Especialistas discutem a influência da propaganda na epidemia de sobrepeso entre crianças e adolescentes. Estimativa da Unifesp aponta que 10% dos brasileiros entre 10 e 15 anos são obesos
Especialistas discutem a influência da propaganda na epidemia de sobrepeso entre crianças e adolescentes. Estimativa da Unifesp aponta que 10% dos brasileiros entre 10 e 15 anos são obesos
Agência FAPESP - Os números preocupam as autoridades, os médicos e a comunidade científica. O governo brasileiro gasta todos os anos, em média, R$ 15 milhões no tratamento de doenças associadas à obesidade, como diabetes, infarto e hipertensão. Além disso, uma estimativa recente da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) apontou que 10% dos adolescentes brasileiros entre 10 e 15 anos são obesos.
Essas informações levam os gestores públicos brasileiros a concluir que é muito mais barato, rápido e eficiente prevenir a ocorrência de novos casos de obesidade. Isso deve ser feito principalmente nos primeiros anos de vida do indivíduo, o que seria melhor do que gastar fortunas no combate a essas doenças relacionadas ao ganho excessivo de peso.
Esses foram assuntos discutidos na sexta-feira (19/8), durante a jornada "Propaganda de alimentos e obesidade na infância e adolescência", em São Paulo, que colocou frente a frente profissionais da saúde e publicitários. O objetivo do encontro era refletir sobre o papel da propaganda na promoção de alimentos pouco saudáveis.
"A criança não consegue distinguir a fantasia de uma propaganda com o mundo real dos alimentos nocivos à saúde humana", acredita Rosely Sichieri, professora do Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). "Por isso, ou as propagandas devem passar a mostrar como prevenir o consumo excessivo desses alimentos, ou esse número tenderá a crescer a um ritmo cada vez mais acelerado. Atualmente, só o tabagismo excede a obesidade nos custos associados ao tratamento dessas doenças", alerta.
Na jornada foi divulgada uma pesquisa da Unifesp que mostra a qualidade dos anúncios veiculados nos intervalos de programas infantis na televisão brasileira. Pesquisadores do Departamento de Pediatria analisaram durante um mês o conteúdo das campanhas publicitárias de produtos alimentícios voltadas para as crianças.
Os resultados revelam que, a cada 10 minutos de exibição, 1 minuto tem como objetivo estimular o consumo de produtos alimentícios com alto teor de gordura saturada e açúcar refinado. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), 30 segundos de propaganda são suficientes para exercer forte influência sobre os jovens. "Isso mostra o inquestionável poder de persuasão das propagandas, espaço que deveria ser explorado de modo a prevenir a obesidade", disse Rosely à Agência FAPESP.
De quem é a culpa?
O sócio diretor e vice-presidente de criação da agência de propaganda QG, Sérgio Lopes, reconhece que as campanhas publicitárias conseguem transformar hábitos alimentares e, em alguns casos, realmente levam o público ao consumo exagerado de determinados produtos. "O principal objetivo da publicidade é convencer o público a consumir o produto anunciado, de preferência várias vezes ao dia. Mas a intenção é divulgar um produto desconhecido e mostrar suas vantagens, e não fazer o consumidor engordar", afirmou.
Para ele, a culpa do consumo desenfreado não é só da propaganda e sim de toda a cadeia de interesses por trás de um anúncio. E isso inclui, por exemplo, os fornecedores de ingredientes, a indústria de alimentos, os fabricantes de embalagem que muitas vezes não descrevem os valores nutricionais e calóricos dos alimentos no rótulo e, principalmente, a legislação do setor que, segundo o publicitário, não consegue acompanhar a evolução dos conceitos alimentares.
"Por isso, é preciso que a consciência social se movimente como um todo. O combate à obesidade infantil não se restringe a apenas proibir a propaganda. O ideal seria a criação de campanhas de esclarecimento por meio de documentários e filmes de utilidade pública, além de uma revisão da legislação alimentar para proibir os alimentos nocivos", aponta.
Uma informação divulgada no evento na Unifesp pode ser um bom começo rumo a essa conscientização e poderá servir de exemplo para incentivar a mobilização social em nosso país. A Coca-Cola e a Pepsi anunciaram recentemente que vão deixar de vender refrigerantes para as cantinas das escolas de ensino fundamental nos Estados Unidos. A medida responde à mobilização de setores da sociedade preocupados com o aumento da obesidade entre jovens. O problema atinge 30% das crianças norte-americanas entre 6 e 11 anos.
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