Alto contágio à vista
06 de dezembro de 2004

Durante o 2º Congresso de Infectologia do Cone Sul, especialistas alertam para a pandemia de hepatite C que poderá atingir o mundo nos próximos anos. Para Roberto Focaccia, do Emílio Ribas, o problema será mais grave em países como o Brasil

Alto contágio à vista

Durante o 2º Congresso de Infectologia do Cone Sul, especialistas alertam para a pandemia de hepatite C que poderá atingir o mundo nos próximos anos. Para Roberto Focaccia, do Emílio Ribas, o problema será mais grave em países como o Brasil

06 de dezembro de 2004

 

Por Eduardo Geraque

Agência FAPESP - O professor Roberto Focaccia, coordenador do grupo de hepatites do Hospital Emílio Ribas, é autor de um dos poucos trabalhos publicados até hoje em que se procurou avaliar a prevalência da hepatite C na população de São Paulo. No final da década de 1990, ele verificou que 1,42% das pessoas entre 2 e 80 anos eram portadora do vírus causador da doença, mas não sabiam.

"No mesmo estudo, observamos que a prevalência era muito maior, da ordem de 3,8%, entre os com mais de 30 anos", disse Focaccia à Agência FAPESP. Como a hepatite C pode demorar de cinco a 50 anos para se exteriorizar, as próximas décadas deverão assistir à corrida de indivíduos infectados para o sistema de saúde.

"Haverá um impacto muito grande, por exemplo, no número de transplantes de fígado", acredita Focaccia. Segundo o pesquisador, que participou do 2º Congresso de Infectologia do Cone Sul, realizado na semana passada em São Paulo, estimativas mostram, por exemplo, que esse tipo de cirurgia será um dos mais freqüentes nos Estados Unidos em 2020.

Para Focaccia não há dúvida de que o mundo está diante de uma pandemia de hepatite C. "Os índices da doença vão aumentar de forma assustadora nos próximos anos", assegura. A hepatite C, moléstia que tem apenas 15 anos – o vírus foi descrito pela ciência em 1989 –, é transmitida principalmente pelo contato com o sangue contaminado.

"Países em desenvolvimento, como o Brasil, onde devem existir de 4 milhões a 5 milhões de pessoas contaminadas com o vírus da hepatite C, apresentam maiores problemas, por causa principalmente de uma questão cultural", conta. O motivo é que a maioria acredita que apenas quem faz parte de grupos de risco – como usuários de drogas injetáveis – tem chances de adquirir a doença.

"A contaminação pode ocorrer pelas formas mais diversas, como com a lâmina não-descartável do barbeiro ou pelo cortador de cutícula da manicure", explica o médico. Pelos números apresentados durante o encontro, 60% dos pacientes com hepatite C atendidos no Emílio Ribas desconhecem totalmente o local onde podem ter sido contaminados.

Tratar a causa – e não a conseqüência – da transmissão do vírus da hepatite C, como também ficou claro durante o seminário, é importante por vários motivos. Apesar de existir medicações para combater a infecção – e de 29 drogas estarem em fase final de desenvolvimento –, os tratamentos são caros e com muitos efeitos colaterais. No caso de um avanço grande da doença, outro drama: o paciente precisa entrar na fila do transplante de fígado. Mas mesmo aqueles que conseguem estão muito longe da cura.

Avaliações apresentadas no congresso pelo médico Edson Abdalla, do Hospital das Clínicas (HC) da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, são claras. A expectativa de vida para os portadores de hepatite C com o fígado transplantado ainda são bem reduzidas. "No HC, metade das 800 pessoas que esperam por um fígado está infectada com o vírus da hepatite C", conta.


  Republicar
 

Republicar

A Agência FAPESP licencia notícias via Creative Commons (CC-BY-NC-ND) para que possam ser republicadas gratuitamente e de forma simples por outros veículos digitais ou impressos. A Agência FAPESP deve ser creditada como a fonte do conteúdo que está sendo republicado e o nome do repórter (quando houver) deve ser atribuído. O uso do botão HMTL abaixo permite o atendimento a essas normas, detalhadas na Política de Republicação Digital FAPESP.