Pesquisadores da USP descrevem genealogia dos cactos epífitos e propõem reavaliação da classificação do maior grupo dessas plantas que vivem em cima de árvores da Mata Atlântica (foto: divulgação)
Pesquisadores da USP descrevem genealogia dos cactos epífitos e propõem reavaliação da classificação do maior grupo dessas plantas que vivem em cima de árvores da Mata Atlântica
Pesquisadores da USP descrevem genealogia dos cactos epífitos e propõem reavaliação da classificação do maior grupo dessas plantas que vivem em cima de árvores da Mata Atlântica
Pesquisadores da USP descrevem genealogia dos cactos epífitos e propõem reavaliação da classificação do maior grupo dessas plantas que vivem em cima de árvores da Mata Atlântica (foto: divulgação)
Por Alex Sander Alcântara
Agência FAPESP – Quando se fala em cactos, é comum a associação imediata com zonas secas e áridas. Mas existem grupos, como os cactos epífitos, cujo habitat se encontra em áreas úmidas da Mata Atlântica.
O cactos epífitos vivem sobre as árvores. Nascem ali, mas não estabelecem uma relação parasitária, ou seja, não utilizam os nutrientes das árvores para sobreviver – exemplos comuns de epifitismo são as orquídeas e as bromélias.
Com o objetivo de reconstruir a história evolutiva de um grupo de cactáceas, pesquisadores do Instituto de Biociências (IB) da Universidade de São Paulo (USP), em colaboração com pesquisadores do Jardim Botânico de Kew, em Londres (Reino Unido), utilizaram informações contidas em seu DNA.
O estudo se concentrou principalmente na análise de Rhipsalideae, a principal tribo de cactos epífitos, que é restrita à América do Sul. Os pesquisadores buscaram saber também, com base na história evolutiva do grupo, como as espécies – predominantemente brasileiras – assumiram a distribuição geográfica atual e como a morfologia se modificou ao longo dos anos.
“A ideia central da pesquisa foi entender quais características estariam associadas à evolução desses cactos. Buscamos entender os processos que levaram à diversificação desse grupo de cactáceas”, disse Lúcia Garcez Lohmann, professora do Departamento de Botânica do IB, à Agência FAPESP.
Lúcia coordenou o projeto “Evolução do epifitismo em Cactaceae”, que recebeu o apoio da FAPESP na modalidade Auxílio à Pesquisa – Regular. A pesquisa também incluiu o trabalho de doutorado, com Bolsa da FAPESP, de Alice de Moraes Calvente, orientada por Lúcia e concluído este ano no IB-USP, bem como a colaboração de Daniela Zappi e de Félix Forest, ambos pesquisadores do Jardim Botânico de Kew.
“Um melhor conhecimento da história evolutiva de diferentes linhagens nos permite classificá-las de forma mais apropriada, bem como nos ajuda a reconstruir a história dos biomas ocupados por esses organismos”, disse a professora.
Esse foi o primeiro estudo filogenético realizado para entender tanto a origem evolutiva como aspectos da biologia dos cactos epífitos. “Concluímos que a classificação anterior para a tribo Rhipsalideae continha alguns grupos que não eram corroborados pelos dados provenientes do DNA, indicando que uma reavaliação da classificação da tribo era necessária, de forma que uma nova classificação, mais prática e previsível, pudesse ser estabelecida”, explicou Alice.
A bolsista coletou amostras do Rio Grande do Sul à Bahia, durante os dois primeiros anos da pesquisa. Na América do Sul, percorreu a Costa Rica, Equador, Peru e Bolívia.
Morfologicamente, os cactos epífitos são bem reduzidos, se comparados com os cactos do Semi-Árido. “Existem muitas espécies endêmicas, encontradas apenas em microáreas dentro da Mata Atlântica. Muitas ocorrem em áreas entre 800 e 1.200 metros de altitude e em árvores de grande porte”, disse.
Segundo a professora Lúcia, a pesquisa também corroborou resultados de estudos anteriores que haviam indicado que a outra linhagem de cactos epífitos – tribo Hylocereae – não é proximamente aparentada às Rhipsalideae, apesar de representarem as únicas linhagens de cactos epífitos da região Neotropical.
