A afirmação é de Tom Blundell, professor emérito da Universidade de Cambridge, um dos pioneiros na aplicação da abordagem de descoberta de novos fármacos com base em fragmentos

Descobrir novos fármacos requer união de metodologias experimentais e computacionais
10 de abril de 2012

A afirmação é de Tom Blundell, professor emérito da Universidade de Cambridge, um dos pioneiros na aplicação da abordagem de descoberta de novos fármacos com base em fragmentos

Descobrir novos fármacos requer união de metodologias experimentais e computacionais

A afirmação é de Tom Blundell, professor emérito da Universidade de Cambridge, um dos pioneiros na aplicação da abordagem de descoberta de novos fármacos com base em fragmentos

10 de abril de 2012

A afirmação é de Tom Blundell, professor emérito da Universidade de Cambridge, um dos pioneiros na aplicação da abordagem de descoberta de novos fármacos com base em fragmentos

 

Por Fábio de Castro

Agência FAPESP – Professor emérito do Departamento de Bioquímica da Universidade de Cambridge (Inglaterra), Sir Tom Blundell tem se dedicado desde a década de 1970 à pesquisa em biologia estrutural e bioinformática, com foco em aplicações na medicina e na descoberta de novos fármacos.

Ao longo do tempo, Blundell percebeu as crescentes dificuldades financeiras que as grandes empresas do ramo farmacêutico e agroquímico enfrentavam para desenvolver novos produtos. A necessidade de baratear a descoberta de novas moléculas o levou a se interessar, nas últimas duas décadas, por uma nova abordagem, conhecida como “descoberta de novas drogas com base em fragmentos”.

A estratégia consiste em identificar pequenos fragmentos químicos que se ligam a alvos biológicos bem definidos, utilizando métodos computacionais para ampliá-los e combiná-los, produzindo compostos líderes com uma eficiência maior do que os métodos baseados na triagem de grandes moléculas.

Em 1999, com o colega de Cambridge Chris Abell e o empresário Harren Jhoti, Blundell fundou a empresa Astex Therapeutics, que passou a aplicar com sucesso a nova abordagem de descoberta de fármacos.

O uso da biologia estrutural em diversas aplicações da abordagem de design de novos fármacos com base em fragmentos foi o tema da conferência apresentada por Blundell no dia 1º de abril, em Campinas (SP), na abertura do curso Advanced Topics in Computational Biology – Agrochemical & Drug Design.

Coordenado por Goran Neschich, do Grupo de Pesquisa em Biologia Computacional (GPBC), da Embrapa Informática Agropecuária, o evento foi realizado no âmbito da Escola São Paulo de Ciência Avançada (ESPCA), modalidade de apoio da FAPESP.

O curso reuniu mais de 80 estudantes de graduação e pós-graduação, brasileiros e estrangeiros, das áreas de biologia computacional, bioquímica, biologia estrutural e ciências biomédicas. Durante o evento, Blundell, que também é fellow da Royal Society, concedeu à Agência FAPESP a seguinte entrevista:

Agência FAPESP – A abordagem conhecida como “descoberta de novos fármacos com base em fragmentos” é considerada um paradigma emergente para o setor. Por que foi preciso tal mudança?
Tom Blundell – Precisamos muito de novos fármacos e agroquímicos. O problema é que, principalmente nos últimos 20 anos, o custo para se fazer novos medicamentos e agroquímicos aumentou tremendamente. Isso ocorre em parte por conta das novas tecnologias genômicas e químicas, que são muito caras, mas também porque foram aumentadas as exigências regulatórias, o que tem impacto no custo de desenvolvimento dessas novas moléculas.

Agência FAPESP – A abordagem com base em fragmentos pode ser a solução para esse desafio?
Blundell – Há duas maneiras de lidar com esse problema. A primeira é melhorar a eficiência na confecção dessas novas moléculas, a fim de diminuir o custo. A outra é aumentar o grau de certeza envolvido nos estágios iniciais dessa confecção, de modo que os problemas de fracasso no desenvolvimento não aumentem o custo. A nova abordagem tem foco principalmente nessa segunda linha de ação.

