Evento foi realizado em 7 de maio na Alesp (imagem: reprodução)
Iniciativa em parceria com o Ministério da Saúde integra estratégia voltada a promover a saúde da população brasileira; detalhes foram apresentados na edição mais recente do Ciclo ILP-FAPESP de Ciência e Inovação
Iniciativa em parceria com o Ministério da Saúde integra estratégia voltada a promover a saúde da população brasileira; detalhes foram apresentados na edição mais recente do Ciclo ILP-FAPESP de Ciência e Inovação
Evento foi realizado em 7 de maio na Alesp (imagem: reprodução)
José Tadeu Arantes | Agência FAPESP – Como contrapartida a investimento feito pelo Departamento de Ciência e Tecnologia (Decit) do Ministério da Saúde, a FAPESP vai lançar, nas próximas semanas, uma chamada pública para financiar o sequenciamento de 15 mil genomas humanos no Estado de São Paulo. Esse novo aporte deverá elevar de 21 mil para 36 mil o número de sequenciamentos previsto pela Rede Genoma SUS, com o objetivo principal de caracterizar os aspectos genômicos que impactam os processos de saúde e doença da população brasileira.
A Rede Genoma SUS é uma articulação formada por pesquisadores de oito centros-âncora de diversos Estados brasileiros que integra o programa nacional Genomas Brasil, do Ministério da Saúde. E a informação sobre a nova chamada pública foi dada pelo próprio coordenador da Rede Genoma SUS, o pesquisador Leandro Colli, professor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP) e chefe do Serviço de Oncologia Clínica do Hospital das Clínicas da FMRP-USP. Colli foi o moderador da conferência “Envelhecimento saudável e produtividade agrícola: o papel da genômica nas políticas públicas”, realizada em 7 de maio na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp), no âmbito do Ciclo ILP-FAPESP de Ciência e Inovação 2025.
“A chamada pública é voltada a grupos de pesquisa do Estado de São Paulo que já tenham amostras e dados clínicos coletados, mas que ainda não participam do Genoma SUS. Esses grupos poderão submeter seus projetos, demonstrando a importância de suas coortes para a iniciativa. A expectativa é que grupos já experientes, como o do InCor [Instituto do Coração da Faculdade de Medicina da USP], que atua fortemente em genômica populacional e cardiologia, participem da chamada. A gente está saindo da perspectiva de genes e variantes raros para uma abordagem mais poligênica, com múltiplas variantes afetando fenômenos complexos, como câncer, doenças cardiovasculares, diabetes e outros”, afirmou Colli.
A conferência reuniu pesquisadores de instituições públicas e privadas em uma apresentação abrangente sobre os avanços da genômica e seus impactos no diagnóstico, prevenção de doenças e desenvolvimento de novos tratamentos, bem como no aprimoramento de espécies vegetais e no aumento da produtividade do setor agrícola. Participaram especialistas de universidades paulistas, instituições de pesquisa, startups de biotecnologia e centros de inovação agrícola.
Na primeira parte da conferência, dedicada à aplicação da genômica na promoção da saúde, a geneticista Mayana Zatz, professora do Instituto de Biociências da USP e coordenadora do Centro de Estudos do Genoma Humano e Células-Tronco (CEGH-CEL), destacou a aplicação das tecnologias genômicas ao diagnóstico e tratamento de doenças. “Já estudamos mais de 100 mil pessoas de famílias com doenças genéticas. Isso nos permitiu avançar no aconselhamento genético e na prevenção de novos casos”, relatou. Segundo ela, um dos projetos mais promissores é a geração de porcos geneticamente modificados para doação de órgãos a humanos, com o silenciamento dos genes responsáveis pela rejeição.
A pesquisadora também falou dos estudos sobre centenários e supercentenários brasileiros. “Estamos tentando entender que genes protetores essas pessoas possuem. Já coletamos dados de 104 centenários. A ideia é estudar essas variantes para desenvolver terapias que beneficiem toda a população”, explicou. “As três pessoas mais idosas do mundo eram brasileiras. Isso mostra que temos um material genético valioso a ser estudado.”
