Biodiversidade derretida
25 de julho de 2005

Fazer projetos em harmonia com a natureza – e não contra ela – é um dos pré-requisitos necessários para que sistemas produtivos, como o da criação de camarões no Nordeste, sejam considerados realmente sustentáveis, defende Wagner Valenti, da Unesp

Biodiversidade derretida

Fazer projetos em harmonia com a natureza – e não contra ela – é um dos pré-requisitos necessários para que sistemas produtivos, como o da criação de camarões no Nordeste, sejam considerados realmente sustentáveis, defende Wagner Valenti, da Unesp

25 de julho de 2005

 

Por Eduardo Geraque, de Fortaleza

Agência FAPESP - O tripé não pode se movimentar em falso. Para que a carcinicultura (criação de camarões) no Nordeste mereça o rótulo de sustentável, ela precisa responder a três importantes itens: o ambiental, o econômico e social.

Se para vários produtores essas questões estão claras, para outros não. Para Wagner Valenti, da Universidade Estadual Paulista (Unesp), a conseqüência é que em algum momento a produção poderá ser prejudicada. Os danos podem se espalhar para as comunidades tradicionais e a biodiversidade será derretida, como ocorria com o ouro nos tempos do Brasil Colônia.

"Claro que não estou chamando ninguém de ladrão ou coisa parecida. Mas, muitas vezes, está se destruindo a biodiversidade, que tem um valor gigantesco, para, no lugar, criar algo que será menos valioso", disse o pesquisador em simpósio na 57ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), em Fortaleza, no dia 22. "É praticamente o mesmo que roubar uma obra valiosa de uma igreja e depois derretê-la para vender apenas o ouro."

Em sua fala durante o debate – que começou com um espaço para as comunidades tradicionais do Ceará explanarem seus problemas em relação às empresas produtoras de camarão no Estado –, Valenti foi categórico: "Não é possível fazer nenhum tipo de produção, e isso não vale apenas para o camarão, mas para a soja também, se isso acarretar na destruição da biodiversidade".

Enquanto não se desenvolvem tecnologias que tornem a exploração da biodiversidade mais rentável do que a derrubada de um mangue para a criação de um viveiro de camarão, a questão precisa levar em consideração dois outros aspectos importantes da chamada sustentabilidade.

"A questão social é um ponto essencial. Qualquer produção tem que de feita em harmonia não apenas com a natureza, mas com a produção local e com a cultura das regiões. Melhorar a qualidade de vida das populações locais, pela questão do emprego, por exemplo, é fundamental. E, se um projeto qualquer for causar impactos negativos sobre uma comunidade, isso tem que ser colocado na planilha de custos e, de alguma forma, a população precisa ser ressarcida", afirma Valenti.

Para o pesquisador, em muitos casos é preciso que se mudem os modelos de produção para que eles consigam balancear as três áreas consideradas fundamentais. "Não estou com isso fazendo juízo de valores. Não tenho condições de dizer que a indústria da carcinicultura no Nordeste é toda sustentável ou não. Não se trata disso", disse.

O importante, para Valenti, é que as discussões sejam feitas sempre de forma racional, com base em aspectos técnicos e não em radicalismos. "Claro que novos paradigmas precisam ser colocados no sistema, para que ele fique atualizado diante das novas realidades", completou.


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