Durante expedição oceanográfica serão coletadas amostras de sedimentos marinhos na foz do rio Amazonas e na desembocadura do rio Parnaíba com o objetivo de avaliar os efeitos de períodos mais quentes nas duas regiões há milhões de anos; missão terá cobertura in loco da Agência FAPESP (imagem: divulgação)

Cientistas do Brasil e da França vão reconstituir história climática da bacia amazônica e do Nordeste
12 de junho de 2023

Durante expedição oceanográfica serão coletadas amostras de sedimentos marinhos na foz do rio Amazonas e na desembocadura do rio Parnaíba com o objetivo de avaliar os efeitos de períodos mais quentes nas duas regiões há milhões de anos; missão terá cobertura in loco da Agência FAPESP

Cientistas do Brasil e da França vão reconstituir história climática da bacia amazônica e do Nordeste

Durante expedição oceanográfica serão coletadas amostras de sedimentos marinhos na foz do rio Amazonas e na desembocadura do rio Parnaíba com o objetivo de avaliar os efeitos de períodos mais quentes nas duas regiões há milhões de anos; missão terá cobertura in loco da Agência FAPESP

12 de junho de 2023

Durante expedição oceanográfica serão coletadas amostras de sedimentos marinhos na foz do rio Amazonas e na desembocadura do rio Parnaíba com o objetivo de avaliar os efeitos de períodos mais quentes nas duas regiões há milhões de anos; missão terá cobertura in loco da Agência FAPESP (imagem: divulgação)

 

Elton Alisson, de Paramaribo | Agência FAPESP* – Um grupo de 50 cientistas vinculados a universidades e instituições de pesquisa do Brasil e da França começa hoje (12/06) a segunda etapa de uma expedição oceanográfica entre Paramaribo, no Suriname, e Recife (PE).

Batizada de Amarillys-Amagas, o objetivo principal da missão é avançar no entendimento sobre o papel da Amazônia e do Nordeste no sistema climático global. Para isso, os pesquisadores realizarão atividades na foz do rio Amazonas e na desembocadura do rio Parnaíba, na divisa dos estados do Piauí e do Maranhão, a bordo do maior navio oceanográfico da França, o Marion Dufresne, com 120,5 metros de comprimento.

A Agência FAPESP fará a cobertura jornalística dessa segunda etapa da expedição, iniciada em 17 de maio em Bridgetown, em Barbados, e com término previsto em 3 de julho, em Recife. O conteúdo será publicado ao longo das próximas semanas em uma sessão do site intitulada Diário de bordo.

“Um dos objetivos da expedição será reconstituir a história climática da bacia amazônica e do Nordeste, em várias escalas de tempo, ao longo dos últimos milhões de anos, e avaliar os efeitos de períodos mais quentes do passado sobre a biodiversidade, a vegetação e a precipitação nas duas regiões, assim como na circulação oceânica do Atlântico Sul”, diz à Agência FAPESP Cristiano Mazur Chiessi, professor da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH-USP) e coordenador brasileiro da expedição.

De acordo com Chiessi, durante os últimos 2,6 milhões de anos a Terra passou por diversos períodos interglaciais, em que a temperatura média foi mais quente que a atual. Porém, as causas do aquecimento nessas épocas foram diferentes das mudanças climáticas atuais, impulsionadas pelo aumento das emissões de gases de efeito estufa (GEE) na atmosfera, geradas no Brasil principalmente pelo desmatamento da floresta amazônica.

Por meio de análises de sedimentos marinhos – misturas de argila do continente e de restos de microrganismos depositados no fundo do mar –, os pesquisadores pretendem reconstituir o clima desses períodos na Amazônia e no Nordeste e compará-los com o dos últimos 200 anos, por exemplo, a fim de verificar a influência das atividades humanas.

Com base nesses registros do passado, também será possível projetar com maior precisão os impactos do aquecimento global atual na floresta amazônica e no Nordeste nas próximas décadas, explica Chiessi.

“Esses momentos da história geológica da Terra, que iremos reconstituir por meio da expedição, têm similaridades com o período atual, mas não são análogos perfeitos porque não existia a pressão antrópica no clima que há hoje. Nessas épocas, a concentração de CO2 na atmosfera era de, no máximo, 270 ppm [partes por milhão], enquanto hoje está acima de 400 ppm e vem aumentando com o desmatamento e outros fatores”, compara.

Com auxílio de diferentes tipos de equipamentos embarcados no navio oceanográfico serão coletadas amostras de sedimentos da coluna sedimentar marinha, com comprimentos que variam de 0,5 a 65 metros, em mais de dez lugares diferentes ao longo da Guiana Francesa, na foz do rio Amazonas e ao largo da desembocadura do rio Parnaíba.

O emprego de uma bateria de diferentes técnicas em laboratório, após a conclusão da missão, permitirá obter traçadores orgânicos de polens, moléculas orgânicas e restos de plâncton, além de traçadores químicos e físicos presentes nos sedimentos, e rastrear a composição química da água. Dessa forma, será possível obter informações como temperatura, salinidade, tipo de vegetação e circulação profunda no oceano há milhões de anos, diz Chiessi.

“Esses testemunhos sedimentares permitirão reconstituir a história climática da bacia amazônica e do Nordeste brasileiro, bem como das correntes oceanográficas adjacentes, com resolução e alcance temporais inéditos”, afirma o pesquisador.

Circulação oceânica

Na avaliação de Chiessi, a despeito de serem muito diferentes, o Nordeste e a Amazônia experimentaram variações climáticas em diferentes escalas de tempo e sofrem atualmente pressões que podem causar a diminuição de chuvas sobre essas regiões nos próximos anos.

As chuvas nas duas regiões e em boa parte da América do Sul são controladas pela circulação do oceano Atlântico, conhecida como Célula de Revolvimento Meridional do Atlântico.

Por meio de um projeto apoiado pela FAPESP, Chiessi tem estudado essa gigantesca circulação de águas que leva calor do Atlântico Sul para o Atlântico Norte e que, com as mudanças climáticas, poderá diminuir quase pela metade ainda neste século (leia mais em agencia.fapesp.br/23015/).

“Assim como a floresta amazônica, a circulação do oceano Atlântico pode atingir um limiar crítico ou tipping point [ponto de não retorno]. Se isso ocorrer ela passará a operar de um modo completamente distinto e causará mudanças ainda mais rápidas e intensas na precipitação do Nordeste e da floresta amazônica, por exemplo”, diz Chiessi.

Por meio dos sedimentos coletados durante o cruzeiro, também será possível analisar os mecanismos em ação sobre essa circulação do Atlântico Sul e as interações entre a Amazônia e o Nordeste, avalia o pesquisador.

“O material que coletaremos durante a expedição será suficiente para realização de estudos ao longo dos próximos dez anos”, afirma Chiessi.

* O repórter viaja a convite do Centro Nacional de Pesquisa (CNRS) da França.
 

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