Atlas de acesso aberto criado por pesquisadores da Unicamp traz informações sobre 2.176 genes de manutenção celular humano e 3.277 de camundongos que podem ser usados como uma “régua” para medir variações na expressão gênica em diferentes experimentos (imagem: liyuanalison/Pixabay)

Plataforma on-line reúne genes de referência para pesquisa biomolecular
24 de novembro de 2020
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Atlas de acesso aberto criado por pesquisadores da Unicamp traz informações sobre 2.176 genes de manutenção celular humano e 3.277 de camundongos que podem ser usados como uma “régua” para medir variações na expressão gênica em diferentes experimentos

Plataforma on-line reúne genes de referência para pesquisa biomolecular

Atlas de acesso aberto criado por pesquisadores da Unicamp traz informações sobre 2.176 genes de manutenção celular humano e 3.277 de camundongos que podem ser usados como uma “régua” para medir variações na expressão gênica em diferentes experimentos

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Atlas de acesso aberto criado por pesquisadores da Unicamp traz informações sobre 2.176 genes de manutenção celular humano e 3.277 de camundongos que podem ser usados como uma “régua” para medir variações na expressão gênica em diferentes experimentos (imagem: liyuanalison/Pixabay)

 

Maria Fernanda Ziegler | Agência FAPESP – Pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) disponibilizaram em uma plataforma on-line e gratuita um banco de dados com 2.176 genes de manutenção celular humano e 3.277 de camundongos – usados como referência em experimentos que medem a variação da expressão de um gene. A informação, que ainda não estava estruturada em um banco de dados, surge como uma ferramenta útil para grande parte da comunidade científica da área biológica.

Isso porque quase toda investigação biomolecular – seja para o desenvolvimento de um novo fármaco, seja para aprofundar o conhecimento sobre uma determinada doença – precisa lançar mão dos chamados genes de manutenção celular (housekeeping genes, em inglês). Basicamente, para detectar e quantificar a variação da expressão de genes em uma célula, em consequência de uma infecção, inflamação, ou até por causa de um tumor, por exemplo, é preciso primeiro conhecer o que se mantém inalterado, em um mesmo padrão.

Só depois, usando genes housekeeping como uma espécie de “régua”, é possível analisar com maior precisão o tamanho das variações na expressão de outros genes. As alterações na expressão gênica da célula são importantes, pois determinam maior ou menor expressão das proteínas, que são as moléculas que, em última análise, podem desencadear ou influenciar o desenvolvimento da resposta imune ou medicamentosa, assim como de processos fisiológicos normais da vida da célula.

“O atlas surgiu a partir de uma necessidade durante minha pesquisa de doutorado. Estava tendo dificuldade em eleger os genes de manutenção celular mais apropriados para os experimentos que precisava realizar. Ao conversar com outros pesquisadores, me dei conta de que o problema não era uma exclusividade minha. Muito pelo contrário, ele era relativamente comum”, diz Bidossessi Wilfried Hounkpe , coautor do estudo publicado na revista Nucleic Acids Research.

Hounkpe realizou um estudo de doutorado com bolsa da FAPESP sobre mecanismos fisiopatológicos da anemia falciforme. O estudo e a criação do atlas integram dois Projetos Temáticos apoiados pela Fundação, o primeiro coordenado por Joyce Maria Annichino-Bizzacchi, e o segundo coordenado por  Fernando Ferreira Costa

De acordo com os pesquisadores, os genes housekeeping são essenciais para o desenho de um estudo biomolecular. Porém, a despeito de alguns deles já serem velhos conhecidos dos cientistas, os genes housekeeping variam de uma condição para outra, assim como de um tipo de célula para outra. “Uma escolha errada pode inviabilizar um estudo ou impedir sua reprodutibilidade”, afirma Hounkpe.

Geralmente, sem uma ferramenta como o atlas, pesquisadores em todo o mundo tendem a buscar os genes de manutenção celular em estudos anteriores sobre o mesmo tema de interesse.

