Tempo de espera por doação de órgãos no país poderia diminuir com mudanças estruturais no sistema de transplantes. Para Alexandre Marinho, da Uerj, o Brasil possui boa capacidade tecnológica e conhecimento técnico, mas falta capacidade administrativa

Dilemas das filas de espera
21 de dezembro de 2006

Tempo de espera por doação de órgãos no país poderia diminuir com mudanças estruturais no sistema de transplantes do SUS. Para Alexandre Marinho, da Uerj, o Brasil possui boa capacidade tecnológica e conhecimento técnico, mas falta capacidade administrativa

Dilemas das filas de espera

Tempo de espera por doação de órgãos no país poderia diminuir com mudanças estruturais no sistema de transplantes do SUS. Para Alexandre Marinho, da Uerj, o Brasil possui boa capacidade tecnológica e conhecimento técnico, mas falta capacidade administrativa

21 de dezembro de 2006

Tempo de espera por doação de órgãos no país poderia diminuir com mudanças estruturais no sistema de transplantes. Para Alexandre Marinho, da Uerj, o Brasil possui boa capacidade tecnológica e conhecimento técnico, mas falta capacidade administrativa

 

Por Thiago Romero

Agência FAPESP - O Brasil convive com um delicado contraponto entre sua capacidade médica e administrativa. Enquanto o estado da arte da medicina relacionada com transplantes de órgãos no país é extremamente avançado, existe uma enorme lacuna estrutural a ser preenchida para a diminuição do tempo de espera das filas, de acordo com o pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Alexandre Marinho.

"A capacidade tecnológica e o conhecimento técnico das equipes médicas brasileiras na área são indiscutíveis", disse Marinho à Agência FAPESP. "Mas, infelizmente, não podemos dizer o mesmo no que se refere à administração do sistema de captação e aproveitamento dos órgãos", explica o economista, que é autor de um estudo recém-publicado na revista Cadernos de Saúde Pública.

O trabalho apresenta estimativas dos tempos de espera por transplantes de diferentes órgãos, entre eles coração, córnea, fígado, pulmão, rim e pâncreas, além de estudar as principais variáveis intervenientes na determinação de tais prazos. Marinho se baseou em um modelo matemático tradicionalmente usado para a análise de qualquer tipo de fila.

De modo geral, o atendimento obedece à ordem de chegada dos pacientes na fila. "Quanto mais tempo um paciente espera, menor é a probabilidade dele receber um transplante. Com a piora gradativa de seu estado de saúde, o paciente pode até ser retirado da fila, pois os médicos entendem que um novo órgão não é mais prioridade", explica.

Segundo ele, sem levar em conta a taxa de mortalidade na fila, um paciente aguarda, em média, pouco mais de um ano por um coração, enquanto a espera por um rim dura cerca de seis anos. O Brasil é o segundo país em número de transplantes, perdendo apenas para os Estados Unidos. O trabalho mostra que o Brasil fez 8.500 transplantes em 2003, com gastos totais de R$ 334 milhões. Em 2005, foram realizados 15.527 transplantes, incluindo órgãos e tecidos.

A grande questão, explica Marinho, é que, embora a oferta de transplantes tenha sido maior, esse aumento não se deu em um ritmo suficiente para diminuir a fila. O número de pessoas à espera de um órgão também aumentou nos últimos anos. "No final de 2003, mais de 56 mil pessoas ainda aguardavam nas filas. Em 2005 esse número pulou para 70 mil", revela o pesquisador.

O aumento da idade média da população, a alta prevalência de doenças crônicas como diabetes, hipertensão arterial e hepatite, além do avanço tecnológico dos procedimentos, que oferece mais segurança aos pacientes, são fatores que explicam o aumento de pessoas na fila.


Em busca de soluções

Para Alexandre Marinho, existem boas oportunidades para diminuir as longas filas de espera para transplantes no Sistema Único de Saúde (SUS), responsável pelo financiamento de mais de 90% dos procedimentos realizados no país. Com base no modelo matemático do estudo, Marinho garante que, se a oferta dos serviços de transplantes no país aumentasse 10%, as filas praticamente terminariam.

"Aumento de serviços não significa aumento da oferta de órgãos, mas sim de procedimentos. É alta a quantidade de órgãos que são doados, mas que não chega ao receptor devido aos problemas estruturais do sistema", explica. Como o desafio é melhorar o aproveitamento dos órgãos que já são doados, a ineficiência das comissões intra-hospitalares seria, na opinião de Marinho, o grande problema a ser combatido.

O bom funcionamento dessas comissões é essencial para a administração de todo o procedimento, desde a captação do órgão até sua aplicação em outro indivíduo. "Por envolver muitas variáveis de caráter legal, médico e de logística, essas comissões ficam sobrecarregadas de trabalho e, em muitos hospitais brasileiros, acabam não funcionando como deveriam. Com isso, multiplicam-se os relatos de pessoas que desejam doar órgãos de familiares e não conseguem", afirma.

O trabalho mostra ainda que, de cada oito doadores potenciais, apenas um é notificado, sendo que, de cada cinco notificados, somente um é aproveitado como doador de múltiplos órgãos. "Isso faz com que a taxa de mortalidade à espera de alguns órgãos, como o fígado, ultrapasse os 50%", lamenta Marinho.

Para ler o artigo "Um estudo sobre as filas para transplantes no Sistema Único de Saúde brasileiro", disponível na biblioteca on-line SciELO (Bireme/FAPESP), clique aqui.


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