Estudo feito na Unicamp avalia unidades de contraceptivos vendidas entre setembro de 2014 e agosto de 2016, com base em informações fornecidas pela indústria farmacêutica (foto: Wikimedia Commons)

Epidemia de Zika não elevou venda de contraceptivos no país
12 de janeiro de 2017

Estudo feito na Unicamp avalia unidades de contraceptivos vendidas entre setembro de 2014 e agosto de 2016, com base em informações fornecidas pela indústria farmacêutica

Epidemia de Zika não elevou venda de contraceptivos no país

Estudo feito na Unicamp avalia unidades de contraceptivos vendidas entre setembro de 2014 e agosto de 2016, com base em informações fornecidas pela indústria farmacêutica

12 de janeiro de 2017

Estudo feito na Unicamp avalia unidades de contraceptivos vendidas entre setembro de 2014 e agosto de 2016, com base em informações fornecidas pela indústria farmacêutica (foto: Wikimedia Commons)

 

Karina Toledo | Agência FAPESP – Diante da explosão de casos de bebês nascidos com microcefalia e outras malformações congênitas no Nordeste brasileiro em 2015 – e da crescente suspeita de que o fenômeno estivesse ligado à epidemia de Zika –, o Ministério da Saúde emitiu, em novembro daquele ano, um alerta para que mulheres adiassem os planos de gravidez.

Cerca de três meses depois, com o fortalecimento das evidências de que o vírus aparentado do causador da dengue era de fato o responsável pelos casos de malformações em bebês, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou emergência internacional de saúde pública e recomendou que grávidas evitassem frequentar as regiões afetadas pelo vírus.

Mas, apesar do apelo das autoridades sanitárias e da grande exposição do tema nos meios de comunicação do Brasil e do mundo, a venda de contraceptivos no país não aumentou em relação a anos anteriores, como mostra um estudo feito na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) apoiado pela FAPESP e divulgado na revista Human Reproduction.

Na avaliação do coordenador da pesquisa, Luis Guillermo Bahamondes, da Clínica de Planejamento Familiar do Departamento de Obstetrícia e Ginecologia da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp, o resultado observado estaria mais ligado à dificuldade de acesso a métodos contraceptivos – especialmente na rede pública – do que à falta de interesse das mulheres em evitar a gestação.

“Para conseguir uma cartela de pílula nas Unidades Básicas de Saúde (UBS), por exemplo, antes é preciso esperar três ou quatro meses por uma consulta médica. E comprar o medicamento nas drogarias é uma impossibilidade para muitas. Dos métodos considerados de longa duração, apenas o DIU [dispositivo intrauterino] com cobre é coberto pelo SUS [Sistema Único de Saúde] e, muitas vezes, faltam profissionais capacitados para inseri-lo”, disse Bahamondes.

No estudo, foram avaliados dados fornecidos pela indústria farmacêutica sobre a venda de produtos contraceptivos entre setembro de 2014 – um ano antes da confirmação do primeiro caso de microcefalia associado ao Zika – e agosto de 2016.

Os produtos analisados foram divididos em quatro grupos. O primeiro engloba os contraceptivos orais (pílula), os adesivos hormonais e os anéis vaginais. No segundo grupo estão os anticoncepcionais injetáveis, tanto os de aplicação mensal como os trimestrais.

O terceiro grupo é representado pelos contraceptivos de emergência, popularmente chamados de pílula do dia seguinte. Por último, no quarto grupo, foram agrupados os métodos considerados de longa duração, como o DIU com cobre (10 anos de eficácia), o DIU medicado com levonorgestrel (cinco anos) e o implante hormonal (três anos).

Os métodos do primeiro grupo são de longe os mais consumidos no Brasil, sendo que a pílula corresponde a mais de 90% das unidades vendidas deste segmento. O número, que era em torno de 13,4 milhões de unidades em setembro de 2014, manteve-se praticamente estável até agosto de 2016.

Entre os injetáveis os pesquisadores registraram uma leve queda. O número de unidades vendidas passou de 1,4 milhão para 1,3 milhão. Os contraceptivos de emergência tiveram uma pequena alta: de aproximadamente 1,2 milhão de unidades vendidas para 1,4 milhão. Já os métodos de longa duração saíram de 38,6 mil para 39,4 mil.

Bahamondes ressalta que os números refletem as unidades que foram vendidas pelas distribuidoras ao setor público, aos pontos de venda ou de dispensação e que, portanto, não é possível ter certeza se chegaram até as mulheres e se elas efetivamente usaram os produtos.

Vale também destacar que não foram contemplados os dados de venda de camisinha. Segundo os autores, isso se deve ao fato de que a camisinha, além de método contraceptivo, também é usada na prevenção de doenças sexualmente transmissíveis.

Alto custo de métodos eficazes

Como observam os autores no artigo, apenas 1,6% das mulheres em idade reprodutiva no Brasil faz uso dos métodos de longa duração – considerados os mais eficazes na prevenção de gravidez. Nos Estados Unidos, o número é 5%, enquanto na Europa oscila entre 18 e 25%.

Segundo Bahamondes, no setor privado, o alto custo, a falta de cobertura por planos de saúde e a falta de capacitação dos médicos para inserir os dispositivos são os principais fatores que limitam o acesso.

“Apenas em torno de uma a três em mil mulheres que fazem uso desses métodos engravidam, enquanto entre as usuárias de pílula a taxa de falha varia de oito a dez a cada cem usuárias. A principal vantagem dos métodos de longa duração é não haver risco de as mulheres esquecerem de tomar o medicamento ou de trocar o adesivo ou o anel”, disse.

Por outro lado, acrescentou o pesquisador, a demanda por contracepção de emergência no Brasil é muito superior à de países desenvolvidos. “Isso claramente é reflexo da dificuldade das mulheres para ter acesso aos outros métodos de prevenção da gravidez”, afirmou.

O artigo “Contraceptive sales in the setting of the Zika virus epidemic” (doi: 10.1093/humrep/dew310), de Luis Bahamondes, Moazzam Ali, Ilza Monteiro e Arlete Fernandes, pode ser lido em: http://humrep.oxfordjournals.org/content/early/2016/12/07/humrep.dew310.full
 

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