Sérgio Danilo Pena, da UFMG, mostra como foi identificado em habitantes do Vale do Jequitinhonha características genéticas dos índios Aimorés (foto: E.Geraque)

Garimpagem genética
09 de setembro de 2004

Em estudo apresentado na reunião da SBG, em Florianópolis, Sérgio Danilo Pena, da UFMG, mostra como foram identificadas em habitantes do Vale do Jequitinhonha características genéticas dos índios Aimorés, dos quais não se têm registros desde 1920

Garimpagem genética

Em estudo apresentado na reunião da SBG, em Florianópolis, Sérgio Danilo Pena, da UFMG, mostra como foram identificadas em habitantes do Vale do Jequitinhonha características genéticas dos índios Aimorés, dos quais não se têm registros desde 1920

09 de setembro de 2004

Sérgio Danilo Pena, da UFMG, mostra como foi identificado em habitantes do Vale do Jequitinhonha características genéticas dos índios Aimorés (foto: E.Geraque)

 

Por Eduardo Geraque, de Florianópolis

Agência FAPESP - O Brasil, nas primeiras décadas do século 18, foi palco de uma terrível guerra microbiológica. Os portugueses, que haviam declarado guerra aos índios Aimorés – a quem chamavam pejorativamente de botocudos, nome que acabou ficando mais consagrado pelos historiadores – espalharam cobertores com o vírus da varíola pela floresta. Os nativos, ao levarem os cobertores para as aldeias, eram contaminados.

Os últimos remanescentes dos Aimorés, que viviam entre Minas Gerais, Rio de Janeiro e Espirito Santo, foram vistos em 1920. Uma foto da época, apresentada na quarta-feira (8/9), no 50º Congresso Brasileiro de Genética, em Florianópolis, emocionou o próprio conferencista, o médico Sérgio Danilo Pena, da Universidade Federal de Minas Gerais.

"Estamos trabalhando com um modelo filogenético para detectar as linhas genéticas dos botocudos, o que costumo chamar de garimpagem homopátrica", disse Pena à Agência FAPESP. Segundo os dados obtidos até agora, ele acredita que foi possível conseguir, muito provavelmente, resgatar tipos genéticos dos Aimorés. O processo dessa obtenção não ocorreu de uma forma tão simples como pode parecer.

A cidade de Queixadinha está localizada no meio do Vale do Jequitinhonha, no norte de Minas Gerais. A população que vive lá está isolada e esquecida. As taxas de analfabetismo e de esquistossomose estão acima dos 60%. "Os botocudos – o apelido é decorrente de uma madeira em forma de círculo que eles usavam no lábio e que, para os colonizadores, lembrava uma rolha de vinho, um bodoque – viviam naquela região, por isso resolvemos investigar", explicou Pena.

Entre 173 indivíduos analisados, segundo o trabalho apresentando em Florianópolis, foram verificadas 74 linhagens matriarcais. Os pesquisadores conseguiram identificar 70% de grupos genéticos, chamados de haplotipos, exclusivos daquela cidade. A comparação das amostras de sangue dos moradores do Vale do Jequitinhonha com outras típicas de Minas Gerais, que por sinal representam toda a diversidade encontrada no Brasil, permitiu aos pesquisadores acreditar no resgate da linhagem dos Aimorés.

"Os ameríndeos que vivem ao sul do Equador apresentam quatro haplogrupos fundamentais, nomeados de A, B, C e D. Nas amostras de Queixadinha, o grupo C apareceu em uma freqüência muito mais alta do que a encontrada no resto do Brasil", explica Pena. O cientista não tem dúvidas de que pelo menos encontrou uma população bastante diferenciada na cidade mineira.

A equipe comandada por Pena, que também já fez estudos sobre as linhagens africanas que chegaram ao Brasil, está garimpando, como o mesmo enfoque filogenético, as linhagens genéticas de outras tribos no Brasil que também foram exterminadas em um passado não muito recente. "Costumo brincar que depois do genoma, do proteoma e do transcriptoma, temos agora o ancestroma", disse Pena.


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