Pesquisa feita na Unicamp indica que a inclusão de novas técnicas de análise cromossômica aperfeiçoou o diagnóstico citogenético da síndrome de Turner, que atinge uma em cada 2 mil meninas (divulgação)
Pesquisa feita na Unicamp indica que a inclusão de novas técnicas de análise cromossômica aperfeiçoou o diagnóstico citogenético da síndrome de Turner, que atinge uma em cada 2 mil meninas
Pesquisa feita na Unicamp indica que a inclusão de novas técnicas de análise cromossômica aperfeiçoou o diagnóstico citogenético da síndrome de Turner, que atinge uma em cada 2 mil meninas
Pesquisa feita na Unicamp indica que a inclusão de novas técnicas de análise cromossômica aperfeiçoou o diagnóstico citogenético da síndrome de Turner, que atinge uma em cada 2 mil meninas (divulgação)
Por Alex Sander Alcântara
Agência FAPESP – Os pais de meninas que apresentam déficit de crescimento, com ou sem atraso no desenvolvimento das características sexuais secundárias femininas, devem procurar um pediatra, indicam especialistas.
Esses são os principais e mais frequentes sinais clínicos da síndrome de Turner, caracterizada citogeneticamente pela perda parcial ou completa de um dos cromossomos sexuais (X ou Y) e que atinge somente meninas, em uma incidência estimada de uma em cada 2 mil.
O destaque é da pesquisa “Síndrome de Turner: tumor gonadal e presença de sequências do cromossomo Y”, coordenada por Gil Guerra-Júnior, professor do Departamento de Pediatria da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e apoiada pela FAPESP por meio da modalidade Auxílio à Pesquisa – Regular.
De acordo com Guerra-Júnior, o estudo foi dividido em três etapas: conhecer os casos diagnosticados da síndrome no Laboratório de Citogenética Humana do Departamento de Genética Médica da FCM; identificar por técnica de biologia molecular e citogenética molecular os casos com sequências de cromossomo Y; e identificar, nesses casos, as pacientes com tumor gonadal.
Para cumprir a primeira etapa do projeto, foi realizado um estudo retrospectivo conduzido por pesquisadores dos departamentos de Pediatria e Genética Médica da FCM e do Centro de Biologia Molecular e Engenharia Genética (CBMEG), também da Unicamp. O estudo apontou a ocorrência, nas últimas quatro décadas, de um aumento significativo dos casos da síndrome diagnosticados pelo Laboratório de Citogenética Humana.
O estudo, publicado na revista Arquivos Brasileiros de Endocrinologia & Metabologia, destaca que a inclusão de novas técnicas de análise citogenética aperfeiçoou o diagnóstico citogenético da doença. Guerra-Júnior orientou durante o projeto a aluna de medicina Beatriz Amstalden Barros, com bolsa de iniciação científica do Conselho Nacional do Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
“De 1970 a 2008, foram diagnosticados 260 casos da síndrome por exames realizados no mesmo laboratório da FCM. Desse total, 19 casos se referem aos anos de 1970 a 1980, com uma média de 1,7 caso por ano. De 1981 a 1988, foram 41 casos, média de 5,1 casos por ano. De 1989 a 2008, foram identificados 200, o que corresponde a 76,9% do total, em média de dez casos por ano”, disse Guerra-Júnior.
Segundo ele, o aumento no número de casos não ocorreu por uma ocorrência maior da síndrome, mas por dois motivos principais. “Em primeiro lugar, houve um maior número de casos com a suspeita da síndrome encaminhados a um serviço de referência criado pelo Hospital de Clínicas e FCM em 1989, o Ambulatório do Grupo Interdisciplinar de Estudos da Determinação e Diferenciação do Sexo”, disse.
“O outro motivo foi o aperfeiçoamento do diagnóstico a partir do desenvolvimento de métodos mais avançados e precisos, como maior número de metáfases [fase da divisão celular em que cromossomos se alinham na região mediana da célula] contadas na análise citogenética e a inclusão de técnicas de biologia molecular e/ou citogenética molecular na avaliação de casos selecionados”, completou.
De acordo com o pesquisador, até a década de 1980 a análise citogenética era menos precisa, com técnicas de coloração convencional e com contagem de menos de 30 metáfases por cariótipo (análise laboratorial da constituição cromossômica).
“Por esses motivos, podem ter havido casos de síndrome de Turner que passaram sem diagnóstico. No fim daquela década, houve uma melhora nas técnicas de coloração e o aumento da contagem de metáfases para 30 e, frequentemente, 50, melhorando a precisão do diagnóstico citogenético. A síndrome é uma condição relativamente frequente, mas pouco diagnosticada ou identificada tardiamente. É preciso um laboratório com infraestrutura adequada e pessoal muito bem treinado para fazer o exame do cariótipo”, explicou.
O Laboratório de Citogenética Humana da FCM foi um dos pioneiros no país na realização de exames de cariótipo e, portanto, no diagnóstico dessa síndrome.
Resultados confirmados
As gônadas – glândulas reprodutivas, correspondente aos testículos no homem e aos ovários na mulher – das pacientes com síndrome de Turner são disgenéticas, ou seja, compostas por tecido fibroso sem capacidade de produção de hormônios ou gametas.