“Ao reconstituir a árvore genealógica de Rhipsalideae, percebemos que diversas linhagens do grupo se originaram na floresta atlântica brasileira e, subsequentemente, ocuparam outras florestas na América do Sul, América do Norte, África e Ásia. No entanto, essas transições ocorreram em momentos diferentes”, explicou.
“Outro achado de nosso estudo mostrou que em Rhipsalis, o maior gênero dos cactos epífitos, os tipos de flores são as características que melhor indicam o parentesco entre espécies”, acrescentou Alice.
Filogenia da biodiversidade
As pesquisadoras destacam ainda que o epifitismo já estava presente no ancestral da tribo Rhipsalideae, indicando que a evolução do epifítismo precedeu a diversificação do grupo como um todo.
O epifitismo é um dos hábitos menos estudados em plantas. Por definição, epífita é qualquer planta que não está diretamente ligada ao solo e que precisa de um suporte para crescer. Alice explica que os cactos epífitos da tribo Rhipsalideae fazem parte de um grupo particular conhecido como epífitas obrigatórias, que germinam em cima de árvores e permanecem ali, sem nunca ter contato com o solo.
“Um motivador deste estudo foi entender o padrão de evolução de características morfológicas associadas ao epifitismo. Buscamos entender quais características precederam e quais sucederam a evolução do epifitismo no grupo” comentou.
Segundo Lúcia, pesquisas envolvendo a reconstrução do parentesco em espécies vegetais eram inicialmente feitas com base na aparência externa das plantas, ou seja, na morfologia.
“Em alguns casos, aparência é um bom indicador de parentesco, mas em outros não. Imagine, por exemplo, o que aconteceria se o grau de parentesco entre seres humanos fosse estabelecido apenas com base na cor dos olhos – frequentemente teríamos pais que seriam classificados como parentes distantes de seus próprios filhos”, comentou.
A docente conta que a cor da flor, por exemplo, era a característica mais utilizada para definir o parentesco entre diferentes grupos de plantas no passado.
“No entanto, a reconstrução da filogenia desses cactos epífitos com base em caracteres moleculares nos permitiu avaliar quais caracteres morfológicos são bons indicadores de parentesco e quais não são nas Cactáceas. Com base nessas informações, pudemos estabelecer um sistema de classificação mais adequado e previsível”, destacou.
Lúcia comenta que, apesar de ouvirmos muito sobre a biodiversidade brasileira, ainda conhecemos relativamente pouco sobre a história da nossa biodiversidade.
“Sabemos que mudanças climáticas globais estão alterando os ciclos biológicos de plantas e animais, por exemplo. No entanto, pouco sabemos sobre como se deram essas alterações no passado. Um melhor entendimento desses processos nos ajudaria a realizar melhores previsões para o futuro e o estabelecimento de melhores decisões em relação à conservação da biodiversidade”, disse.
Segundo ela, o estudo dos cactos epífitos seguiu o “mesmo roteiro” de outros projetos de pesquisa que conduziu anteriormente, nos quais desvendou a história evolutiva de plantas da família do ipê-amarelo.
“Hoje em dia utilizamos tanto caracteres morfológicos como caracteres do DNA para reconstruir a história evolutiva das plantas. Apesar das análises a partir do DNA de plantas serem ainda recentes no nosso pais, o Brasil já está produzindo trabalhos com qualidade internacional nesse campo de pesquisa”, afirmou.
De acordo com a professora da USP, o trabalho de Alice ainda estudou vários outros aspectos da biologia dos cactos epífitos que acabaram não sendo incluídos na tese devido à limitação de tempo para redação do trabalho.
Por exemplo, foram ainda coletados dados sobre a distribuição, ecologia, anatomia e número de cromossomos das plantas (citogenética), os quais estão sendo interpretados com base na árvore evolutiva do grupo e organizados para publicação.
“A próxima etapa será o uso de todos os dados para o estabelecimento de melhores práticas para a conservação e manejo das cactáceas”, disse Lúcia.
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