Testes com ratos indicam que células cerebrais submetidas a baixa oxigenação desenvolvem disfunção no mecanismo de produção de energia; condição pode acometer filhos de gestantes que desenvolvem um distúrbio de pressão arterial conhecido como pré-eclâmpsia (astrócitos em cultura; imagem: Luiz Felipe Souza e Silva)
Testes com ratos indicam que células cerebrais submetidas a baixa oxigenação desenvolvem disfunção no mecanismo de produção de energia; condição pode acometer filhos de gestantes que desenvolvem um distúrbio de pressão arterial conhecido como pré-eclâmpsia
Testes com ratos indicam que células cerebrais submetidas a baixa oxigenação desenvolvem disfunção no mecanismo de produção de energia; condição pode acometer filhos de gestantes que desenvolvem um distúrbio de pressão arterial conhecido como pré-eclâmpsia
Testes com ratos indicam que células cerebrais submetidas a baixa oxigenação desenvolvem disfunção no mecanismo de produção de energia; condição pode acometer filhos de gestantes que desenvolvem um distúrbio de pressão arterial conhecido como pré-eclâmpsia (astrócitos em cultura; imagem: Luiz Felipe Souza e Silva)
André Julião | Agência FAPESP – A falta de oxigênio no período que antecede o parto – condição que pode afetar filhos de gestantes acometidas por um distúrbio de pressão arterial denominado pré-eclâmpsia – tem sido apontada como uma das causas da esquizofrenia. Em artigo publicado na revista Scientific Reports, pesquisadores da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo (FCMSCSP) descreveram de que modo esse fenômeno – chamado no jargão científico de hipóxia – afeta o tipo celular mais abundante do cérebro: o astrócito.
Por meio de experimentos com ratos, os cientistas descobriram que a baixa oxigenação causa, nessas células cerebrais, alterações no funcionamento da mitocôndria – considerada uma das organelas mais importantes por produzir grande parte da energia celular. Conduzido com apoio da FAPESP, o trabalho abre caminho para a busca de intervenções capazes de frear o processo que leva à disfunção mitocondrial, evitando que o cérebro de bebês seja afetado no caso de pré-eclâmpsia.
“Começamos o estudo pelos astrócitos por serem as células mais abundantes do sistema nervoso central e também por metabolizarem o neurotransmissor glutamato, um dos mais relacionados com a esquizofrenia. Agora, estamos verificando o efeito da hipóxia nos neurônios. Queremos entender qual é o sinal que um tipo de célula manda para outro. O objetivo final é evitar o dano cerebral”, disse Tatiana Rosado Rosenstock, professora da FCMSCSP e coordenadora do estudo.
Com formato que lembra o de uma estrela, os astrócitos são as células mais prevalentes da glia – conjunto celular que corresponde a aproximadamente 90% do cérebro, enquanto os neurônios compõem os outros 10%. As células da glia, que também incluem os oligodendrócitos e as micróglias, são responsáveis pelo metabolismo do sistema nervoso central, fornecendo nutrientes para os neurônios e contribuindo para a manutenção das sinapses.
Três modelos
Durante o mestrado de Luiz Felipe Souza e Silva, bolsista da FAPESP, o grupo da Santa Casa estudou o efeito da falta de oxigênio em astrócitos de ratos formassem três modelos diferentes. Primeiro, submetendo as células a uma câmara de hipóxia, na qual todo o oxigênio é retirado do meio; em seguida, acrescentando ao meio de cultura a substância cloreto de cobalto, capaz de mimetizar bioquimicamente a falta de oxigênio.
Por fim, foram analisados astrócitos de uma linhagem de ratos naturalmente hipertensa (SHR), cujos filhotes sofrem hipóxia durante a gestação. Os animais dessa linhagem apresentam comportamentos equivalentes aos sintomas de esquizofrenia em humanos, que cessam após a administração de antipsicóticos.
Entre as variáveis alteradas nas células submetidas à hipóxia – nos diferentes modelos – chamou a atenção dos pesquisadores o balanço de cálcio. Para produzir energia, a mitocôndria precisa de uma condição de equilíbrio entre cargas elétricas positivas e negativas em seu interior. Como o cálcio tem carga positiva, variações na quantidade desse íon provocam um desequilíbrio que, em última instância, leva à morte celular.
Em comparação com astrócitos normais, os que foram submetidos à hipóxia apresentaram nível mais baixo de cálcio no citosol, espaço entre a membrana externa e as outras partes internas da célula.
“Isso indica que as mitocôndrias dessas células passaram a captar mais cálcio [deixando uma quantidade menor no citosol, portanto] na tentativa de se proteger. Contudo, muito cálcio dentro da organela altera o potencial da membrana mitocondrial, o transporte de elétrons e, consequentemente, a produção de energia”, explicou a pesquisadora.
Além disso, a falta de oxigênio casou desequilíbrio na chamada homeostase redox, processo pelo qual a célula combate o estresse oxidativo (desequilíbrio entre moléculas oxidantes e antioxidantes) – fenômeno que pode levar à morte celular. Segundo os pesquisadores, o aumento do estresse oxidativo também decorre da alteração na quantidade de cálcio.
Curiosamente, a hipóxia aumentou a quantidade de mitocôndrias no interior dos astrócitos. Entre outros fatores que evidenciaram o fenômeno, os pesquisadores detectaram maior expressão do gene Pgc1-α, importante para a biogênese mitocondrial.
“Em uma situação de estresse, a célula aumenta o número de mitocôndrias na tentativa de obter mais energia. Mas a disfunção celular é tão grande que, ainda assim, a produção energética não é compensada”, disse Rosenstock.
O grupo estuda agora formas de melhorar a função mitocondrial tanto em astrócitos como em neurônios.
“Se a hipóxia gera um problema na mitocôndria, talvez um dia possamos melhorar a função mitocondrial em casos de pré-eclâmpsia e evitar a esquizofrenia. Por enquanto, a melhor forma de evitar a hipóxia no feto é fazer um bom acompanhamento pré-natal, evitando distúrbios de pressão arterial”, disse a pesquisadora.
O artigo Mitochondrial Dysfunction and Changes in High-Energy Compounds in Different Cellular Models Associated to Hypoxia: Implication to Schizophrenia (doi: 10.1038/s41598-019-53605-4), de Luiz Felipe Souza e Silva, Mariana Dutra Brito, Jéssica Mayumi Camargo Yuzawa e Tatiana Rosado Rosenstock, pode ser acessado em: www.nature.com/articles/s41598-019-53605-4.
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