A pesquisadora Aparna Banerjee, da Universidade Autônoma do Chile, durante pesquisa na USP (foto: acervo dos pesquisadores)
Em uma fonte termal situada no Chile, pesquisadores isolaram uma cepa de Pseudomonas alcaligenes capaz de resistir a temperaturas de até 44 °C e caracterizaram as substâncias produzidas pelo microrganismo para sobreviver em condições extremas
Em uma fonte termal situada no Chile, pesquisadores isolaram uma cepa de Pseudomonas alcaligenes capaz de resistir a temperaturas de até 44 °C e caracterizaram as substâncias produzidas pelo microrganismo para sobreviver em condições extremas
A pesquisadora Aparna Banerjee, da Universidade Autônoma do Chile, durante pesquisa na USP (foto: acervo dos pesquisadores)
Thais Szegö | Agência FAPESP – Trabalho publicado no periódico Scientific Reports examinou o biofilme produzido por um tipo de bactéria encontrada em uma fonte termal de Medano, localizada nas Montanhas Andinas Centrais do Chile, e comprovou que suas propriedades naturais podem ser exploradas no desenvolvimento de aditivos naturais para a indústria farmacêutica e alimentícia.
A substância, formada por polímeros de carboidratos extracelulares chamados exopolissacarídeos (EPS), é produzida pela espécie Pseudomonas alcaligenes, cepa Med1 termotolerante (que cresce em temperatura entre 34 °C e 44 °C), como uma forma de proteger a célula bacteriana, garantindo sua sobrevivência no ambiente inóspito em que vive, com características de altas temperaturas, pH de caráter ácido e concentrações elevadas de metais.
Com a crescente demanda por compostos naturais e bioativos em várias indústrias, os EPS têm sido alvo de estudos por causa das suas propriedades estruturais e funcionais, que podem oferecer alternativas valiosas aos aditivos sintéticos. Além disso, em comparação com os polissacarídeos vegetais, os EPS microbianos apresentam uma variedade muito maior de propriedades físico-químicas e de atividades biológicas.
Devido aos seus efeitos antivirais, antitumorais, imunorreguladores, antioxidantes, emulsificantes e floculatórios (capacidade de agrupar pequenas partículas em um líquido ou suspensão, formando aglomerados maiores, os flocos) já conhecidos, os EPS recebem bastante atenção das indústrias biomédica, alimentícia, de biomateriais, de cosméticos e de tratamento de águas residuais. Portanto, estudar essas estruturas provenientes de bactérias extremofílicas (capazes de viver em ambientes de condições extremas para a maioria dos outros seres vivos) é uma forma de compreendê-las melhor e de criar oportunidades para encontrar novos recursos dessas substâncias com aplicações biotecnológicas.
“Optamos por estudar as fontes termais da região de Maule, no Chile Central, porque elas são comparativamente pouco exploradas em termos de aspectos biotecnológicos de compostos bioativos de valor agregado produzidos pelas bactérias como parte de sua resistência ao estresse provocado pelos fatores do meio ambiente onde se encontram”, conta João Paulo Fabi, professor do Departamento de Alimentos e Nutrição Experimental da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (FCF-USP) e coautor do artigo.
A primeira parte do trabalho, feita em parceria por pesquisadores brasileiros, chilenos, americanos e iraquianos com apoio da FAPESP, foi coletar uma amostra de água da fonte termal. Então, a bactéria foi isolada, teve seu genoma sequenciado e foi avaliada a otimização da produção dos EPS em alta temperatura para confirmar o seu comportamento de termotolerância.
Foi possível concluir que as bactérias isoladas toleram temperaturas até 44 °C, sendo o marco de 37 °C o melhor ponto para o seu crescimento. A produção desses EPS em alta temperatura é uma boa notícia, explicam os cientistas, pois mitiga o crescimento indesejado de outros microrganismos no processo de produção biotecnológico.
Também foram realizados a caracterização físico-química completa do EPS e o estudo funcional da substância para avaliar sua aplicação tecnológica na indústria de alimentos e farmacêutica. Essa segunda etapa contou com a participação da professora Aparna Banerjee, da Universidade Autônoma do Chile, durante visita ao laboratório de Fabi. P. alcaligenes Med1 possui propriedades estruturais únicas e exibe atividades significativas de estabilidade térmica, antioxidante, emulsificação e floculação, o que o torna adequado para aplicações potenciais na indústria alimentícia e farmacêutica como um aditivo natural”, conta Fabi.
O pesquisador acrescenta que os dados estruturais exclusivos obtidos pelos estudos genômicos e analíticos também fornecem uma base para explorar outros EPS bacterianos extremofílicos com aplicações semelhantes. “Embora mais testes e aprovações regulatórias sejam necessários para uso comercial, este EPS mostra forte potencial como uma alternativa natural aos aditivos sintéticos, especialmente em aplicações que exigem estabilidade térmica e biocompatibilidade.”
Ainda segundo Fabi, o estudo também ofereceu um modelo para otimizar a produção de EPS e fornece novas perspectivas sobre a bioatividade desse composto, que pode levar a aditivos sustentáveis e ecológicos em várias indústrias, incluindo alimentos, cosméticos e produtos farmacêuticos.
O artigo Unveiling a novel exopolysaccharide produced by Pseudomonas alcaligenes Med1 isolated from a Chilean hot spring as biotechnological additive pode ser lido em: www.nature.com/articles/s41598-024-74830-6#Fun.
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