A professora Iscia Lopes Cendes, da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (FCM-Unicamp), ressaltou o papel da genômica na medicina personalizada. “Ela permite prescrever o tratamento certo, na dose certa, para a pessoa certa, evitando efeitos colaterais”, afirmou. Como coordenadora de um grupo da Organização Mundial de Saúde (OMS) sobre genômica, a pesquisadora sublinhou a importância de que esses avanços também beneficiem países de renda média, como o Brasil, ressaltando que critérios como equidade e desenvolvimento devem ser considerados na formatação das pesquisas.
Lopes Cendes lembrou que o Brasil tem, desde 2014, uma política nacional para doenças genéticas e foi pioneiro nessa área no continente latino-americano. “Precisamos aprimorar esse arcabouço e assegurar acesso universal ao diagnóstico e tratamento”, argumentou.
Marcos Santos, fundador e CEO da startup Onkos Diagnóstico Molecular, apresentou um teste genômico que evita cirurgias desnecessárias de tireoide. “Cerca de 80% das cirurgias para nódulos indeterminados acabam sendo desnecessárias. Nosso teste evita isso e já poupou quase 5 mil cirurgias”, disse. A tecnologia é resultado de apoio da FAPESP, por meio do Programa de Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE).
Como um problema a ser superado, Santos apontou a lentidão na incorporação dessas novas tecnologias no SUS. “A genômica está avançando em alta velocidade, mas a sua adoção pelo sistema público é muito mais lenta.”
Melhoramento vegetal
Na segunda parte do evento, o foco esteve na aplicação da genômica na agricultura, com destaque para a citricultura e a cana-de-açúcar, dois pilares do agronegócio paulista.
Nelson Wulff, pesquisador do Fundo de Defesa da Citricultura (Fundecitrus), lembrou que o sequenciamento da bactéria Xylella fastidiosa, causadora da doença do “amarelinho”, que afetava os laranjais paulistas, foi um feito mundialmente pioneiro, que só se tornou possível por iniciativa da FAPESP. O conhecimento possibilitou uma queda extraordinária da incidência da doença, de 46% para menos de 0,5%.
“Atualmente, o grande desafio é o greening, doença bacteriana que afeta 44% das plantas e compromete a produtividade e a qualidade dos frutos. Com base em genômica, buscamos desenvolver laranjeiras resistentes, inclusive com genes que repelem o inseto transmissor”, informou Wulff.
Assim como a citricultura, o setor canavieiro também é objeto de especial atenção da pesquisa genômica. Sabrina Chabregas, diretora de Pesquisa e Desenvolvimento do Centro de Tecnologia Canavieira (CTC), destacou os investimentos em melhoramento genético, biotecnologia e manejo da cana. “Nosso objetivo é dobrar a produtividade até 2040. Já temos variedades com 16% mais produtividade. E estamos também desenvolvendo canas geneticamente modificadas resistentes a pragas e tolerantes a herbicidas”, disse.
O CTC também trabalha na prospecção de sementes sintéticas. “A intenção é possibilitar uma renovação mais rápida dos canaviais e a adoção mais ágil de variedades mais produtivas”, contou Chabregas.
A conferência “Envelhecimento saudável e produtividade agrícola: o papel da genômica nas políticas públicas” foi coordenada por Marcio de Castro, diretor científico da FAPESP. “Desde o ano 2000, quando a comunidade científica de São Paulo teve seu feito estampado na capa da revista Nature [o sequenciamento do genoma da Xylella fastidiosa e, no mesmo ano, da planta-modelo Arabidopsis thaliana], quase 1.800 espécies vegetais já tiveram seus genomas completamente sequenciados”, contabilizou Castro.
E continuou: “Esse número é ainda pequeno, diante das mais de 450 mil espécies conhecidas. E cerca de 75% das plantas sequenciadas até hoje pertencem ao hemisfério Norte, o que evidencia a urgência de iniciativas globais voltadas ao sequenciamento de espécies do hemisfério Sul, com vistas à segurança alimentar, resistência a pragas, aumento de produtividade e adaptação às mudanças climáticas”.
A conferência “Envelhecimento saudável e produtividade agrícola: o papel da genômica nas políticas públicas”, uma iniciativa do Instituto do Legislativo Paulista (ILP) e da FAPESP, pode ser assistida na íntegra em: www.youtube.com/watch?v=fcpAQDoc8K4&t=3s.
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