Segundo Werneck, da USP, ainda faltam intervenções consistentes além do aconselhamento. “A lei que restringe o uso do celular dentro das escolas foi uma grande realização”, avalia (imagem: PVP Productions/Freepik)

Saúde Mental
Em evento na Alesp, pesquisador alerta para os riscos do sedentarismo à saúde mental
26 de agosto de 2025

André de Oliveira Werneck, da USP, participou de painel promovido pelo Instituto do Legislativo Paulista no âmbito da Semana da Saúde

Saúde Mental
Em evento na Alesp, pesquisador alerta para os riscos do sedentarismo à saúde mental

André de Oliveira Werneck, da USP, participou de painel promovido pelo Instituto do Legislativo Paulista no âmbito da Semana da Saúde

26 de agosto de 2025

Segundo Werneck, da USP, ainda faltam intervenções consistentes além do aconselhamento. “A lei que restringe o uso do celular dentro das escolas foi uma grande realização”, avalia (imagem: PVP Productions/Freepik)

 

Helo Reinert | Agência FAPESP – A relação entre comportamento sedentário e piora na saúde mental foi tema de um painel promovido pelo Instituto do Legislativo Paulista (ILP) em 19 de agosto, no âmbito da Semana da Saúde da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp).

Os estudos mais recentes sobre o tema foram apresentados por André de Oliveira Werneck, integrante do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (FSP-USP). Ele lamentou a inexistência de uma política pública específica para promover a atividade física no Brasil e ressaltou que a saúde física e a mental devem ser tratadas de maneira integrada. “É muito importante ter metas, apresentar diversas formas de intervenção e dar uma atenção maior à atividade física e às complexidades do comportamento sedentário”, disse Werneck.

Os transtornos depressivos afetam 5% da população mundial, segundo dados da Organização das Nações Unidas (ONU) de 2023. No Brasil, antes mesmo da pandemia, a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) mostrou que a depressão atingia 10,8% dos brasileiros. Quanto à prevalência do transtorno de ansiedade no Brasil, o índice é de 9,3%, o maior do mundo, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS). Na capital paulista, segundo pesquisa sobre saúde, bem-estar e estresse realizada pelo Hospital das Clínicas para o projeto Megacity, da OMS, a taxa é ainda maior: 19,9%.

Os transtornos mentais aumentam o risco de desenvolvimento de várias doenças, com ênfase para as cardiovasculares, e se manifestam em pessoas de diversas idades. Pesquisas apontam que, por mais que as principais manifestações de transtornos mentais ocorram na fase adulta, muitas vezes a condição começa na adolescência. Werneck citou dois estudos britânicos. O primeiro, feito com adultos que substituíram o tempo em que ficavam sentados por uma atividade física leve, moderada ou vigorosa, associou atividade física à redução da incidência de depressão. O segundo, realizado com jovens no início e no final da adolescência, relacionou o maior tempo sentado a uma prevalência maior de depressão aos 18 anos.

Segundo o palestrante, no início das investigações sobre comportamento sedentário, as perguntas feitas aos participantes eram voltadas para o tempo em que passavam sentados. Mais recentemente surgiu a preocupação de classificar os comportamentos sedentários entre mentalmente ativos e passivos e de definir o tipo de atividade que corresponde a cada grupo. Um estudo sueco mostrou que maior tempo gasto com comportamentos sedentários mentalmente passivos estava associado a maior incidência de transtornos depressivos. E que se o comportamento fosse ativo, a incidência seria menor.

O estudo fez uma análise sobre a substituição do tempo do comportamento mentalmente passivo pelo ativo e mostrou que a troca de um pelo outro reduzia o risco de incidência de depressão, inclusive com um resultado superior à substituição por tempo de atividade física. “Foi um achado muito importante porque a troca de três horas vendo TV por exercício físico não é algo tão viável no dia a dia”, afirmou Werneck.

Tempo de tela e uso de mídias sociais

O pesquisador foi o primeiro autor de artigo publicado no Journal of Adolescent Health, que mostra que os adolescentes que apresentam mais risco de sofrimento psicológico futuro são os que ficam principalmente em frente das telas – assistindo televisão, jogando videogame, usando a internet e as redes sociais – por mais de três horas em comportamento sedentário passivo de lazer. Já o tempo moderado de exposição a telas (entre 60 e 119 minutos por dia) gasto em atividades educacionais, como fazer o dever de casa ou assistir às aulas, foi considerado um fator “protetor”. Werneck, cuja pesquisa foi financiada pela FAPESP, explicou que o tempo investido em telas – comportamento passivo – reduz as interações sociais. E observou que a luz azul impacta a qualidade do sono. Mas salientou que, a depender do tipo de jogo, o videogame pode ser uma atividade que produz uma demanda cognitiva que pode ser positiva para a saúde mental.

O uso de mídias sociais é um tópico à parte, e de extrema importância, dentro dos estudos do comportamento sedentário. “Estamos acompanhando uma grande discussão no Brasil sobre o tema, inclusive por motivos criminais”, lembrou. Uma das questões analisadas é como o uso das redes poderia estar associado a riscos para a saúde mental em jovens. Entre os elementos considerados estão a distorção da imagem corporal, a autoestima e o assédio digital.

Outro estudo realizado com adultos verificou que a maior frequência de postagens nas mídias sociais, ou seja, um engajamento mais intenso, se relaciona a problemas de saúde mental. Segundo Werneck, as mídias sociais são um assunto muito específico e complexo. Não é apenas o tempo que influencia a relação entre seu uso e a saúde mental. O tipo de uso e de feedback, o conteúdo visualizado, o design da plataforma, a motivação, o gênero e a idade são elementos que é preciso considerar.

Recomendações e intervenções

Ao comentar sobre a relação entre sedentarismo e sintomas depressivos, o palestrante explicou que o comportamento sedentário está associado ao mecanismo de redução tanto da produção da insulina para metabolizar a glicose quanto na contração muscular, que reduz a produção de toxinas anti-inflamatórias. Essas substâncias são tidas como mediadores na relação com transtornos mentais, principalmente a depressão.

Existem algumas orientações que miram a redução do problema do comportamento sedentário e da exposição a telas. Ao finalizar sua intervenção, Werneck traçou um breve panorama das ações realizadas pelo governo e por associações de classe nesse sentido. A Sociedade Brasileira de Pediatria (ABP) aconselha que crianças menores de 2 anos não sejam expostas a telas, que até os 5 anos de idade o uso seja de, no máximo, até uma hora, até chegar ao tempo máximo de três horas para a faixa dos 11 aos 18 anos, sempre com algum nível de supervisão do cuidador.

Em março, o governo federal lançou o Guia sobre Usos de Dispositivos Digitais. O documento alerta para os riscos à saúde e outras questões que envolvem a exposição digital de crianças e adolescentes e dá recomendações. Mas, na opinião de Werneck, falta um conjunto de intervenções grandes e consistentes além do aconselhamento. “A lei que restringe o uso do celular dentro das escolas foi uma grande realização”, avaliou.

Participaram do evento a psicóloga e professora da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Nazareth Ribeiro, o médico Paulo Magno do Bem Filho, o pesquisador na área de epidemiologia e acústica do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) Marcelo de Mello Aquilino e a professora da FSP-USP Adelaide Cassia Nardocci. O evento, transmitido pelo canal do ILP no YouTube, contou com a mediação de Tacyra Valois, vice-presidente da Associação Brasileira de Relações Institucionais e Governamentais (Abrig).
 

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