth também é diretor e pesquisador principal do Center of Smart Street Scapes, financiado pela National Science Foundation (NSF), dos Estados Unidos. Ele afirma que o centro de pesquisa tem a missão de tornar comunidades mais seguras e habitáveis por meio de intervenções hiperlocais no espaço urbano, melhorando a vida na escala humana.


"O foco em resolução mais local permite entender melhor a dinâmica da cidade, identificando mudanças de padrões como, por exemplo, as mudanças climáticas, o envelhecimento populacional ou o aumento do uso de deliveries e de compras on-line e o impacto disso nas cidades" (foto: Erika de Faria/Temporal Filmes)

Ele ressaltou que parte das pesquisas em cidades inteligentes persiste ainda em analisar a cidade por meio de uma escala macro, focada no sistema inteiro. “No entanto, o problema dessa abordagem é que, às vezes, perdem-se as dinâmicas detalhadas do nível humano que estão ocorrendo dentro desse sistema", argumentou.

Na palestra realizada na Escola Interdisciplinar FAPESP, o pesquisador norte-americano destacou que, com a disponibilidade de tecnologias de sensoriamento mais precisas, é possível ser mais meticuloso e melhorar aspectos urbanos como deslocamentos e atividades diárias, para então gerar impactos positivos no sistema urbano como um todo.

“O foco nessa resolução mais local busca justamente melhorar as interações cotidianas, como o deslocamento diário das pessoas. Ele também permite entender melhor a dinâmica da cidade, identificando mudanças de padrões como, por exemplo, as mudanças climáticas, o envelhecimento populacional ou o aumento do uso de deliveries e de compras on-line, em vez de as pessoas irem simplesmente às compras, e o impacto disso nas cidades”, conta.

Smyth enfatizou ainda que, com o avanço tecnológico e o foco na microescala, a privacidade se torna não só uma questão crucial, mas também um obstáculo para a implementação de cidades inteligentes em sociedades democráticas. “Privacidade é um valor importante, pois a falta de confiança leva à percepção de que sensores são formas de vigilância. Por isso é importante ir além da anonimização dos dados nos projetos de pesquisa”, diz.

Ele conta que, nesse sentido, o Center of Smart Street Scapes está desenvolvendo sistemas operacionais para lidar com a privacidade de forma mais rigorosa, incluindo diferentes níveis de privacidade para diferentes tipos de troca de dados. Isso inclui o uso de câmeras com baixa resolução para tarefas específicas, como medir a velocidade do tráfego, por exemplo.

“Como se vê, tornar as cidades mais habitáveis é um trabalho possível, mas que não acaba nunca. Os problemas urbanos, assim como esses projetos, são constantes”, diz Smyth.
 

  Republicar
 

Republicar

A Agência FAPESP licencia notícias via Creative Commons (CC-BY-NC-ND) para que possam ser republicadas gratuitamente e de forma simples por outros veículos digitais ou impressos. A Agência FAPESP deve ser creditada como a fonte do conteúdo que está sendo republicado e o nome do repórter (quando houver) deve ser atribuído. O uso do botão HMTL abaixo permite o atendimento a essas normas, detalhadas na Política de Republicação Digital FAPESP.