O desafio é transpor as atuais barreiras agrícolas, industriais e tecnológicas, aponta pesquisador do CTBE; assunto será discutido durante o BBEST 2017 (foto: Erik Nardini/CTBE)

Etanol de segunda geração poderá ser economicamente viável a partir de 2025
28 de setembro de 2017
EN ES

Para isso será preciso transpor as atuais barreiras agrícolas, industriais e tecnológicas e superar a estagnação do setor sucroenergético, aponta pesquisador do CTBE

Etanol de segunda geração poderá ser economicamente viável a partir de 2025

Para isso será preciso transpor as atuais barreiras agrícolas, industriais e tecnológicas e superar a estagnação do setor sucroenergético, aponta pesquisador do CTBE

28 de setembro de 2017
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O desafio é transpor as atuais barreiras agrícolas, industriais e tecnológicas, aponta pesquisador do CTBE; assunto será discutido durante o BBEST 2017 (foto: Erik Nardini/CTBE)

 

Elton Alisson | Agência FAPESP – O etanol celulósico, obtido da palha e do bagaço da cana-de-açúcar e também conhecido como etanol de segunda geração (2G), poderá ser economicamente viável a partir de 2025 se forem transpostas as atuais barreiras agrícolas, industriais e tecnológicas para produzi-lo e se o setor sucroenergético brasileiro superar a estagnação em que se encontra.

A avaliação é do pesquisador Antonio Bonomi, coordenador da divisão de inteligência de processos do Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE), do Centro Nacional de Pesquisa em Engenharia e Materiais (CNPEM), e membro da coordenação do Programa FAPESP de Pesquisa em Bioenergia (BIOEN).

“Hoje claramente é mais interessante do ponto de vista econômico para as empresas do setor sucroenergético montar uma nova usina voltada à produção de etanol de primeira geração do que construir uma usina de etanol de segunda geração integrada a uma de primeira geração, por exemplo, porque o retorno do investimento é maior”, comparou Bonomi.

“A tendência, contudo, é que em médio prazo – em 2025 – o custo de produção do etanol celulósico empate com o de primeira geração e a partir de 2030 o etanol de segunda geração seja mais barato do que o de primeira. Isso se forem superados os atuais obstáculos agrícolas, industriais e tecnológicos e se o setor sair da estagnação em que se encontra”, ponderou.

Os biocombustíveis de segunda geração serão um dos temas discutidos no Brazilian BioEnergy Science and Technology Conference (BBEST) 2017, evento promovido pelo BIOEN, que ocorrerá entre os dias 17 e 19 de outubro, em Campos do Jordão.

De acordo com Bonomi, que coordena um projeto apoiado pela FAPESP voltado à valorização da cadeia produtiva descentralizada de biomassa para produção de biocombustíveis avançados, o volume de etanol de segunda geração produzido hoje no Brasil é muito baixo.

A capacidade de produção das duas usinas voltadas à produção de etanol de segunda geração existentes hoje – uma da Granbio, localizada em São Miguel dos Campos, em Alagoas, inaugurada em 2014, e a outra da Raízen, situada em Piracicaba, no interior de São Paulo, que entrou em operação no final de 2014 – é de pouco mais de 100 milhões de litros por ano. Entretanto, as duas usinas têm produzido menos da metade dessa capacidade, estima o pesquisador.

“As duas usinas têm produção descontínua e estão em fase de aprendizado de produção, utilizando equipamentos ainda pouco eficientes e processos que ainda apresentam problemas que estão sendo identificados para, pouco a pouco, serem resolvidos”, avaliou.

O custo estimado de produção do etanol de segunda geração calculado pelos pesquisadores em julho de 2014 gira em torno de R$ 1,50 por litro, enquanto o custo de etanol de primeira geração é de, aproximadamente, R$ 1,15.

Até 2025, entretanto, o custo do etanol de segunda geração poderá cair para R$ 0,75 por litro, podendo chegar, até 2030, a R$ 0,52, calculou o pesquisador. Em parceria com colegas do CTBE, ele realizou um estudo, a pedido do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), em que se projetou a evolução do custo de produção do etanol celulósico e a data em que a tecnologia se tornaria economicamente viável no Brasil.