Quando associadas à presença de sequências do cromossomo Y, apresentam maior risco de desenvolver tumor. Por isso, na segunda etapa do projeto de pesquisa, o objetivo foi saber quais das pacientes com a síndrome apresentavam cromossomo Y.
A síndrome se caracteriza pela perda total ou parcial do segundo cromossomo sexual, que tanto pode ser X ou Y. Mas no estudo, Guerra-Júnior e equipe, ao analisar os 260 casos diagnosticados, observaram que 16 deles continham cromossomo Y íntegro ou não.
Desses 16 casos, seis apresentaram mosaicismo (mais de uma linhagem cromossômica no exame do cariótipo) com a presença de cromossomo Y íntegro e foram diagnosticados pela análise direta do cariótipo. Os demais foram identificados apenas após estudo molecular de sequências do cromossomo Y por análise de reação em cadeia pela polimerase (PCR, na sigla em inglês) – realizado no CBMEG – e todos confirmados pela análise de uma técnica de citogenética molecular conhecida como FISH (de “Fluorescent in situ hybridization”) – feita no Laboratório de Citogenética Humana.
“Alguns trabalhos apontam que a análise do DNA pela biologia molecular, especialmente quando utilizada a técnica de nested-PCR, não é um bom método para a pesquisa de Y na síndrome de Turner, por poder apresentar diagnósticos falso-positivos. Nosso trabalho mostrou que os dois métodos (PCR e FISH) apresentam resultados exatamente iguais. Aquelas em que não se consegue diagnosticar por um método não se consegue com outro. E vice-versa. A correlação foi de 100%”, afirmou Guerra-Júnior.
Para a realização da terceira etapa do projeto, os pesquisadores analisaram as 32 gônadas das 16 meninas com diagnóstico de síndrome de Turner e presença de cromossomo Y íntegro ou não.
Aqui, também um resultado importante foi encontrado. Ao analisar a histologia das 32 gônadas pela técnica convencional de coloração por hematoxilina-eosina, não houve identificação de tumor em nenhuma delas. Esta etapa do estudo foi realizada no Laboratório do Departamento de Anatomia Patológica da FCM.
“Quando aplicamos uma técnica mais sofisticada de imunohistoquímica no material dessas 32 gônadas, utilizando o anticorpo OCT4 – fator de transcrição importante para a manutenção das células primordiais germinativas –, em quatro delas, de três pacientes, ocorreu uma marcação fortemente positiva (mais de 80% de marcação nos núcleos das células) para esse anticorpo, mostrando que o tumor não diagnosticado pela técnica de coloração histológica convencional foi diagnosticado pela marcação imunohistoquímica com o OCT4, reafirmando a necessidade de gonadectomia profilática das pacientes com síndrome de Turner e sequências de cromossomo Y”, disse Guerra-Júnior.
Essa etapa do estudo foi realizada no Laboratório do Departamento de Histologia e Embriologia do Instituto de Biologia da Unicamp. Os resultados dessas duas últimas etapas do projeto serão publicados em breve em revistas internacionais indexadas da área, segundo o pesquisador.
Diagnóstico tardio
Guerra-Júnior ressalta que um problema importante ainda é o diagnóstico tardio da síndrome por pediatras, alguns por não pensarem na possibilidade desse diagnóstico e outros por não terem acesso fácil ao exame do cariótipo. O diagnóstico tem ocorrido frequentemente após os 11 ou 12 anos de idade, o que impede que algumas medidas terapêuticas benéficas a essas pacientes não possam ser implementadas.
“A síndrome de Turner poderia e deveria ser diagnosticada nos primeiros anos de vida, pelas alterações físicas que essas pacientes podem apresentar (dismorfismos ou estigmas) e, principalmente, pelo déficit de crescimento”, explicou.
“O hormônio de crescimento é autorizado mundialmente para uso nessas pacientes e, no Brasil, é distribuído gratuitamente pelo SUS como medicação de alto custo para as portadoras da síndrome. No entanto, seu uso, para ser eficaz, tem que ser precoce, o que não tem ocorrido, pelo diagnóstico tardio”, disse.
Essas pacientes, além do déficit de crescimento e das alterações da puberdade (não desenvolvimento de mamas, ausência de menstruação e infertilidade), podem apresentar outras anomalias congênitas e adquiridas, como malfomações cardiovasculares e renais, deficiência auditiva, hipertensão arterial sistêmica, doenças na tireóide, osteoporose e obesidade. O diagnóstico precoce da doença também permite uma melhor avaliação e conduta dessas outras doenças associadas.
“A presença de tantos sinais e sintomas pode levar a graves consequências na esfera psicológica e social das pacientes com síndrome de Turner, devido à reação própria da paciente a essas características ou à reação dos outros”, disse Guerra-Júnior.
“Os principais pontos são baixa estatura nas crianças, ausência de puberdade espontânea nas adolescentes e infertilidade nas mulheres adultas. A situação ideal é a de ter um diagnóstico preciso e precoce, com a instalação de medidas terapêuticas adequadas para cada fase da vida, e a atuação de um psicólogo junto com a equipe médica para apoio da paciente e da família”, afirmou.
Para ler o artigo A inclusão de novas técnicas de análise citogenética aperfeiçoou o diagnóstico cromossômico da síndrome de Turner, disponível na biblioteca on-line SciELO (Bireme/FAPESP), clique aqui.
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