Grandes instalações científicas previstas para entrar em operação na região nos próximos anos podem contribuir para aumentar o protagonismo e o impacto da ciência feita nos países latino-americanos (imagem: Revista Pesquisa FAPESP)

Pesquisadores querem ação coordenada de financiamento na América Latina
02 de maio de 2019
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Grandes instalações científicas previstas para entrar em operação na região nos próximos anos podem contribuir para aumentar o protagonismo e o impacto da ciência feita nos países latino-americanos

Pesquisadores querem ação coordenada de financiamento na América Latina

Grandes instalações científicas previstas para entrar em operação na região nos próximos anos podem contribuir para aumentar o protagonismo e o impacto da ciência feita nos países latino-americanos

02 de maio de 2019
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Grandes instalações científicas previstas para entrar em operação na região nos próximos anos podem contribuir para aumentar o protagonismo e o impacto da ciência feita nos países latino-americanos (imagem: Revista Pesquisa FAPESP)

 

Elton Alisson  |  Agência FAPESP – Na última década foi iniciada, em diferentes países da América Latina, a operação de grandes infraestruturas de pesquisa, como o maior observatório de raios cósmicos do mundo, o Pierre Auger, na Argentina, e o Observatório Cherenkov de Água de Alta Altitude (HAWK, na sigla em inglês), no México. Nos próximos anos, devem ser concluídas as obras do Sirius – a nova fonte brasileira de luz síncrotron – e do Laboratório Argentino de Feixes de Nêutrons (LAHN).

Além desses projetos também está sendo planejada a construção do ANDES (sigla de Água Negra Deep Experiment Site) – um laboratório subterrâneo no túnel Água Negra, que ligará a Argentina e o Chile, voltado a experimentos sobre matéria escura, neutrinos, geologia e estudos de DNA, entre outros.

Essa diversidade de novas infraestruturas de pesquisa, somada à existência de uma comunidade científica madura, representa uma oportunidade única para a integração e a liderança da América Latina em projetos de grande magnitude que envolvam colaboração internacional. Dessa forma, seria possível aumentar o protagonismo de pesquisadores latino-americanos nesses projetos e, consequentemente, a projeção da ciência feita na região.

Porém, para atingir esses objetivos será preciso, entre outras ações, criar mecanismos comuns e ações coordenadas de financiamento à pesquisa nos países da região, avalia um grupo de cientistas e representantes de agências de fomento de países da América Latina idealizadores do Fórum Estratégico Latino-Americano para Infraestrutura na Pesquisa (LASF4RI).

A primeira reunião do grupo, integrado por cientistas latino-americanos que ocupam cargos de liderança em grandes instituições de pesquisa internacionais, ocorreu nos dias 30 de abril e 1º de maio no Instituto Sul-Americano para Pesquisa Fundamental (ICTP-SAIFR), no Instituto de Física Teórica da Universidade Estadual Paulista (IFT-Unesp).

O evento antecedeu o Encontro Anual do Global Research Council (GRC), organizado pela FAPESP, pelo Consejo Nacional de Investigaciones Científicas e Técnicas (Conicet), da Argentina, e pela German Research Foundation (DFG), da Alemanha, que, desde o dia 1º de maio até o dia 3, reúne em São Paulo líderes de agências de fomento de todo o mundo.

“Esse é um momento muito oportuno para elaboramos uma estratégia para possibilitar que a comunidade científica da América Latina possa tirar o máximo proveito das oportunidades trazidas por essas novas infraestruturas de pesquisa para a região”, disse Fernando Quevedo, diretor do ICTP-Trieste, na Itália, e um dos idealizadores do Fórum, à Agência FAPESP.

“Em razão dos investimentos na formação de pesquisadores realizado por países latino-americanos nas últimas décadas, temos hoje na região cientistas que poderão liderar a implementação e a coordenação de experimentos de grande escala e longo prazo planejados para serem feitos nessas grandes instalações científicas”, disse Quevedo.

De acordo com o físico guatemalteco, um dos objetivos da iniciativa será assegurar que essas novas infraestruturas de pesquisa possam contribuir para qualificar e formar uma nova geração de cientistas nos países da região em áreas como Física de Partículas, Astronomia e Cosmologia.

