Carga perigosa
19 de novembro de 2003

Participantes do Congresso Brasileiro de Microbiologia, em Florianópolis, discutem novas formas de enfocar a relação entre microrganismos e meio ambiente. A água utilizada como lastro pelos navios que cruzam os oceanos, por exemplo, pode ser importante foco de risco para os seres humanos

Carga perigosa

Participantes do Congresso Brasileiro de Microbiologia, em Florianópolis, discutem novas formas de enfocar a relação entre microrganismos e meio ambiente. A água utilizada como lastro pelos navios que cruzam os oceanos, por exemplo, pode ser importante foco de risco para os seres humanos

19 de novembro de 2003

 

Por Eduardo Geraque, de Florianópolis

Agência FAPESP - A cena, em portos importantes do litoral brasileiro e de várias outras cidades do mundo, é bastante comum. Atracados, os navios costumam descartar a água utilizada para lastrear a embarcação durante as viagens. Como o líquido também é retirado das regiões litorâneas próxima dos portos, antes da partida, esse importante volume de água, geralmente cheio de microrganismos, é transportado ao redor do mundo sem maiores controles.

"Precisamos mapear os portos brasileiros do ponto de vista microbiológico. São áreas que apresentam riscos em potencial", disse Irma Rivera, professora do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da Universidade de São Paulo. O trabalho da cientista, apresentado no Congresso Brasileiro de Microbiologia que está sendo realizado em Florianópolis (SC), é pioneiro, em termos nacionais, no estudo das águas de lastro utilizadas por embarcações de grande porte.

Segundo a pesquisadora, o grupo de estudo que ela lidera já enviou à Organização Pan-Americana de Saúde um documento que alerta sobre a importância de se espalhar essas pesquisas com águas de lastro para outras áreas do mundo.

O víbrio cholerae, por exemplo, é endêmico de regiões da África e da Ásia. Para Irma, esse microrganismo, causador da cólera e presente em ambientes aquáticos, pode ser introduzido em outras partes do mundo pela águas de lastro transportadas no tanque dos navios. "Esses reservatórios têm a capacidade de introduzir novas patogenias em determinadas regiões portuárias, além de microrganismos exóticos", disse.

O grupo do ICB começou um estudo com sete portos brasileiros. Grandes concentrações de Salmonella foram identificadas nas regiões dos portos de Belém e de Recife, por exemplo. Se o agente causador da cólera ainda não apareceu nos estudos, isto não significa que ele não esteja presente no meio ambiente portuário. "O surto de cólera em Paranaguá, em 1999, pode estar relacionado com as águas de lastro", disse Irma.

A professora Dolores Mehnert, também do ICB, está desenvolvendo um estudo que poderá resultar na criação de novas ferramentas para a investigação de águas de esgoto e de córregos poluídos.

"Estamos propondo que o adenovírus seja usado como indicador de contaminação aquática", disse Dolores, que também está em Florianópolis. Segundo a cientista, esses microrganismos são bons indicadores ambientais porque mostram uma forte resistência à cloração e também aos processos de limpeza realizados a partir de radiação.

Um estudo realizado por um grupo de pesquisadores liderado por Dolores mostrou que o adenovírus está presente, em todas as épocas do ano, de forma importante nas águas de esgoto e nos córregos da cidade de São Paulo.

"É um risco muito grande para a população. Esse vírus é responsável pela maioria dos casos de gastroenterite aguda infantil", disse. O objetivo dos pesquisadores é mapear a presença do adenovírus no meio ambiente paulista para que se saiba melhor como se proteger desses microrganismos.


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