“O atlas foi desenvolvido paralelamente ao estudo de doutorado. A percepção do problema, a construção da solução e a estruturação da base de dados e toda a programação foi uma ideia dele e da Francine Chenou, a quem coorientei no doutorado, e que sempre teve interesse em estudos de bioinformática”, relata  Erich de Paula, professor de Hematologia do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp.

Testes de PCR

Um dos principais exemplos de investigação biomédica que necessita da identificação de genes de manutenção celular específicos para calibrar a sua análise são os testes de PCR em tempo real (RT-PCR). O exame, que se tornou famoso com a pandemia de COVID-19 – por identificar pedaços do RNA do vírus em amostras de secreção nasal de pacientes –, consiste em uma das técnicas mais utilizadas em laboratórios de biologia molecular e biotecnologia em todo o mundo.

Além de identificar a presença do RNA do SARS-CoV-2, o RT-PCR é usado para estimar a quantidade de RNA expresso a partir de qualquer gene de interesse, sob diferentes condições experimentais. No entanto, conforme ressaltam os pesquisadores, o fato de os genes de manutenção celular serem utilizados como calibradores dessas análises dá a eles papel fundamental na precisão dos resultados finais, que são expressos tendo como referência a quantidade de RNA dos genes de manutenção celular.

Genes e moléculas importantes

Além do PCR em tempo real, uma forma cada vez mais usada para quantificar variações na expressão de genes de uma célula é o RNA-seq. A técnica faz parte do conjunto de estratégias conhecido como sequenciamento genético de nova geração e tem como principal vantagem a possibilidade de medir a expressão de vários genes ao mesmo tempo. Com isso, é possível obter o transcriptoma, ou seja, o conjunto completo de moléculas de RNA expressas em um tecido.

E foi justamente a utilização cada vez maior dessa técnica que permitiu a construção deste banco de dados, criado pela mineração de bases de dados públicos de RNA-seq. “Nós não fizemos mil experimentos para obter essas informações. Foi um trabalho de bioinformática. Usamos uma base de dados pública com informações de RNA-seq de um número grande de amostras, em diferentes tipos celulares. O que a ferramenta faz é minerar nessas bases de dados e identificar a expressão desses genes em um número grande de experimentos em diferentes células. Aplicamos um algoritmo que entrega essas informações estruturadas em uma plataforma para o pesquisador”, diz de Paula.

A partir da mineração dos dados obtidos pelo sequenciamento de mais de 11 mil amostras de 52 tecidos humanos e 14 tecidos de camundongos saudáveis, o usuário do atlas pode visualizar a expressão de 2.158 transcritos (de 2.176 housekeeping genes) humanos e 3.024 transcritos (de 3.277 housekeeping genes) de camundongos e eleger a que mais convém para seu experimento.

Além dos genes de manutenção celular, mais uma utilidade do atlas está em indicar outros fatores ou condições experimentais (proteínas, enzimas, hormônios, drogas, doenças) que podem modificar a expressão desses transcritos. A plataforma oferece também lista de primers (seguimentos de ácidos nucleicos necessários para o início da replicação do DNA) desenhados e validados pelos pesquisadores para facilitar o planejamento do experimento do usuário.

“Por se tratar de uma ferramenta que parte de uma base de RNA-seq, o atlas também traz a informação adicional de qual transcrito do gene é o mais adequado para um determinado experimento. É uma seleção mais precisa, pois usa uma lupa mais detalhada, que permite não só enxergar com mais precisão quais são os melhores genes de referência, mas também, dentro de um mesmo gene, indicar os transcritos mais adequados para serem utilizados como padrão em um tipo específico de célula”, diz de Paula.

O artigo HRT Atlas v1.0 database: redefining human and mouse housekeeping genes and candidate reference transcripts by mining massive RNA-seq datasets (doi: 10.1093/nar/gkaa609), de Bidossessi Wilfried Hounkpe, Francine Chenou, Franciele de Lima, Erich Vinicius De Paula, pode ser lido em https://academic.oup.com/nar/advance-article/doi/10.1093/nar/gkaa609/5871367.

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