Para Velasco e Cruz, da Unicamp, está claro que a agenda nacional continua sendo feita de forma conservadora (foto: E.Geraque)
Ao extrapolar os conceitos do campo exclusivamente institucional, a análise sobre os 20 anos da atual democracia brasileira gera elogios, mas ao mesmo tempo mostra importantes áreas de exceção, apontam cientistas como Sebastião Velasco e Cruz
Ao extrapolar os conceitos do campo exclusivamente institucional, a análise sobre os 20 anos da atual democracia brasileira gera elogios, mas ao mesmo tempo mostra importantes áreas de exceção, apontam cientistas como Sebastião Velasco e Cruz
Para Velasco e Cruz, da Unicamp, está claro que a agenda nacional continua sendo feita de forma conservadora (foto: E.Geraque)
Agência FAPESP - Nenhum dos três cientistas sociais convidados como debatedores na sessão especial "20 anos de vida democrática", realizada durante o primeiro dia do 29º Encontro Anual da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs), em Caxambu (MG), ousou fazer uma análise negativa do período iniciado em 1985.
Mas, mesmo com muitos elogios e saudações ao processo de forma geral, Sebastião Velasco e Cruz (Universidade Estadual de Campinas), Luiz Eduardo Soares (Universidade Estadual do Rio de Janeiro) e Renato Lessa (Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro) mostraram a existência de abismos gigantescos, em que o processo democrático ainda não chegou.
"A desigualdade de renda é um dos assuntos que continuam fora da agenda democrática. A preocupação em garantir o patamar básico a todos os cidadãos, em termos de segurança, não existia nos anos 1980 e continua ausente", disse Velasco e Cruz à Agência FAPESP. Para ele, está claro que a agenda nacional continua sendo feita de forma conservadora.
Defensor das igualdades sociais e democráticas como motores de desenvolvimento de um país, o professor da Unicamp também tem o mesmo pensamento em relação ao problema da reforma agrária, que afirma continuar esquecido.
"Claro que um balanço sóbrio dos últimos 20 anos merece citar apontamentos muito mais positivos. Vivemos um período longo de normalidade constitucional, apesar das crises econômicas e políticas vividas", disse.
A falta de igualdade no campo da segurança política também ganhou eco nas palavras de Luiz Eduardo Soares. Para ele, o país está protagonizando um genocídio, principalmente entre os jovens negros. "No Brasil, ao ano, morrem 25 vítimas por violência fatal em cada 100 mil habitantes. Em algumas regiões periféricas das grandes metrópoles, essa relação sobe para até 250 mortes em 100 mil habitantes", disse. Segundo o pesquisador da Uerj, além de essa violência atingir garotos negros, ela só é vista, nessas mesmas proporções, em países que estão em guerra civil.
Adepto de uma política de segurança pública que mantenha a ordem e ao mesmo tempo garanta o respeito aos direitos humanos, Soares mostrou uma série de paradoxos legais existentes no Brasil que não contribuem em nada para que a sua visão seja contemplada. "Temos uma ambigüidade muito grande, hoje, em termos de controle das polícias em geral. Na verdade, elas foram criadas para ser miniexércitos e deveriam ser controladas pelas próprias Forças Armadas", disse.
Segundo o pesquisador, esse quadro gera corporações pouco sensíveis e que não estão voltadas para a questão da cidadania. Soares também acredita que uma agenda mais conservadora deverá a ser tônica nessa área daqui para a frente, ainda mais depois do resultado do referendo realizado no último domingo. "A polícia é muito importante. Ela deve ser tratada como uma parceira fundamental. Em uma democracia, nem a polícia ou a segurança pública podem ficar esquecidas", afirmou.
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