“Ao custo de produção de R$ 0,52 por litro, o etanol de segunda geração seria competitivo mesmo se o preço internacional do barril de petróleo atingisse o mínimo de US$ 44 por litro”, estimou o pesquisador.

Diferentes cenários

Para chegar a esses valores, os pesquisadores realizaram um levantamento inicial junto a 22 empresas e especialistas do setor de etanol e realizaram simulações computacionais na Biorrefinaria Virtual de Cana-de-Açúcar (BVC) – uma ferramenta de simulação computacional desenvolvida pelo CTBE que possibilita avaliar a integração de novas tecnologias à cadeia produtiva de cana-de-açúcar e de outras biomassas nas fases agrícola, industrial e comercial.

As simulações foram feitas com base em diferentes cenários tecnológicos em curto prazo (de 2015 a 2020), médio prazo (de 2021 a 2025) e longo prazo (de 2026 a 2030).

Um dos cenários representa a média atual de produção de etanol hoje – principalmente da região Centro-Sul do país –, contemplando uma planta de etanol de primeira geração com capacidade de processamento de 2 milhões de toneladas de cana durante a safra, com tecnologia básica e sem integração energética.

Os demais cenários são baseados no processamento de, pelo menos, 4 milhões de toneladas de cana, com tecnologia moderna, e abrangem tanto a produção de etanol de primeira geração exclusivamente, como também a de primeira geração integrada à segunda e a de segunda geração independente.

Os pesquisadores consideraram duas rotas tecnológicas para produção de etanol de segunda geração, sendo a primeira por meio da fermentação separada de açúcares de cinco carbonos (xilose) e a segunda pela cofermentação dos açúcares de cinco e seis carbonos (glicose).

Os resultados das simulações indicaram que, na parte agrícola, um dos entraves para tornar o etanol celulósico economicamente viável é o custo da biomassa, que é alto.

“O custo da biomassa representa um entrave não só para a produção de etanol de segunda geração, mas também para o de primeira”, disse Bonomi.

Outros obstáculos são a falta de um sistema agrícola e industrial projetado para fazer o uso integral da cana, considerando também a palha, e de uma alternativa à cana no período de entressafra que possibilite a uma usina operar ao longo de 300 a 330 dias por ano, contra a atual média anual de 200 a 240 dias.

“A ‘cana-energia’ [variedade de cana obtida a partir do cruzamento das espécies Saccharum officinarum e Saccharum spontaneum, que apresenta maior teor de fibras e menos açúcares em comparação com a cana convencional] pode ajudar nesse sentido porque apresenta algumas características interessantes”, afirmou o pesquisador.

Uma delas é que essas variedades de cana que têm sido desenvolvidas por empresas como a GranBio e a Vignis e por instituições como o Instituto Agronômico (IAC) não necessitam de estresse hídrico para aumentar seu teor de açúcar. Além disso, poderiam ser coletadas também ao longo da estação úmida, explicou Bonomi.

Já na área industrial, um dos principais obstáculos para viabilizar economicamente o etanol de segunda geração é diminuir o custo de capital – os equipamentos necessários para produção –, que ainda são altos, apontou o pesquisador.

“Esse é um problema que, provavelmente, a curva de aprendizado do processo vai resolver. A primeira planta normalmente sempre é mais cara, porque ainda não há fabricantes de equipamentos adequados para a produção”, ponderou Bonomi.

E na parte tecnológica um dos principais problemas é o pré-tratamento da biomassa – com o objetivo de separar a lignina da celulose e da hemicelulose – para adequá-la ao processo de hidrólise, em que a celulose e a hemicelulose são convertidas em açúcares fermentescíveis para produzir o etanol de segunda geração.

“Essa etapa, de preparação do material lignocelulósico para permitir a atuação das enzimas que fazem a quebra dos polímeros presentes no material lignocelulósico [a celulose e a hemicelulose], não é totalmente conhecida e ainda estão em desenvolvimento os equipamentos necessários para fazer isso, que são caros”, explicou Bonomi.

