Sem formação acadêmica, viajante britânico produziu inúmeras informações biológicas e antropológicas durante sua viagem pela floresta amazônica entre 1848 e 1859. Pesquisa realizada no Pará mostra que o conhecimento batesiano circula na academia até hoje
Sem formação acadêmica, viajante britânico produziu inúmeras informações biológicas e antropológicas durante sua viagem pela floresta amazônica entre 1848 e 1859. Pesquisa realizada no Pará mostra que o conhecimento batesiano circula na academia até hoje
Agência FAPESP - Biologia, zoologia, sociologia, história e antropologia. O viajante Henry Bates (1825-1892), assim como Alexander von Humboldt (1769-1859), Johann Baptist von Spix (1781-1826) e Carl Friedrich Philipp von Martius (1794 – 1868), entre outros, vivia na Europa com um sonho bastante freqüente para aquela época. Conhecer a floresta tropical, que a maioria dos europeus achava algo distante e horripilante. Ao lado do amigo Alfred Wallace, o filho de comerciante resolveu atravessar o Atlântico rumo ao Brasil. Ele esteve na Amazônia entre 1848 e 1859.
"A história da ciência na Amazônia deve muito às contribuições de Bates", afirma Rubens Ferreira, bibliotecário da Universidade Federal do Pará (UFPA). "Quando iniciei minha pesquisa sobre imagens da Amazônia, um estudo na iconografia nas obras produzidas pelos viajantes naturalistas dos séculos 18 e 19, no museu Paraense Emílio Goeldi, em 2003, não encontrei viajante que mais se afeiçoasse à região como ele", explica o pesquisador paraense.
Assim como o inglês que morreu pobre, pois nunca conseguiu ocupar cargos de destaque na área acadêmica – no máximo foi assistente –, se encantou com a diversidade faunística e cultural da região, o bibliotecário da UFPA, e também integrante do grupo de pesquisa em representação e transferência da informação da instituição, resolveu puxar o novelo batesiano até os dias de hoje. E ele se mostrou bastante longo. "Transcorridos 156 anos dessa expedição, a produção científica de Bates continua a participar do circuito acadêmico de produção de conhecimento sobre a Amazônia na contemporaneidade", afirma Ferreira.
Durante seus 11 anos em solo amazônico, Bates protagonizou importantes descobertas científicas. Ele listou 14.800 espécies desconhecidas para época e fez um retrato histórico considerado até hoje bastante fidedigno da Belém do Pará que ele conheceu. "Deixou também interessantes registros etnográficos sobre os índios munducuru e os ticuna. Esse assunto rendeu uma das ilustrações mais bonitas do livro The naturalist on the river amazon, escrito por Bates quatro anos depois de voltar à Inglaterra".
No caso da biologia, o explorador inglês também fez contribuições que circulam até hoje entre os estudantes e profissionais dessa área do conhecimento. É na Amazônia que nasceu a teoria chamada hoje de mimetismo batesiano. Bates a forjou a partir da observação de uma espécie de mariposa que imitava as formas de um beija-flor para parecer mais forte e, assim, escapar do seus predadores que viviam na selva.
"É curioso verificar que há poucos registros documentais no Brasil sobre os anos em que Bates viveu na Amazônia", explica Ferreira. Segundo o pesquisador da UFPA, em 2003, o pesquisador Anthony Crawforth, que está escrevendo um livro sobre o conterrâneo, veio ao país para obter informações sobre uma possível medalha Cavaleiro da Ordem Imperial a Bates. "Ele nada encontrou sobre isso", disse Ferreira.
Para o pesquisador brasileiro, que fez um artigo sobre a circulação das informações geradas por Bates no século retrasado – o texto está disponível na biblioteca eletrônica Scielo -, a sobrevivência da obra do naturalista inglês se deve também a um motivo bastante interessante. "As narrativas de viagem acabam sendo lidas pelas pessoas de classe média como um livro de histórias, de aventuras. Se o livro de Bates fosse uma obra cientificamente hermética ela não teria a mesma aceitação por parte de toda sociedade, como teve."
Acostumando a viver entre os livros e aos arquivos amazônicos, Ferreira não descarta a possibilidade de ainda existirem obras a serem redescobertas sobre o tema Amazônia. "Espero que outros pesquisadores possam contribuir para o resgate da história da ciência na Amazônia, que teve início exatamente quando esses primeiros viajantes passaram por aqui". A reexploração da floresta tropical, por meio dos arquivos, seria pelo menos bem mais segura para a própria floresta.
Para ler o artigo Henry Walter Bates: um viajante naturalista na Amazônia e o processo de transferência da informação, publicado o ano passado no periódico Ciência da Informação clique aqui.
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