“Aborrecia-me ver que as grandes observações realizadas nos grandes telescópios construídos nas últimas décadas no Chile, por exemplo, eram dominadas por astrônomos europeus ou americanos [responsáveis pela construção dos equipamentos], sem ter uma participação mais expressiva de astrônomos do país. Com isso se perdia uma oportunidade enorme para o desenvolvimento da ciência local”, disse Quevedo.

Agora, como a maior parte ou um montante expressivo dos recursos para a construção dessas novas infraestruturas de pesquisa é proveniente de países latino-americanos e há uma comunidade científica na região capaz de fazer ciência de excelência, o quadro é diferente, avaliou. No caso do Sirius, por exemplo, 85% do investimento financeiro foi executado no Brasil, com empresas brasileiras.

“O que faltou no passado temos a oportunidade de corrigir agora, que é integrar a comunidade científica com os órgãos de governo e as agências de fomento à pesquisa da região para estabelecer uma rota do que deve ser feito nas próximas décadas, em termos de formação de pessoas e definição de áreas estratégicas de pesquisa”, disse Quevedo.

Outro objetivo do grupo será orientar os investimentos em infraestruturas de pesquisa na região, de modo a evitar a sobreposição de projetos e de recursos. Uma vez que o Brasil terá o Sirius, não fará sentido um projeto para construção de outra fonte de luz síncrotron em outro país latino-americano, exemplificou o diretor do ICTP-Trieste.

Exemplos internacionais

“A maior parte das infraestruturas de pesquisa que temos hoje na Argentina, por exemplo, é voltada para as áreas de Radioastronomia, Geodésia e Física de Partículas. Essas facilities também estão abertas para projetos em colaboração com outros países da região e do exterior”, disse Jorge Tezon, gerente de desenvolvimento do Conicet, durante o evento.

Um foco adicional do grupo será a definição de áreas prioritárias para investimentos em pesquisa na região. “Se a comunidade científica da América Latina avaliar que mudanças climáticas ou energias renováveis são temas prioritários de pesquisa para a região, pode-se avaliar aumentar o direcionamento de recursos para essas áreas, por exemplo”, disse.

“Esse plano estratégico, em que se definem prioridades de pesquisa para os próximos cinco a 20 anos, é o que tem sido feito na Europa e o que podemos fazer na América Latina, direcionando nossos esforços em pesquisa como uma comunidade científica latino-americana. Isso pode nos tornar mais fortes”, disse Tezon.

Um modelo de cooperação científica que pode servir de inspiração para a América Latina é o da Organização Europeia para a Pesquisa Nuclear (Cern). Quando o centro de pesquisa em física foi criado, no início da década de 1950, após a Segunda Guerra Mundial – com o objetivo de não apenas unir os cientistas europeus na área, mas também compartilhar os custos crescentes das instalações de física nuclear –, a ciência não era mais de classe mundial.

Hoje, as pesquisas feitas no LHC têm altíssimo impacto científico e contam com a participação de cientistas de 113 países, destacou Salvatore Mele, físico do Cern.

“A convenção para criação do Cern estabeleceu contribuições financeiras que são calculadas com base no rendimento nacional líquido dos últimos anos, de modo que cada estado-membro paga de acordo com os seus meios”, disse Mele.

Já o Fermi National Accelerator Laboratory (Fermilab), nos Estados Unidos, mantém colaborações com cientistas de 53 países, incluindo o Brasil. “Conseguimos desenvolver ao longo das últimas décadas um modelo bem-sucedido para apoiar colaborações internacionais em experimentos dentro e fora das instalações do Fermilab”, disse Nigel Lockyer, diretor da instituição.

O cientista destacou a participação de pesquisadores latino-americanos na colaboração Dune – um projeto científico internacional que busca descobrir novas propriedades dos neutrinos, partícula elementar com muito pouca massa e que viaja a uma velocidade muito próxima à da luz.

Os físicos Ettore Segreto e Ernesto Kemp, ambos professores do Instituto de Física Gleb Wataghin da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), desenvolveram, com apoio da FAPESP, o novo conceito tecnológico de detector que será usado no experimento.

“Eles inventaram, construíram e testaram com sucesso uma nova tecnologia de detecção de luz ultra-sensível, chamada Arapuca, que, pelo que me explicaram, significa uma armadilha para pássaros em português”, disse Lockyer.
 

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