Um outro problema é o tempo necessário para o processo de hidrólise, que hoje é demorado. Por essa razão, o custo de armazenamento em tanques necessários para realizá-lo e o risco de contaminação são altos.

“Isso acaba exigindo que a capacidade de produção das usinas de etanol de segunda geração seja dimensionada com uma escala maior para poder compensar perdas que possam ocorrer por eventuais contaminações no processo”, disse Bonomi.

Um terceiro gargalo tecnológico está no processo de fermentação das pentoses – os açúcares resultantes da quebra (hidrólise) da hemicelulose, apontou o pesquisador.

Enquanto a quebra da celulose resulta em glicose – que é um açúcar facilmente fermentescível a etanol –, a da hemicelulose produz açúcares de cinco carbonos (pentoses), que os microrganismos (leveduras) existentes hoje não conseguem metabolizá-los facilmente para produzir o etanol de segunda geração. Por isso, a velocidade de produção de etanol de segunda geração a partir da hemicelulose é baixa.

“Hoje é possível produzir etanol de segunda geração em grande escala a partir do hidrolisado de celulose. Já a produção a partir do hidrolisado de hemicelulose ainda está em desenvolvimento, e o próprio CTBE acabou de desenvolver uma levedura modificada capaz de produzir etanol a partir das pentoses”, disse Bonomi.

“Os avanços esperados nessas áreas agrícola, industrial e tecnológica devem fazer com que o etanol de segunda geração se torne mais barato que o de primeira”, afirmou.

Rotas tecnológicas

As duas usinas de etanol de segunda geração existentes no Brasil hoje adotaram diferentes rotas tecnológicas.

Enquanto a GranBio se baseou em uma rota tecnológica chamada stand alone – caracterizada por uma usina dedicada exclusivamente à produção de etanol de segunda geração, sem ser integrada a outra de primeira geração –, a Raízen (joint venture entre a Shell e a Cosan) optou por construir uma usina integrada.

Uma vantagem que o processo tecnológico adotado pela Raízen apresenta em relação à GranBio é a possibilidade de fermentar pelo menos o hidrolisado de celulose junto com a sacarose do caldo de cana para obter etanol de segunda geração, comparou Bonomi.

“Enquanto a GranBio tem uma tendência de transformar em etanol a mistura do hidrolisado de celulose com o hidrolisado de hemicelulose – ou seja, a combinação dos açúcares C6 [da fração celulósica] da glicose e das pentoses –, a tecnologia da Raízen tem mais um processo de fermentação do C6 junto com a sacarose, enquanto as pentoses podem ser fermentadas isoladamente na produção de etanol”, disse o pesquisador.

As duas usinas, contudo, têm enfrentado desafios tecnológicos para produzir o etanol de segunda geração, principalmente na fase de pré-tratamento do material, apontou o pesquisador.

Em nota ao Broadcast – o serviço em tempo real do Grupo Estado – no início de junho, a GranBio admitiu ter mudado o cronograma de investimentos e metas de produção de etanol celulósico por conta de problemas tecnológicos relacionados ao pré-tratamento e pela crise econômica. Mas que espera ter, em 2019, um etanol de segunda geração competitivo como o fabricado a partir da cana.

Consultada pela Agência FAPESP, a Raízen respondeu em nota que um dos pontos-chave para o sucesso que tem obtido com a produção de etanol de segunda geração na usina Costa Pinto, em Piracicaba, é justamente a integração da planta de segunda geração à de primeira geração, que proporciona consideráveis benefícios logísticos.

“A companhia aposta nessa tecnologia disruptiva e acredita que os desafios tecnológicos já foram superados. No momento estamos buscando a confiabilidade mecânica dos equipamentos e um nível satisfatório de excelência da planta como um todo”, disse a empresa em nota.

O estudo De promessa a realidade: como o etanol celulósico pode revolucionar a indústria da cana-de-açúcar: uma avaliação do potencial competitivo e sugestões de política pública, de Bonomi e outros, pode ser acessado em: https://web.bndes.gov.br/bib/jspui/handle/1408/4283.

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