Agência FAPESP – Como se faz para aumentar esse grau de certeza?
Blundell – Nos últimos anos temos buscado novas maneiras de aplicar métodos estruturais e computacionais a fim de identificar moléculas com mais seletividade. Para novos fármacos e agroquímicos, as metodologias são mais ou menos idênticas. Os avanços nos quais estou envolvido – e com os quais muita gente contribuiu – tem relação com a identificação de novos alvos, para tentar entender quais são os pontos críticos onde intervir. Até então, focávamos em grandes famílias de proteínas, quinases ou proteases, mas tendíamos a perder seletividade. Então, tentamos usar como alvos redes de enzimas a que chegamos por diferentes caminhos.

Agência FAPESP – A mudança fundamental se deu na identificação de novos alvos?
Blundell – A identificação de novos alvos é um passo. Outro passo são as maneiras que descobrimos para explorar a química com o conhecimento desses alvos. O que temos feito, fundamentalmente, consiste em pensar em novas estratégias de triagem [screening] a fim de trabalhar com um número menor de compostos. E em como usar o conhecimento que temos dos alvos para elaborar esses compostos. Esse tende a ser um jeito muito eficiente para conseguir moléculas que sejam seletivas.

Agência FAPESP – Essa é a chamada abordagem de descoberta de novos fármacos com base em fragmentos?
Blundell – Sim, é uma metodologia que tentamos desenvolver na nossa empresa, Astex, desde 1999. Usamos a cristalografia de raios X de diferentes maneiras, seja para analisar a estrutura de alvos biológicos, ou para selecionar fragmentos de moléculas semelhantes a drogas que são compatíveis com os formatos das áreas ativas. Também usamos a técnica para fazer a triagem de fragmentos a fim de selecionar “baterias” iniciais, que depois são transformadas em compostos líderes de alta qualidade, com a aplicação de conhecimento da área computacional e da química medicinal.

Agência FAPESP – Houve importantes e rápidos avanços tecnológicos nos últimos anos em áreas como a genômica. É preciso cada vez mais tecnologia para extrair conhecimento da enorme quantidade de dados gerada por esse tipo de progresso?
Blundell – Precisamos cada vez mais de novos métodos computacionais, mas também de novos métodos experimentais. De fato, temos muita informação acumulada devido às técnicas computacionais que se tornaram mais aprimoradas, mas isso não deve ser visto como parte do problema e sim como parte da solução. Apesar de termos muita informação, não ajuda em nada ignorar o problema. Há dados preciosos ali no meio e temos que descobrir como focar nos alvos mais seletivos. É preciso assumir que teremos que lidar com toda essa informação. Podemos usá-la de forma muito construtiva para identificar alvos e também para otimizar os processos e encontrar novos produtos químicos. Vejo utilidade da computação tanto para gerenciar os dados como para buscar hipóteses. Mas vejo a necessidade de unir as metodologias experimentais e computacionais.

Agência FAPESP – O senhor acha que é prioritário desenvolver novos métodos computacionais?
Blundell – Não. Os métodos computacionais são importantes, mas estão longe de ser o fator mais importante. Além de desenvolver novas abordagens computacionais é preciso desenvolver novos métodos experimentais. Os dois precisam caminhar juntos. Não podemos entender o genoma sem métodos experimentais e não podemos gerar os dados sem os métodos computacionais. O mesmo ocorre com o transcriptoma, o proteoma e o metaboloma.

Agência FAPESP – O mais importante, então, é estabelecer um equilíbrio entre essas vertentes?
Blundell – O principal é lembrar que a ciência é, cada vez mais, essencialmente multidisciplinar. Se você for ao meu laboratório verá que trabalho com pesquisadores da área médica – clínica e experimental –, computacional e biológica. Todos trabalhando juntos. Ninguém pensa que sua contribuição é a mais importante. O objetivo é ter a capacidade de construir em equipe novos métodos e, a partir deles, novos experimentos.

FAPESP – O senhor considera um desafio trabalhar com cientistas de outras áreas?
Blundell – É muito mais fácil trabalhar com pessoas de outras áreas. Quando você junta muita gente da mesma disciplina, os indivíduos se tornam competitivos e até briguentos. Mas se você tem um pesquisador da medicina, outro da computação e um da biologia trabalhando juntos, cada um sabe que tem algo a aprender com os demais. No meu laboratório não temos brigas. Isso ocorre porque todos dependem do conhecimento dos outros e é preciso ter um respeito mútuo. Precisamos nos entender para interagir, trabalhar juntos e construir uma abordagem multidisciplinar.

 

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